Topo

O que é o Índice de Desenvolvimento Inclusivo, indicador de prosperidade proposto em Davos

Marina Wentzel - De Davos para a BBC Brasil

24/01/2018 15h43

O que faz uma nação verdadeiramente próspera? O lucro monetário gerado na produção de bens e serviços? O nível de qualidade de vida? A alta escolaridade? Ou a baixa mortalidade infantil?

Não há unanimidade entre economistas sobre qual é a melhor maneira de medir em estatísticas o bem-estar da população, mas um índice criado pelo Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla inglês) tenta propor uma nova visão sobre o assunto.

Chamado Índice de Desenvolvimento Inclusivo (IDI), o indicador econômico busca responder a essas perguntas levando em consideração 11 aspectos econômicos agrupados em três pilares: crescimento, desenvolvimento e inclusão.

O índice é apresentado como uma alternativa mais sofisticada que o popular conceito de Produto Interno Bruto (PIB), que soma monetariamente tudo que é produzido no país, ao abarcar o conceito social de "inclusão", algo novo na metodologia do Fórum.

"O crescimento (do PIB) é necessário, mas não é mais uma única condição suficiente para um aumento robusto no padrão de qualidade de vida", afirma a organização. Segundo ela, surgiu um "consenso mundial da necessidade de um modelo mais inclusivo e sustentável de crescimento e desenvolvimento que promove alto padrão de vida para todos", acrescentou no relatório.

A validade econômica e política do novo índice, no entanto, divide opiniões.

A posição do Brasil

Hoje o Brasil tem um PIB per capita nominal (a divisão de tudo que é produzido no país pela quantidade de habitantes) de US$ 8.649 dólares ao ano, segundo dados do Banco Mundial - o equivalente a R$ 28 mil, considerando a cotação do dólar a R$ 3,23 desta quarta-feira. Em comparação, o dos Estados Unidos é de US$ 57.638 (R$ 186 mil) e o da Noruega, de US$ 70.911 (R$ 229 mil).

A média mundial é de US$ 10.191, o equivalente a R$ 33 mil.

O Brasil se mantém na antepenúltima posição no ranking que compara 50 países membros e associados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) - fica à frente apenas da África do Sul e Colômbia. A liderança é de Luxemburgo.

No ranking do IDI, por sua vez, o país está em 37º lugar em um grupo de 74 nações, e apresenta uma tendência de "piora moderada". Apesar de estar mais bem colocado no geral (próximo do meio e longe da lanterna), o prognóstico do Fórum Econômico Mundial é levemente pessimista.

"A concentração de riqueza no Brasil está entre as mais altas tanto da América Latina quanto das economias emergentes, e tem aumentado vagarosamente nos últimos anos. Com a recuperação econômica lenta do Brasil, os fatores de crescimento e desenvolvimento do IDI devem melhorar, ao mesmo tempo que tendências futuras poderão ser afetadas pelas reformas promotoras de crescimento propostas pelo governo para combater as atuais limitações fiscais", afirma o documento.

Na avaliação do IDI, o top dez das nações não inclui Estados Unidos (23), nem China (26). Países com forte tradição de igualdade social é que se destacam, nessa ordem: Noruega, Islândia, Luxemburgo, Suíça, Dinamarca, Suécia, Holanda, Irlanda, Austrália e Áustria.

O relatório afirma ainda que "a descoberta-chave de que um crescimento relativamente forte não pode por si só ser responsável por gerar progresso socioeconômico inclusivo e ampla melhora no padrão de vida".

O papel do PIB

O cálculo do Produto Interno Bruto é um conceito que vem sendo discutido há três séculos. Sua criação é atribuída ao economista inglês William Petty (1623-1687), muito embora tenha se aprimorado e adquirido o nome PIB após ajustes propostos pelo economista russo-americano Simon Kutznets, já no século 20.

O PIB costuma ser calculado por área (país) dentro de um determinado período (ano). E há três maneiras de fazer isso: pelo lado da oferta, pelo lado da demanda (consumo) e pelo lado da renda.

No cálculo da oferta, soma-se tudo o que é produzido pelos setores agropecuário, indústria e serviços, considerando-se apenas produtos finais. Na versão da demanda, soma-se tudo o que é consumido por famílias, investido pelo governo e por empresas.

No cálculo da renda, entram todas as remunerações, como salários, rendimentos, juros, aluguéis e lucros distribuídos. Em nações com comércio internacional, exportações e importações são descontadas da conta.

"A vantagem do PIB é a sua relativa simplicidade e o fato de que está altamente relacionado aos outros indicadores. Por si só é uma medida imperfeita de bem-estar social, mas resiliente, porque é metodologicamente simples", defende o professor Ugo Panizza, do Instituto de Graduação de Genebra.

Qual o objetivo?

Apesar de ser um novo índice, o conceito do IDI já vem sendo debatido há tempos.

"Não dá para resumir tudo a dinheiro. Essa é uma questão que vem sendo abordada há tempo. As Nações Unidas criaram o Índice de Desenvolvimento Humano. Há também o coeficiente Gini de desigualdade", diz Panizza.

"Está comprovado que o aumento do PIB por si só não reduz a desigualdade, então por isso esse índice é válido. Mas precisamos destacar que eles estão comparando maçãs e peras, então é uma escolha política", opina o economista Cláudio Frischtak.

O professor Cláudio Considera, da Fundação Getulio Vargas (FGV), engrossa esse argumento, ressaltando que a escolha dos pesos dados aos componentes da fórmula do índice é aleatória, e por isso é de se questionar qual a intenção do Fórum ao fazer essa escolha, que ele também chama de "política".

"A primeira coisa que você tem que se perguntar é: que fatores compõem esse índice? Educação tem mais peso? Saúde? Longevidade? O que eles estão querendo promover com isso?"

Para Considera, a organização "está fazendo um discurso" usando os dados econômicos para mostrar que está "mais social" na tentativa de apaziguar seus críticos.

Frischtak, por sua vez, avalia que a posição do Fórum está sincronizada com as ameaças do cenário político mundial.

"A necessidade de um índice como esse é contrapor-se às forças do populismo no mundo. Sem dúvida, há uma agenda de defesa dos interesses da ideologia democrática liberal capitalista, como nos moldes da França e da Alemanha", conclui.

'Experiências conceituais'

Já o ministro Wellington Moreira Franco, da Secretaria de Governo - pasta responsável por gerenciar investimentos estratégicos - disse à BBC Brasil que aplicar no Brasil políticas públicas de bem-estar social semelhantes às praticadas nos países do topo da lista seria irrisório.

"Não dá pra você transplantar experiências conceituais, intelectuais, que foram geradas em uma sociedade que tem uma cultura, que tem uma história, que tem um espaço socioeconômico próprio em uma outra sociedade diferente que tem outro espaço, outra cultura, outro tempo e outra articulação social-econômica", argumenta.

"Eu creio que, no nosso caso, nós temos que enfrentar os nossos problemas primeiro. E segundo, os economistas têm que acabar com essa volúpia de querer usar a sociedade brasileira como experimento para criar novas teorias econômicas."

"Por exemplo, o grande fracasso do governo Dilma foi querer criar uma nova matriz econômica partindo do pressuposto de que o que gera crescimento é o consumo. A sociedade humana já provou pro mundo que o que gera crescimento não é o consumo. É investimento em produtividade e tecnologia", defendeu Moreira Franco, que também foi ministro da ex-presidente.