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PGR retomará investigação de chacinas ocorridas em 94 e 95 no Complexo do Alemão

Helena Martins - Repórter da Agência Brasil

26/10/2017 19h22

Em resposta à condenação do Brasil pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), a Procuradoria-Geral da República (PGR) discute possibilidade de federalizar as investigações sobre duas chacinas, ocorridas em 1994 e 1995, na comunidade Nova Brasília, no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. Para tanto, foi instaurado o chamado procedimento preparatório de incidente de deslocamento de competência para coleta de elementos e apuração dos fatos relacionados às incursões das polícias Civil e Militar do Rio de Janeiro na favela, que resultaram em 26 mortes e na tortura e violência sexual contra três mulheres. O caso Nova Brasília levou a Corte IDH, instituição judicial autônoma da Organização dos Estados Americanos (OEA), a condenar o Estado brasileiro por não garantir a realização de justiça. Foi a primeira sentença em que o Brasil foi  condenado pela corte da OEA por violência policial. Na decisão, divulgada no primeiro semestre deste ano, a Corte IDH fixou prazo de um ano, até 11 de maio de 2018, para o governo brasileiro reabrir as investigações sobre as duas chacinas, a fim de identificar e punir os responsáveis. Na portaria em que determina a medida, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, cita o reconhecimento de graves violações de direitos humanos que demandam investigação, persecução e eventual punição dos responsáveis e considera "a necessidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte". Diante disso, fixa "a necessidade de apurar se os fatos narrados amoldam-se à hipótese de suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, incidente de deslocamento de competência para a justiça federal", o chamado IDC. Tal instrumento foi inserido à Constituição Brasileira em 2004. A transferência da competência da Justiça Estadual para a Justiça Federal, suscitada apenas pela PGR ao STJ, deve ocorrer em hipóteses de graves violações a direitos impunes na esfera estadual e quando podem levar à responsabilização internacional do Brasil, a fim de assegurar o cumprimento de obrigações firmadas em tratados internacionais. O primeiro caso de IDC registrado no país foi o da investigação sobre o assassinato da missionária Dorothy Stang, em 2005, no Pará, e acabou negado. Já os crimes atribuídos a policiais militares goianos, cujas investigações estavam paradas, foram federalizados em 2012. Os inquéritos relacionados às chacinas ocorridas na favela Nova Brasília foram arquivados pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) em diferentes ocasiões. Sobre esse trabalho, a sentença da OEA destacou que não houve imparcialidade nas investigações. De acordo com a OEA, antes de se investigar e corroborar a conduta policial, em muitos casos, realiza-se uma investigação sobre o perfil da vítima e encerra-se o caso, ao se considerar que esta "era um possível criminoso". A Corte também determinou o pagamento de indenização para cerca de 80 pessoas. O processo sobre o caso chegou à Corte IDH em maio de 2015, depois de 15 anos tramitando na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Segundo informações divulgadas nesta quinta-feira (26) pela PGR, o Ministério Público Federal (MPF) acionará também o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), para estabelecer os mecanismos normativos necessários para apurar procedimentos policiais, enquanto a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) atuará para propor ações ligadas aos direitos humanos. Com o esforço conjunto, o MPF pretende, a partir deste caso, estabelecer metas e políticas de redução da mortalidade e violência policial no país.