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Nove são resgatados com vida de prédio que desabou em Fortaleza

Caio Faheina, Isaac de Oliveira e Lôrrane Mendonça, especiais para o Estado

Fortaleza e São Paulo

15/10/2019 18h03

Um prédio residencial de sete andares que desabou na manhã desta terça-feira, 15, em Fortaleza, deixou ao menos um morto e nove feridos. O edifício Andréa se localizava na esquina das Ruas Tibúrcio Cavalcante e Tomás Acioli, no Dionísio Torres, bairro nobre da capital cearense. O prédio desabou por volta de 10h15.

De acordo com os bombeiros, ainda há duas vítimas soterradas e em contato visual com os oficiais. Elas estão esperando o resgate. Das vítimas já resgatadas, duas teriam conseguido ligar para os familiares, mesmo sob os escombros. Três feridos resgatados foram encaminhados para o Instituto Doutor José Frota (IJF): Cleide Maria da Cruz Carvalho, de 60 anos; Maria Antônia Peixoto, de 72 anos; e Gilson Moreira Gomes, de 53 anos. Eles passam por exames.

Os bombeiros também estão com uma lista de 10 nomes de pessoas que ainda não foram localizadas, mas não se sabe se elas estavam no edifício no momento do desabamento. Ainda de acordo com os bombeiros, não há risco para os prédios próximos.

"A Defesa Civil está coordenando o isolamento do entorno, mas o desabamento desse prédio não oferece risco aos edifícios vizinhos. Estamos esvaziando o entorno, mas mais por uma questão de segurança", afirmou o coronel Clayton Bezerra, comandante da operação. "A situação é difícil e requer cuidados, porque o restante do prédio ainda pode vir a colapsar. Ainda há bolsões que inspiram cuidados. É uma operação lenta e deve se estender durante todo o dia de hoje."

Ele também disse que não há risco de incêndios ou de explosões e que não foi detectado vazamento de gás. De acordo com Bezerra, a manutenção em uma das colunas do prédio pode ter levado ao desabamento.

Há cães farejadores trabalhando no resgate dos soterrados.

Em nota nas redes sociais, o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), afirmou ter determinado "o uso de toda a força operacional dos bombeiros, Samu, Polícia Militar, Defesa Civil e todos os órgãos estaduais que possam auxiliar no socorro às vítimas".

Também nas redes sociais, o prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio (PDT), lamentou a tragédia e reforçou os trabalhos em busca de vítimas com vida.

"Equipes da Prefeitura e do Governo do Estado, como Defesa Civil, SAMU, AMC, Guarda Municipal, Hospitais Públicos, Corpo de Bombeiros, Polícias Militar e Civil, já estão em uma operação conjunta", reforçou a nota.

"Estava chegando a Brasília para cumprir agendas quando recebi essa lamentável notícia. Cancelei toda a agenda e estou retornando imediatamente para Fortaleza para acompanhar a operação de resgate. Além das ações efetivas das nossas forças de segurança, façamos uma corrente de oração para que as vidas sejam salvas", diz o texto.

Ex-morador e vizinhos

O consultor empresarial Heitor Melo Lima morou no prédio até setembro deste ano, no apartamento 401. "Quando a gente estava quase de mudança é que esse assunto, da reforma estrutural, entrou na pauta do condomínio, mais ou menos no fim de agosto", recorda.

Heitor afirma que gostava do imóvel, de cerca de 130 metros quadrados privativos, e que apesar de ser um prédio "provavelmente com mais de 40 anos", não saiu de lá por causa do risco de colapso.

O vídeo que correu as redes sociais nesta manhã, exibindo as pilastras do estacionamento deterioradas e com ferros aparentes - que, segundo os grupos de WhatsApp, foi feito ontem à noite - assustou o ex-morador. "O prédio era bem antigo, tinha algumas questões de manutenção, rachaduras pequenas, mas nada que parecesse alarmante. Há um mês, não estava naquele estado".

De acordo com ele, a maioria dos moradores estava lá há muito tempo e a maioria dos apartamentos tinha moradores idosos. "Que eu saiba, onze apartamentos estavam ocupados, só o meu e o 301, que saiu no mês anterior a mim, estavam desocupados".

O publicitário Higor Veras, de 26 anos, trabalha próximo ao prédio que desabou e conta que os imóveis da região precisaram ser evacuados devido a um vazamento de gás no local da tragédia.

"Foi horrível. A gente pensou que fosse o nosso prédio, porque tremeu muito. Durou uns dez segundos. A gente começou a ver a poeira, a gritaria e a gente percebeu que era outro prédio. Foi aquela correria, mas não tinha muito o que fazer", contou.

A designer de interiores Roberta Leite, de 32 anos, mora a cerca de 100 metros do prédio que desabou. Ela conta que estava no quarto quando ouviu um barulho estridente.

"Pensei que tivesse uma queda de energia, algum poste que tivesse sido batido. Saí com minha irmã para ver a situação da janela da cozinha e vi uma nuvem de fumaça", disse.

Após a poeira baixar, Roberta percebeu que um prédio próximo havia caído.

"Todo mundo começou a sair na rua, a entender a situação e a ajudar. Está todo mundo triste. É uma tragédia", lamentou.

A designer, também estudante de Engenharia Civil, disse que a estrutura não aparentava más condições.

"Era um prédio normal. Não tinha nenhum vergalhão aparente, nenhuma rachadura. A pintura estava desbotada, mas normal", avaliou.

A irmã de Roberta, a enfermeira Renata Vasconcelos, de 36 anos, foi ao local prestar socorro às vítimas do desastre. Com a ajuda da população e de uma empresa distribuidora de água, Renata conseguiu cerca de 50 garrafões, além de copos descartáveis e outros mantimentos para ajudar, também, as equipes de resgate.

"O sol está muito forte, e vai ser uma operação de dias. O trabalho aqui vai ser de formiguinha. Temos de esperar os bombeiros agirem primeiro", disse ela, que estava ao lado de uma das ambulâncias do SAMU para ajudar nas ocorrências. Sobre o emocional, a profissional conta que foi um "susto grande", mas que "alguém tem de estar estruturado pra poder ajudar. As vítimas contam com a gente".

O comerciante João André Uchôa Gomes, de 40 anos, conta que estava no mercado do qual é dono com um freguês no momento que o prédio vizinho desabou. "Eu vi como se o prédio estivesse se quebrando ao meio, quando eu vi eu me assustei e já subi para o segundo andar". Ele conta que conseguiu fugir por uma janela lateral e que estava com um cliente, que não conseguiu escapar, mas que já foi resgatado.

"Eu ouvi um barulho, mas não sabia se era o prédio, era como alguma coisa tremendo, uma batida", lembra o comerciante. Depois disso, ele conta que subiu uma poeira forte e que não conseguiu enxergar mais nada e por isso não conseguiu ajudar o cliente que estava com ele no estabelecimento. Segundo João, que teve ferimentos leves, vai ser difícil salvar qualquer coisa do mercadinho.

A advogada Rosa Monteiro Bruno, de 37 anos, confundiu o desabamento com uma ventania, inicialmente. Ela percebeu que tinha alguma coisa errada porque viu uma rede de dormir voando muito alto. "Eu estava no escritório, senti meu prédio balançar e vi uma rede no vizinho voar alto, depois subiu a nuvem de poeira", recorda.

Ela mora no décimo andar de um edifício ao lado, com apenas duas casas de separação. Ela conhecia a pessoa que morreu no desabamento. No momento da tragédia, o homem, cujo nome ainda não foi divulgado, descarregava um caminhão de água mineral bem onde os escombros caíram. "É uma misto de angústia e impotência. Foram 20 minutos sem poder fazer nada. Percebemos que até mesmo os bombeiros estavam surpresos. E por obra de Deus não foi pior, porque o prédio pendeu para a rua; se tivesse caído para o outro lado, teria atingido casa, salão de beleza, vários outros imóveis,", conta ela.

Em entrevista à reportagem, o presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Ceará (CAU-CE), Napoleão Ferreira, afirma que não há nenhum Registro de Responsabilidade Técnica (RRT) emitido para o prédio.

"Se houver obra por arquiteto, é irregular. Não há RRT de nenhum profissional naquele edifício", enfatiza Napoleão.

Ao citar hipóteses para o desabamento, o presidente diz que o problema pode ter sido causado por questões estruturais ou por falta de manutenção predial.

"Quando acontecem intervenções internas na edificação, obras nas unidades e isso é feito de maneira não profissional, com a técnica devida, isso geralmente ameaça causar sinistros como esse. Uma outra causa possível é a estrutura do prédio. Às vezes tem uma infiltração, um problema crônico, que ao longos dos anos vai se agravando e termina que colapsa a estrutura. Outra hipótese é a questão da tubulação de gás. Pode haver uma explosão e isso gera uma rachadura e a ruptura vai como um 'castelo de cartas'. Essas hipóteses existem. É preciso investigar", afirmou Napoleão.

A Universidade de Fortaleza (Unifor) organizou um mutirão de voluntários com alunos e ex-alunos das áreas de enfermagem, psicologia e medicina, além de ONGs, para prestar socorro a parentes de vítimas do desabamento. O atendimento está sendo feito em um prédio próximo. Também há equipes da Igreja Católica e de duas denominações evangélicas se revezando em turnos com 30 profissionais cada.