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'Sou seu amigo e fiquei bastante chocado', diz Sarney sobre prisão de Lula

André Coelho/Agencia O Globo
Imagem: André Coelho/Agencia O Globo

João Fellet

Da BBC Brasil, em Brasília

06/04/2018 13h08

O ex-presidente José Sarney (MDB) lamentou "profundamente" a ordem de prisão contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Sou seu amigo e fiquei bastante chocado", afirmou Sarney em nota enviada à BBC Brasil em resposta a um pedido de entrevista.

Sarney afirmou ainda que Lula "prestou grandes serviços ao país e retirá-lo da vida pública é frustrar grande parcela do povo brasileiro".

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"Respeitando a decisão do Supremo Tribunal Federal, meu ponto de vista pessoal é que a Constituição é muito clara no que ser refere à presunção de inocência", disse.

Um dos principais nomes do MDB, o líder maranhense presidiu o Senado durante os dois primeiros anos do governo Lula (2003-2005).

Após o escândalo do mensalão, Sarney ajudou a articular uma aliança entre seu partido e o PT, arranjo mantido até as vésperas do impeachment de Dilma Rousseff, em 2016. Nesse período, os dois se tornaram aliados próximos e trocaram vários elogios públicos - uma reviravolta na história de dois líderes que despontaram em polos políticos opostos.

Nesta quinta-feira, um dia após o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitar um pedido de habeas corpus apresentado pela defesa de Lula, o juiz federal Sérgio Moro ordenou a prisão do petista.

De adversários a aliados

Em 1980, quando Lula foi preso pela ditadura militar por liderar uma greve de metalúrgicos no ABC Paulista, Sarney era um dos principais apoiadores do regime no Senado.

Mesmo tendo apoiado as reformas de base defendidas pelo presidente João Goulart, deposto pelos militares em 1964, Sarney recebeu o apoio do regime ao concorrer ao governo do Maranhão, em 1966, e manteve-se próximo do regime até seu declínio.

Em 1984, na véspera da eleição presidencial indireta que poria fim à ditadura, deixou o governista PDS e se filiou ao PMDB para ser vice da chapa vitoriosa liderada por Tancredo Neves.

Com a morte de Tancredo, Sarney assumiu a Presidência e comandou o país durante a redemocratização, entre 1985 e 1990.

Durante o mandato, o maranhense foi alvo de vários ataques de Lula, que seria um dos candidato a sua sucessão.

Em 1986, Lula disse que Sarney não faria a reforma agrária, pois era "grileiro no Estado do Maranhão e não vai querer entregar as terras que tomou dos posseiros".

Lula foi para o segundo turno em 1989, mas perdeu a eleição para Fernando Collor. A relação entre Sarney e o petista começou a mudar em 1994, quando Lula concorreu mais uma vez à Presidência.

Na ocasião, o maranhense declarou que não compartilhava da "lulafobia" que setores políticos manifestavam em relação ao petista.

Após os oito anos de governo de FHC, Sarney apoiou Lula em nova candidatura à Presidência - dessa vez vitoriosa -, em 2002. "Será o primeiro presidente da história do Brasil oriundo da área do trabalho e não dos interesses consolidados capitalistas", disse o maranhense.

Anos depois, após a eclosão do escândalo do mensalão, Lula recorreu a Sarney para agregar o PMDB à erodida base de apoio do governo no Congresso.

O PT começou a apoiar candidatos indicados por Sarney em eleições no Maranhão, e Lula passou a elogiar o aliado publicamente.

Em 2009, quando Sarney foi acusado de nomear parentes por atos secretos, disse que o maranhense "tinha história no Brasil suficiente para que não seja tratado como se fosse uma pessoa comum".

No ano seguinte, Sarney devolveu o agrado durante a cerimônia de inauguração de um trecho da Ferrovia Norte-Sul.

"Assisti à história como protagonista e como expectador, mas nunca vi um presidente como Lula da Silva. Agradeço a sorte de terminar os anos que me restam na política ao lado de Lula, que transforma o Brasil", disse.

Leia a seguir a nota de José Sarney na íntegra:

"Lamento profundamente a ordem de prisão do Presidente Lula. Ele prestou grandes serviços ao país, e retirá-lo da vida pública é frustrar grande parcela do povo brasileiro.

Sou seu amigo e fiquei bastante chocado.

Respeitando a decisão do Supremo Tribunal Federal, meu ponto de vista pessoal é que a Constituição é muito clara no que ser refere à presunção de inocência."

José Sarney

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