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Por que prisão de suspeito de ataque em Toronto sem disparos gerou tanto espanto e discussão

24/04/2018 12h01

A tranquilidade com a qual um policial prendeu o suspeito de avançar com uma van sobre pedestres em Toronto, no Canadá, nesta segunda, 23, sem que houvesse um único disparo de tiro, provocou espanto, elogios e muita discussão nas redes sociais. Dez pessoas morreram e 16 ficaram feridas no atropelamento.

Um vídeo mostra o suspeito pelo ataque, o estudante Alek Minassian, de 25 anos, apontando um objeto para o policial e gritando: "Me mate!".

O policial, que segura um arma, pede então que Minassian se abaixe e quando o suspeito diz que tem uma arma, ouve de volta: "Eu não me importo. Abaixe-se." Minassian é então visto deitado e o policial o prende.

Muitos na América do Norte se espantaram que o ataque não terminara com o suspeito sendo morto em um tiroteio com a polícia - como têm ocorrido em incidentes nos Estados Unidos, inclusive em casos com suspeitos já desarmados.

"Estudos mostram que a polícia canadense reluta em usar força letal", diz Rick Parent, criminologista na Simon Fraser University no Estado canadense de British Columbia.

"Uma análise sobre dados de uso de armas de fogo pela polícia ao longo dos anos, revelou que, na comparação com seus colegas americanos, oficiais canadenses disparam bem menos suas armas. Mas, assim como os americanos, eles correm vários riscos na proteção do público."

No entanto, um acadêmico norte-americano disse à BBC que o policial tinha o "dever" de matar o suspeito, caso este estivesse portando uma arma.

'Dever de matar'

O chefe da polícia de Toronto, Mark Saunders, disse a jornalistas que o oficial fez um "trabalho fantástico" para entender a "circunstância e o ambiente" e chegar a uma "solução pacífica".

Ele disse que a polícia na cidade foi "ensinada a usar o mínimo de força possível em qualquer situação".

Mike McCormack, presidente da Associação de Polícia de Toronto, disse ao jornal Globe and Mail que o policial foi um "herói" e que teria justificativa para atirar.

"Este oficial olhou para o que estava acontecendo e determinou que ele poderia lidar com isso da maneira que fez", afirmou. Ele disse ter conversado com o policial, que ele lhe disse: "Acabei de fazer meu trabalho. O que fiz não foi grande coisa. Mas olhe para essas pobres pessoas (feridas)."

O ministro da Segurança Pública do Canadá, Ralph Goodale, elogiou a ação policial "corajosa e profissional".

Nas redes sociais, alguns elogiaram o "comedimento" do oficial - enquanto outros, como o escritor americano Viet Thanh Nguyen, destacaram o aparente contraste desse comportamento com o de policiais norte-americanos.

Nguyen tuitou: "O que há de errado com o treinamento policial americano? Atirar pra matar? Este policial canadense prendeu um assassino em massa sem dar nenhum tiro".

Um outro usuário do Twitter, chamado Simar, escreveu que a polícia em Toronto "prende um assassino sem atirar enquanto nos EUA os policiais assassinam e intimidam negros quer eles eles estejam segurando seus celulares em seus próprios jardins ou tomando um café na rua. Chefes de polícia, olhem isso. Bravo, polícia de Toronto".

Michael Lyman, professor de Administração de Justiça Criminal na Columbia University no Missouri, disse à BBC que o policial teria "o dever" de matar o suspeito.

"Assumindo que o suspeito está segurando uma arma e apontando para os policiais, é preocupante que o oficial não o esteja abordando com força letal", disse ele.

"As pessoas morreram como resultado das ações do suspeito. Podemos supor que o oficial sabia disso? Se assim for, isso muda um pouco as coisas quando o nível de ameaça pública é maior. Sob essa circunstância, parece que o oficial tinha o dever de responder com força letal - presumindo que ele estava segurando uma arma de fogo", disse ele.

William Terrill, da Escola de Criminologia e Justiça Criminal da Universidade do Estado do Arizona, disse que o policial pode ter julgado que o objeto mantido pelo suspeito não representava uma ameaça.

"É possível que o policial tenha pensado que o objeto na mão da pessoa não era uma arma, ou pelo menos não uma arma de verdade. O fato de o oficial ter deixado a proteção de seu carro e ter se exposto aumenta essa suposição", afirmou.

"Também é possível que o policial tenha reconhecido a possibilidade de suicídio (do suspeito) e tenha optado não usar a força letal. Ou, a única opção que ainda me ocorre, é que o policial simplesmente congelou."

David Klinger, professor de Criminologia e Justiça Criminal da Universidade de St Louis no Missouri, disse que o vídeo não mostra detalhes suficientes para uma avaliação esclarecedora das ações do oficial.

"Se o policial pudesse ver claramente o que estava na mão do suspeito, e que aquilo não era uma arma, então é uma simples questão de um policial fazer seu trabalho corretamente", disse ele.