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Quem é o homem que acusa o Papa de acobertar abusos sexuais?

27/08/2018 11h18

ROMA, 27 AGO (ANSA) - Uma denúncia de que o papa Francisco teria acobertado crimes de abuso sexual cometidos pelo cardeal Theodore McCarrick caiu como uma bomba ontem (26) no Vaticano e se transformou no ataque mais forte contra Jorge Mario Bergoglio desde que ele assumiu a Igreja Católica, em março de 2013.   

A acusação veio do arcebispo italiano Carlo Maria Viganò, um ex-núncio apostólico (espécie de embaixador) em Washington, através de uma carta de 11 páginas na qual alega que Francisco ignorou as denúncias de abusos cometidos por McCarrick. O religioso pede a renúncia do Pontífice.   

De acordo com vaticanistas, o documento, porém, tem o objetivo de atingir a reputação de Francisco, conhecido por tendências progressistas e criticado pela ala mais conservadora da cúria.   

Viganò é um arcebispo nascido em Varese, em 16 de janeiro de 1941, que ganhou o apelido de "exterminador de Papas" dentro do Vaticano. Foi ordenado sacerdote em 1968 e, em 1992, assumiu o posto de núncio apostólico na Nigéria. Em 1998, entrou para a Secretaria de Estado da Santa Sé como delegado para as representações pontifícias.   

Mas, por ter cultivado desavenças no Vaticano, Viganò foi agraciado com uma "promoção" para o cargo de núncio apostólico nos EUA, como forma de ficar afastado de Roma, após 11 anos de trabalho na cúria.   

Na ocasião, em outra carta, esta ao então secretário de Estado do Vaticano, Tarcisio Bertone, Viganò disse ter sido alvo de uma "manobra" orquestrada por "personalidades da Santa Sé". Além dessa carta a Bertone e do polêmico documento de 11 páginas sobre Francisco, Viganò escreveu outros textos que abalaram a Igreja nos últimos anos.   

Os mais famosos se referem ao escândalo "VatiLeaks", como ficou conhecido o vazamento de documentos sigilosos da Santa Sé. Em 2012, o jornalista italiano Gianluigi Nuzzi publicou cartas de Viganò em que ele implorava para não ser tirado da Itália e expunha uma suposta rede de corrupção e superfaturamento dentro da Igreja.   

Especialistas dizem que o escândalo foi um dos motivos para a renúncia do então papa Bento XVI - a versão oficial é de que Joseph Ratzinger estava cansado e com saúde frágil para cumprir a agenda de compromissos.   

As relações de Viganò com o sucessor de Bento XVI, Francisco, também não boas. Em 2016, o novo Papa retirou Viganò do posto em Washington e determinou uma "aposentadoria antecipada e forçada" em Varese. O religioso tentou resistir, mas em vão.   

Fontes locais admitem que há tensão entre Viganò e Bergoglio, assim como havia entre Viganò e Ratzinger. O religioso é um dos principais representantes da ala mais conservadora da Igreja Católica e integra um grupo que já pensa no próximo Papa, preparando o terreno para a eleição de um Pontífice tradicionalista.   

Acusação - Viganò diz que Francisco sabia, desde o início do seu Pontificado, que McCarrick era denunciado por abusos sexuais, mas permitiu que o sacerdote continuasse atuando. O prelado de 88 anos foi retirado do colégio cardinalício em julho, após ser acusado de violentar um adolescente há 45 anos, quando era padre em Nova York, e de foçar relações sexuais com seminaristas.   

Viganò diz que alertou pessoalmente Francisco, logo após ele tomar posse, sobre a conduta de McCarrick. "O Papa não fez o menor comentário sobre aquelas graves palavras minhas e não mostrou qualquer expressão de surpresa em seu rosto, como se ele já soubesse do caso, mudando imediatamente de assunto", contou Viganò na carta de 11 páginas.   

Resposta do Papa - A denúncia contra Francisco vem em um momento em que o Papa pede desculpas públicas pelos casos de pedofilia na Igreja. No fim de semana, Bergoglio esteve na Irlanda, país com um dos maiores escândalos de abusos, e afirmou que os crimes são uma "praga" que desafia a comunidade católica.   

O Papa argentino não quis comentar a denúncia de Viganò e limitou-se a dizer que a "carta fala por si só". "Li nesta manhã esse comunicado. Digo sinceramente: leiam vocês atentamente aquele comunicado e façam o julgamento de vocês. Não direi uma palavra sobre isso. Acho que o comunicado fala por si, e vocês têm capacidade jornalística suficiente para tirar conclusões", declarou o Pontífice a jornalistas durante sua viagem de volta entre Dublin e Roma. (ANSA)
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