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Especial/'Carne Fraca' pode dar prejuízo bilionário ao Brasil

27/03/2017 15h31

SÃO PAULO, 27 MARÇO (ANSA) - Por Tatiana Girardi - O escândalo internacional gerado por conta de uma megaoperação da Polícia Federal, batizado de "Carne Fraca", abalou a imagem da produção de carne brasileira perante seus maiores compradores pelo mundo.   

Segundo o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, só no dia 21 de março, a média de exportações caiu de US$ 63 milhões para US$ 74 mil. "Estamos falando de números estratosféricos", disse o titular da pasta estimando um prejuízo de US$ 1,5 bilhão por ano conforme os desdobramentos da Carne Fraca forem avançando.   

Até o momento, alguns dos maiores compradores de carne brasileira, já anunciaram a suspensão total ou apenas de compra referente às 21 unidades afetadas pelas revelações da PF. China, Japão, Suíça, Chile, Hong Kong, Egito e União Europeia divulgaram medidas neste sentido. Já a Coreia do Sul chegou a suspender a compra, mas voltou a liberar cerca de 24 horas.   

Destes que bloquearam ou suspenderam total ou parte da importação da carne bovina, quatro estão entre os maiores importadores em 2016. Hong Kong aparece como líder no ranking, tendo importado 285.095.970 quilos de carne, em mais de US$ 1 bilhão em negócios, seguido por China (R$ 703 milhões), Egito (US$ 176,8 milhões), Rússia (US$ 408,1 milhões), Irã (US$ 96,1 milhões), Chile (US$ 71 milhões) e Estados Unidos (US$ 33,1 milhões).   

Dados oficiais do governo mostram que o Brasil exportou, em 2016, mais de 1 milhão de toneladas de carne bovina, sendo que o país corresponde a 20% do mercado internacional de bovinos, suínos e aves. Ainda conforme as informações do Ministério, o setor movimenta cerca de US$ 14 bilhões por ano em exportações.   

As mais de 350 páginas do relatório da PF, divulgadas na última sexta-feira (20), no entanto colocaram sombra para além dos 21 frigoríficos investigados - que foram impedidos de exportar carne para o exterior pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Isso porque, entre as empresas investigadas estão duas das maiores do setor no mundo: a Brasil Foods (BRF) e a JBS.   

De acordo com a PF, um grupo de fiscais e executivos são suspeitos de negociar propinas para liberar - tanto para o comércio interno como para o externo - carne fora das especificações e dos padrões de qualidade exigidos dessas empresas. A revelação caiu como uma bomba no mercado brasileiro.   

Para o professor de comércio exterior da Universidade Mackenzie, Arnaldo Francisco Cardoso, a situação trará problemas econômicos "no curto prazo, talvez no médio prazo", mas toca em um ponto muito importante sobre o processo de internacionalização do setor: as relações entre grandes corporações e o Estado.   

"O que eu vejo desse episódio, o valor mais significativo, é o fato de que esse escândalo traz problemas estruturais e não conjunturais. Em 2006, o Brasil enfrentou um grande surto de febre aftosa e, nesse momento, abalou bastante o nosso fluxo de exportação de carne, mas a resolução ocorreu no curto prazo.   

Mas, esse episódio traz um caso estrago muito significativo para a imagem desse setor, das empresas e da própria imagem país", lembra o professor. Naquele ano, os maiores compradores de carne do Brasil anunciaram um embargo ao produto brasileiro, gerando um grande prejuízo econômico e forçando as autoridades a fazer uma adequação do rebanho brasileiro, mudando práticas e técnicas.   

"Esse processo de qualificação dessas empresas no comércio internacional tem mostrado para a gente que ele não foi acompanhado na melhora de um padrão do relacionamento entre essas grandes corporações e o Estado brasileiro com seus vários agentes públicos", ressalta.   

"Me baseio um pouco em 2006 e no final nós conseguimos, em um tempo razoável, corrigir os problemas e o abalo econômico e comercial foi pequeno. Olhando na história, porque nós tivemos um embargo naquele momento de todos os importantes mercados internacionais, tivemos um padrão semelhante dos principais mercados a esse episódio de agora", acrescenta.   

Para Cardoso, a operação Carne Fraca pode ser um "divisor de águas" se for bem utilizado pelo governo. O professor ainda destaca que, no atual momento vivido pelo Brasil, envolvido em outros escândalos de corrupção, essa é mais uma oportunidade para tentar mudar o cenário da economia brasileira. "Impactos na balança comercial devem ocorrer, mas não considero que seja o elemento mais importante dessa crise. Mas, sim de trazer a tona, de evidenciar em mais esse segmento da economia brasileira, esse padrão de relacionamento entre grandes corporações e do Estado brasileiro que são insustentáveis", conclui. (ANSA)
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