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Como a saúde mental de garotos presos em caverna na Tailândia pode ser afetada

04/07/2018 08h24

O caso dos 12 meninos e de seu treinador de futebol encontrados vivos após nove dias em uma caverna no norte da Tailândia tomou conta do mundo.

Equipes de resgate tentam descobrir agora como retirá-los da caverna com segurança, enquanto militares tailandeses alertam que as crianças podem ser obrigadas a permanecer no local por até quatro meses.

Os meninos, de idades entre 11 e 16 anos, passaram 9 dias isolados no escuro sem alimentos sobre uma rocha em uma caverna apertada, e terão de passar mais um bom tempo nessas condições. Mesmo recebendo alimentos e atendimento médico, enfrentam uma situação dramática extrema, que levanta preocupações sobre o impacto disso tudo na sua saúde mental.

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Andrea Danese, psiquiatra na Clínica Nacional e Especialista em Trauma e Ansiedade de Crianças e Adolescentes, em Londres, diz que, em curto prazo, um incidente dessa proporção poderia deixar crianças amedrontadas, ansiosas, irritáveis e extremamente apegadas a outras pessoas.

Ele pondera, no entanto, que o fato de as crianças na Tailândia serem parte de uma comunidade - nesse caso, um time de futebol - terá sido uma "proteção" mental.

Donelson R. Forsyth, da Universidade de Richmond, na Virgínia, concorda.

"Casos anteriores sugerem que o grupo vai se engajar, organizando os recursos conjuntos de que dispõe para sobreviver, porque se há alguém que pode sobreviver a um desastre como esse, esse alguém é um grupo - e organizado", diz ele.

Embora possam surgir emoções como sentimento de culpa, desânimo, raiva e problemas de hierarquia entre eles, o histórico do grupo enquanto equipe pode ajudar os garotos a permanecerem unidos, acrescenta.

O que precisa acontecer agora?

Esta é uma situação muito incomum, ainda mais porque, ao contrário de incidentes anteriores - como o caso dos mineiros chilenos que ficaram presos sob a terra por quase 70 dias em 2010 -, os envolvidos agora, salvo uma exceção, o técnico de 25 anos, são crianças ou adolescentes.

Danese enfatiza o papel essencial que adultos têm a desempenhar para ajudá-las a lidar com a situação atual, e isso envolve desde o treinador que está preso com eles até os mergulhadores de resgate e da equipe médica.

Ele diz que uma comunicação "clara e honesta" com as crianças será essencial para minimizar qualquer possível trauma.

"É importante que eles tenham informações sobre o que vai acontecer", diz o especialista, apontando que qualquer imprevisibilidade pode aumentar eventuais impactos negativos de longo prazo na saúde mental deles.

As crianças também devem ser encorajadas a falar sobre seus sentimentos e evitar esconder suas emoções.

A previsão é que o contato com a família, por meio de linhas telefônicas que estão sendo instaladas na caverna, também ajude a melhorar o ânimo dos meninos.

E os mergulhadores terão o importante papel de fazer companhia ao grupo.

12 meninos e técnico - Royal Thai Navy Facebook Page via AP - Royal Thai Navy Facebook Page via AP
Os 12 meninos, entre 11 e 16 anos, e o técnico estão em uma área seca da caverna
Imagem: Royal Thai Navy Facebook Page via AP

E a falta de luz?

Um dos maiores desafios do grupo em se adaptar à caverna tem sido a escuridão.

Sem luz suficiente para distinguir entre a noite e o dia, o relógio biológico ou o ritmo circadiano "oscila fora de sincronia", de acordo com o professor Russell Foster, diretor de Neurociência Circadiana na Universidade de Oxford.

Isso não terá impacto apenas sobre seus padrões de sono, já que o ritmo circadiano também afeta o humor, a função intestinal e muitas outras áreas do corpo humano.

No entanto, o professor Foster acredita que as equipes de resgate tentarão instalar iluminação dentro das cavernas para imitar o ciclo noturno e diurno, como aconteceu com os mineiros chilenos.

Além de prevenir o jet lag quando retornarem à superfície - ou seja, a sensação de cansaço e confusão normalmente associada a longas viagens de avião para lugares com fuso horário diferente - a exposição planejada à luz ajudará o grupo a desenvolver, na medida do possível, uma rotina diária, o que, segundo Danese, lhes dará "alguma ideia de normalidade".

Qual será o efeito a longo prazo?

O impacto das experiências que tiverem na caverna provavelmente permanecerá com as crianças por muito tempo após o eventual resgate.

Sandro Galea, reitor da Escola de Saúde Pública da Universidade de Boston, e Robert A. Knox, da mesma instituição, dizem que crianças que experimentam um trauma dessa magnitude "têm um alto risco de sofrer transtornos de humor de médio a longo prazo", como depressão, ansiedade e transtorno do estresse pós-traumático.

Isso não significa que todos os meninos desenvolverão esse tipo de transtornos, mas os especialistas estimam que "um terço do grupo" venha a ter problemas de saúde mental como resultado dessa experiência.

Destes, um terço poderá experimentar problemas de longo prazo, diz Galea, o que, com a ajuda certa, é tratável com terapia cognitivo-comportamental e medicação.

Mas a relação dos integrantes do grupo entre si e com o mundo exterior - vista como um dos fatores mais importantes no subsolo - desempenhará um papel significativo na sua recuperação a longo prazo.