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Especial/Eleições na França podem enfraquecer União Europeia

31/01/2017 20h21

SÃO PAULO, 31 JAN (ANSA) - A França se prepara para uma das eleições presidenciais mais acirradas e imprevisíveis dos últimos anos, que prometem ter um impacto direto no futuro da União Europeia.   

Liderando as pesquisas eleitorais, está Marine Le Pen, a presidente do Frente Nacional, um partido de extrema-direita, com veia populista, e que critica abertamente a União Europeia e, especialmente, o euro.   

Temor crescente dos vizinhos europeus, Le Pen baseia-se em um discurso semelhante ao do presidente dos EUA, Donald Trump, e é contrária às atitudes tomadas pela Europa na questão da crise migratória bem como promete fazer um plebiscito sobre a saída da França da zona do euro.   

Para saber o quanto os populistas podem ser fortes, no entanto, o professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (IRI-USP), Kai Lehmann, acredita que o próprio governo norte-americano poderá servir de termômetro.   

"Eu acho que até um certo ponto vai depender bastante do desempenho do Donald Trump nos EUA. Caso a Presidência dele tenha um começo muito atrapalhado, ruim, do ponto de vista do lugar dos Estados Unidos no cenário internacional, pode influenciar bastante os populistas da direita na França", diz Lehmann à ANSA. Para o especialista, outro ponto importante a ser observado por Le Pen, caso vença, é o que acontecerá durante a saída do Reino Unido do bloco europeu.   

"É notável nesse sentido que Marine Le Pen ela já disse que não está falando da saída completa da União Europeia. 'Vamos conversar sobre a moeda única, sobre alguns aspectos', mas ela não fala mais em sair da União Europeia. Ela deve estar olhando para o Reino Unido e falando 'não quero isso para mim'. O Reino Unido vai ter uma caminhada mais difícil pela frente, e Le Pen sabe que vai ter impacto econômico se França sair da UE. Aliás, a União Europeia acabaria se a França saísse",complementa.   

Já na vice-liderança da corrida eleitoral, está o representante da direita mais "tradicional" francesa, o ex-premier François Fillon, partido do ex-presidente Nicolas Sarkozy que, apesar de se dizer um "europeísta", pede mudanças drásticas na decisão de algumas medidas mais importantes, como a gestão da crise migratória e a retomada do crescimento do bloco.   

Em discurso nesta semana, Fillon fez um "alerta" para a UE e disse que a "Europa deve multiplicar o nosso poder", que hoje seria "reduzido" e que o bloco deve "dar mais empregos e defender nossos interesses econômicos". "Não podemos continuar como antes. Precisamos desafiar as potências europeias e nos perguntar o que é essencial e o que não é. Temos que definir nossas prioridades. Temos que definir o que queremos fazer, com quem e em que contexto", afirmou Fillon.   

Segundo o professor visitante da Blavatinik School of Government, da Universidade de Oxford, no Reino Unido, Marcus Vinicius de Freitas, essa ascensão da direita francesa tem uma explicação na insatisfação das pessoas.   

"O que a gente observa nesse processo todo é que existe uma grande quantidade de pessoas insatisfeitas com os resultados da globalização, e até mesmo com essas mudanças criadas pela UE, no sentido de que os termos de emprego e situação econômica deterioraram", ressalta à ANSA.   

"Em razão disso o eleitor, está muito preocupado com aquilo que os partidos políticos têm apresentado como solução para problemas. Os cidadãos estão preocupados porque partidos tradicionais não têm apresentado resposta para atender a essas demandas", acrescenta Freitas.   

O tradicional partido que está no "cerne" do avanço da direita recai sobre o Partido Socialista. A baixíssima aprovação do atual mandatário, François Hollande, fez com que ele sequer concorresse a uma reeleição ao cargo. Com isso, sua aposta era o seu então premier, Manuel Valls, que abdicou do posto para participar das primárias socialistas.   

No entanto, a aposta da atual cúpula do governo francês foi por água abaixo. No "lugar" de Valls, os franceses escolheram o ex-ministro do governo Hollande Benoît Hamon para a disputa presidencial.   

"Os partidos mais tradicionais, que são mais a ala da esquerda, se encontram muito diluídos. Há muitos partidos do centro para esquerda. Em razão disso, você tem o outro grupo, que visa apresentar as soluções contrárias ao que se tem praticado.   

Partidos de direita, e essa direita tem, diferentemente do os partidos de esquerda, uma voz mais consolidada. Isso faz com que haja essa movimentação para resultados eleitorais surpreendentes", diz Pereira à ANSA.   

Hamon pertence a um grupo oposto ao de Valls. Aos 49 anos, o escolhido da esquerda promete uma "verdadeira" esquerda no comando do país se vencer - ao contrário de Valls, muito mais da ala à direita do partido. Entre suas promessas nas primárias, está o pagamento de um salário mínimo para todos os franceses e uma reforma no sistema judiciário. É apontado como um populista de esquerda e não tem em seu horizonte uma forte rede de apoio dentro do partido, que está muito fragmentando em diversas correntes. As eleições na França estão marcadas para os dias 23 de abril, o primeiro turno, e para 7 de maio, em segundo turno. Investigações No entanto, o panorama eleitoral poderá sofrer uma grande mudança dada a situação de François Fillon. O candidato está envolvido em um escândalo e sendo acusado de ter criado um "cargo fictício" para sua esposa, Penelope, durante os anos em que foi deputado.   

A mídia francesa acusa Penelope de ter embolsado até 900 mil euros sem ter realmente trabalhado. Procuradores de Paris já interrogaram o casal e os novos desdobramentos do casos devem ocorrer nas próximas semanas. Fillon, por sua vez, nega todas as acusações.(ANSA)
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