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Clima dentro do STF contrasta com mobilização tímida na rua

02/08/2012 18h10

Enquanto os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) travavam dura discussão no início de um dos julgamentos mais importantes da história do órgão, do lado de fora da corte, na Praça dos Três Poderes, os manifestantes mobilizados pelo julgamento podiam ser contados nos dedos.

Sob o forte sol das 14h na época do ano mais seca de Brasília, oito pessoas se debruçavam nas grades montadas ao redor do órgão enquanto o tribunal começava a analisar a denúncia do mensalão, "o mais ousado e escandaloso esquema de corrupção e desvio de dinheiro público descoberto no Brasil", segundo a Procuradoria-Geral da República.

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"Uma vergonha: um julgamento tão importante e ninguém aqui para protestar" diz à BBC Brasil o aposentado Edson Lucas Nicole, 49 anos.

Para Nicole, o julgamento não diz respeito somente aos 38 réus, que respondem por crimes como corrupção passiva e ativa, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. "Os réus são todo o Congresso brasileiro, são todos os políticos corruptos".

Ao seu lado, dois estudantes (Rafael Porfírio, 17, e João Pedro Dutra, 14) também se diziam impressionados com o vazio da praça. Eles defendem que, além de condenados, os réus devolvam o dinheiro supostamente desviado pelo esquema.

Planos frustrados

Os estudantes eram maioria entre os manifestantes. Aluna de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), Laia Tavares, 21, diz ter economizado dinheiro por dois meses para comprar a passagem aérea para Brasília.

Ela esperava acompanhar o julgamento dentro do tribunal, mas foi barrada nas grades pelos seis seguranças que controlavam o principal acesso à corte. O motivo alegado: não vestia trajes adequados, com blusa decotada e braços à mostra.

OS ACUSADOS

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Tavares diz que tentará entrar no STF outra vez na sexta-feira, desta vez com roupa mais formal, e que permanecerá em Brasília enquanto durar a greve nas universidades federais, iniciada em maio.

"Seria um grande avanço se os réus fossem condenados e perdessem os direitos políticos, mas acho que não vai acontecer", diz a estudante.

'Eliana Calmon'

Sentado num banco em frente à corte, o dentista Francisco Lima Tabajara estava mais confiante quanto ao desfecho do caso. Para ele, declarações recentes da corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, forçariam o STF a "julgar o caso com seriedade".

Na semana passada, a corregedora provocou polêmica ao dizer que o Supremo seria julgado pela opinião pública durante o processo do mensalão. A fala de Calmon foi criticada pelo ministro do Supremo Marco Aurélio Mello, para quem "colocava o Supremo como uma instituição passível de sofrer pressões."

Segundo Tabajara, porém, a corregedora está certa em cobrar o órgão. "O Marco Aurélio disse que ela está falando muito, mas a população está gostando do que ela fala."

Tabajara pendurou nas grades em volta da corte uma mensagem que enaltecia atuação da corregedora: "Ainda bem que temos a Dra Eliana Calmon para salvar o Judiciário!"

Pró-PT

Nos intervalos das sessões fotográficas ao lado da faixa para jornais e agências de notícias, ele conversava com a única manifestante que não cobrava punição aos réus, a servidora da Funai (Fundação Nacional do Índio) Thereza Alencar. O dentista, índio da etnia Guajajara, a conhecia por seu trabalho no órgão.

Com camiseta e bandeira do PT, Alencar diz esperar que o julgamento "seja técnico e não político".

"Não houve mensalão, o PT não comprou a base aliada. Isso foi apenas uma invenção do (ex-deputado federal) Roberto Jefferson". O ex-deputado, do PTB do Rio de Janeiro, foi o primeiro a denunciar o esquema, em 2005.

"Estão usando o julgamento para derrotar o PT nas eleições municipais."

Apesar da posição da servidora, Tabajara não se importava em ser fotografado ao seu lado. "Discordo da opinião dela sobre o julgamento e discordo da posição da Funai, mas temos que dialogar."

"Espero que os juízes também dialoguem aí dentro e deem uma solução satisfatória para a população."