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Um conflito, duas visões: O que pensam acadêmicos em Israel e na Palestina

21/11/2012 08h56

Quem provocou a nova escalada de violência no Oriente Médio? Existe uma saída diplomática? Por que isso está acontecendo agora?

A BBC ouviu dois acadêmicos - um palestino e um israelense - sobre as origens da onda de violência e as perspectivas para a região nos próximos dias.

Efraim Inbar é professor de estudos políticos e diretor do centro Begin-Sadat de Estudos Estratégicos da Universidade Bar Ilan, de Tel Aviv.

Mahdi Abdul Hadi é diretor da Sociedade Acadêmica Palestina para Estudo de Assuntos Internacionais (Passia, na sigla em inglês).

Confira abaixo o ponto de vista de cada um.

BBC: Quem provocou esta nova escalada de violência?

Inbar: O Hamas. Desde o começo do ano, o Hamas disparou quase mil mísseis no sul de Israel, aterrorizando mais de um milhão de pessoas. Em algum momento, teríamos que pôr fim a isso, como faria qualquer outro país.

Nós nos retiramos de Gaza e a única coisa que queremos é ficar tranquilo. O Hamas é uma organização terrorista que quer destruir o Estado judeu.

Hadi: Israel. Isso começou com o assassinato de Jabari (Ahmed Jabari, chefe da ala militar do Hamas).

Ele era um homem-chave para a segurança dos israelenses. Foi ele quem protegeu (o soldado Gilad) Shalit durante cinco anos. Foi quem negociou a troca de prisioneiros e uma trégua entre Gaza e Israel.

A guerra contra Israel, na verdade, se trata da questão do Irã. Israel quer pôr à prova sua própria capacidade de defesa e a capacidade do Hezbollah, Gaza e Irã. Isso foi provocado por Israel para descobrir a capacidade balística do Irã em Gaza, mas no fim das contas a obsessão do [premiê israelense] Netanyahu é o Irã.

BBC: Por que está acontecendo agora?

Inbar: Nas últimas semanas houve um aumento na quantidade de mísseis lançados pelo Hamas, é difícil resistir à pressão pública para responder.

Hadi: Netanyahu quer se fortalecer antes das eleições. Ele quer passar a imagem de que é o rei de Israel e dar 100% de segurança a Israel.

Em segundo lugar, ele quer ter Barack Obama ao seu lado, antes que seja tarde demais. Já conseguiu fazer com que Obama emitisse um comunicado dizendo que Israel tem direito a se defender.

Terceiro, ele quer apoio da Europa diante da reivindicação dos palestinos (por um Estado próprio) diante da ONU.

BBC: Como você vê o Hamas?

Inbar: O Hamas é uma organização terrorista islamista radical que quer destruir o Estado judeu. Foram eleitos? Hitler também foi eleito pelos alemães.

Hadi: Hamas é parte da sociedade palestina. Ganharam as eleições em 2006, gostemos ou não. Sobreviveram ao golpe de Estado tentado pelo Fatah. Israel chama o Hamas de terrorista, como também chama o Hezbollah e o Irã.

BBC: O que quer cada um?

Inbar: O que o Hamas quer é simplesmente matar judeus. O que nós queremos também é simples: queremos tranquilidade, nada mais.

Não podemos mudar o governo de Gaza, sabemos que o Hamas tem raízes na população palestina, que infelizmente gosta do que eles fazem.

Hadi: A agenda de Israel é a seguinte: conhecer a capacidade militar de Gaza, provar sua própria capacidade de defesa, pôr à prova a posição do governo islâmico do Egito e manter todos os palestinos divididos entre o Hamas e o Fatah.

Em Israel, existem duas escolas de pensamento. Uma é a que tenta enfrentar seus medos, ver como são capazes de administrar essa situação. A outra linha - a linha dura militar israelense - diz: "Temos que eliminar toda a infraestrutura militar de Gaza".

BBC: Como os palestinos são afetados pelo bloqueio de Israel?

Inbar: O bloqueio foi resposta ao lançamento de mísseis. Somos muito estúpidos de dar água e eletricidade para eles. Permitimos que entre comida e muitas outras coisas em Gaza.

Que eu me lembre, durante a Segunda Guerra Mundial, os americanos não permitiam que entrasse água ou eletricidade na Alemanha. Isso é uma guerra.

Hadi: O isolamento fez muito mal a Gaza. E na Cisjordânia a situação não é melhor. Há 600 postos de controles e meio milhão de colonos israelenses.

BBC: Como você vê a assimetria entre as mortes israelenses e palestinas?

Inbar: Somos melhores que eles na defesa dos nossos cidadãos. Eles se escondem entre os civis, disparam mísseis a partir de concentrações civis. Em uma guerra, há danos colaterais.

É isso que eles querem. Jogam com as mortes civis para pressionar a opinião pública. Eles são moralmente responsáveis pelas mortes em Gaza.

Hadi: Há mais de cem mártires em Gaza e milhares de feridos. A maioria das instituições foram destruídas. O povo sofre e vive em uma cultura de guerra, medo, frustração, pobreza e desemprego.

BBC: Existe uma saída diplomática?

Inbar: Depende do Hamas. Não fomos nós quem começamos isso. Eles precisam parar de lançar mísseis. É simples.

Não falamos em soluções. Não se pode pensar em soluções em um conflito em que uma parte quer destruir a outra. O que se pode fazer é conseguir uma trégua de longo prazo. É difícil usar a diplomacia quando alguém quer te matar.

O Egito tem um papel importante. A Irmandade Muçulmana está no poder, em certos pontos são muito parecidos com o Hamas. Por outro lado, o Egito precisa ter uma relação boa com os Estados Unidos para poder alimentar seus milhões de habitantes. Eles estão divididos entre o desejo de apoiar o Hamas e suas necessidades práticas.

Hadi: Com base na experiência de 40 anos de ocupação israelense, ninguém confia que Israel fará um acordo. Eles firmam um pacto, mas logo agem da forma contrária. Nunca respeitam o que prometem. Em segundo lugar, as garantias dadas pelos Estados Unidos e Europa são muito fracas.

O Egito tem muitos elementos. São 26 partidos políticos que apoiam Gaza e desafiam Israel. Há vários assessores do presidente (egípcio) Mursi que recomendam que ele não se meta em nenhuma guerra. Tudo depende de Mursi.

BBC: Como o mundo vê essa nova escalada de violência?

Inbar: A Europa entende que temos o direito à autodefesa. Acreditam que a violência é algo anacrônico, mas o mundo civilizado está com Israel. O Hamas é a barbárie.

Hadi: Isso despertou solidariedade em todas as capitais europeias e árabes. Pela primeira vez, o tom dos ministros das Relações Exteriores do mundo árabe e dos líderes árabes é diferente.

Os meios cobrem o conflito com interpretações diferentes.