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Tudo o que você precisa saber sobre os diferentes tipos de hepatite, que pode levar à morte

A hepatite é a inflamação do fígado e é a segunda maior doença infecciosa letal do mundo - Getty Images
A hepatite é a inflamação do fígado e é a segunda maior doença infecciosa letal do mundo Imagem: Getty Images

Renata Turbiani - De São Paulo para a BBC News Brasil

31/07/2019 05h29

Todos os anos, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as hepatites virais causam 1,7 milhão de mortes no mundo.

No Brasil, entre 1999 a 2018, foram registrados 632.814 casos da doença. Desse total, 167.108 (26,4%) foram do tipo A, 233.027 (36,8%) do B, 228.695 (36,1%) do C e 3.984 (0,7%) do D (ou Delta).

Os dados constam no Boletim Epidemiológico de Hepatites Virais 2019, divulgado esta semana pelo Ministério da Saúde.

A boa notícia é que, de 2008 a 2018, houve redução de 7% no número de notificações, passando de 45.410 para 42.383. O levantamento também apontou queda de 9% nos óbitos, saindo de 2.362 em 2007 para 2.156 em 2017, sendo 1,6% associados à hepatite A, 21,3% a B, 76% a C e 1,1% a D.

Em relação à distribuição dos casos pelo país, o Nordeste, concentra a maior proporção das infecções pelo vírus A (30,3%), o Sudeste, pelos vírus B e C, com 34,9% e 60,0%, respectivamente, e o Norte acumula, pelo D (74,9%).

O que é hepatite?

Segunda maior doença infecciosa letal do mundo (a primeira é a tuberculose), a hepatite é a inflamação do fígado. As principais causas dessa condição são os vírus (A, B, C, D e E) - alguns medicamentos, consumo excessivo de álcool e outras drogas e doenças autoimunes, metabólicas e genéticas também podem desencadeá-la.

Para saber mais sobre ela, a BBC News Brasil conversou com o patologista Helio Magarinos Torres Filho, membro da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica (SBPC) e diretor médico do Richet Medicina & Diagnóstico; Ivan França, infectologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, e Raquel Stucchi, infectologista e professora da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenadora do Grupo de Estudos das Hepatites da FCM.

Hepatite A

Em 2018, de acordo com o Ministério da Saúde, foram notificados 2.149 casos de hepatite A no Brasil, o que equivale a uma taxa de detecção de 1 caso por 100 mil habitantes - em 2008, era de 6,2 por 100 mil habitantes.

Sua transmissão se dá por contágio fecal-oral, na ingestão de alimentos e/ou água contaminados, especialmente em locais com condições precárias de saneamento básico. Outra forma, essa menos comum, é através da prática sexual oral-anal, pelo contato da mucosa da boca com o ânus da pessoa infectada.

Nem sempre a hepatite A apresenta sintomas, apenas nos quadros agudos. Entre os principais estão dor abdominal, diarreia, náusea, vômito, intolerância a cheiros, pele e olhos amarelados, urina escura, fezes claras, mal estar e dor no corpo.

Na maioria dos casos, a doença se cura sozinha, em uma ou duas semanas, e a pessoa adquire imunidade, ou seja, não terá uma nova infecção.

O tratamento deste tipo de hepatite é sintomático e ainda inclui repouso, dieta e evitar o consumo de bebida alcoólica.

A melhor forma de se prevenir é com a vacina, disponível gratuitamente para crianças de 15 meses a 5 anos incompletos (4 anos, 11 meses e 29 dias) nas unidades básicas de saúde, e para grupos de risco (pessoas de qualquer idade que tenham hepatopatias crônicas, coagulopatias, hemoglobinopatias, HIV, doenças imunossupressoras e de depósito, fibrose cística e trissomias, candidatos a transplante de órgãos e doadores de órgãos cadastrados em programas de transplantes), nos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIEs) - para os demais indivíduos, a imunização está disponível em clínicas e laboratórios privados.

Além disso, é importante lavar bem os alimentos antes de consumi-los, não comprá-los em qualquer lugar, só beber água limpa, ter atenção à água que usará para cozinhar e cuidar da higiene pessoal.

Hepatite B

No ano passado, 13.992 casos de hepatite B foram registrados no país, o que representa 6,9 casos por 100 mil habitantes.

Nesta variação, a transmissão ocorre pelo contato com sangue contaminado, por meio do compartilhamento de seringas, agulhas, lâminas de barbear, alicates de unha e outros objetos que furam ou cortam, materiais que não foram esterilizados corretamente, sexo desprotegido e de mãe para filho (transmissão vertical) no parto.

Apresenta tanto formas agudas, ou seja, quando há sintomas - são cerca de 10% das ocorrências, tendo as mesmas manifestações clínicas da hepatite A -, quanto crônicas (quando o vírus persiste no organismo por mais de seis meses).

A enfermidade tem tratamento, ofertado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), e controle, a fim de que não evolua para cirrose e câncer de fígado. Ele é feito com a administração de medicamentos antivirais.

O Ministério da Saúde também disponibiliza vacina. Para as crianças, são quatro doses (ao nascer, 2, 4 e 6 meses) e, para os adultos, três doses a depender da situação vacinal. Pessoas que tenham algum tipo de imunodepressão ou o vírus HIV precisam de um esquema especial, com dose em dobro.

Hepatite C

Pelos dados do Boletim Epidemiológico de Hepatites Virais 2019, no ano passado foram notificados 26.167 casos de hepatite C no Brasil, com taxa de detecção de 13 por 100 mil habitantes.

Dentre todos os tipos da doença, essa é a mais mortal. Para se ter uma ideia, de 2000 a 2017, foram 53.715 óbitos associados a ela.

O Ministério da Saúde relata que, atualmente, mais de 500 mil pessoas convivem com o vírus e não sabem, já que se trata de uma enfermidade geralmente silenciosa, até que atinja maior gravidade.

A forma crônica é comum em 80% dos pacientes e, desses, 20% podem evoluir para cirrose hepática e de 1% a 5% para câncer de fígado.

A patologia é transmitida da mesma forma que a B, por contato com sangue contaminado, sexo desprotegido e de mãe para filho na hora do parto.

O tratamento, gratuito pelo SUS, se dá com o uso de antivirais de administração oral, determinados de acordo com o genótipo do vírus e o comprometimento do fígado. Ele é realizado de três meses a um ano e tem excelentes chances de cura, passando de 95%.

Por não ter vacina, a melhor forma de se prevenir é não compartilhar objetos de uso pessoal e cortantes ou perfurantes, usar preservativo e, ao se submeter a qualquer procedimento, certificar-se de que os materiais usados são esterilizados e os descartáveis não estão sendo reaproveitados.

Hepatite D

No ano passado, no país, houve 145 casos da hepatite D, também chamada de Delta. Esse tipo da enfermidade depende da presença do vírus B para contaminar uma pessoa.

Da mesma forma que as outras variações dificilmente apresentam sintomas - que também são os mesmos. A forma de transmissão é por relações sexuais sem camisinha com alguém infectado, da mãe doente para o filho durante o parto e pelo compartilhamento de objetos cortantes.

A infecção pode ser tanto aguda quanto crônica e tem tratamento - com duração de três meses a um ano - e controle, evitando a evolução para cirrose e câncer. A melhor forma de se prevenir e não contrair a hepatite B, o que se consegue com vacina.

Hepatite E

Esse tipo de hepatite tem baixa prevalência no Brasil, tanto que nem consta no Boletim Epidemiológico de Hepatites Virais 2019.

Seu contágio é igual ao da A: por condições precárias de saneamento básico, água e alimentos contaminados e falta de higiene pessoal.

Também quase não apresenta sintomas, mas, quando eles surgem, são basicamente os mesmos das demais: cansaço, enjoo, vômitos, febre, dor abdominal, fezes claras, urina escura e pele e olhos amarelados.

Na maioria dos casos, não necessita de tratamento, sendo indicado apenas repouso, dieta e não consumir bebida alcoólica. Há o risco de cronificar em pessoas imunodeprimidas e transplantados.

Por não ter vacina, a melhor forma de se prevenir é lavar bem as mãos após ir ao banheiro e antes de comer, lavar bem os alimentos e não ter contato com água de valões, riachos, chafarizes, enchentes e esgoto.

Exames periódicos

Junto com as recomendações relacionadas a cada um dos tipos das hepatites virais, os especialistas consultados pela BBC News Brasil afirmam que é imprescindível fazer, pelo menos, uma vez no ano, exames de rotina para saber se tem a doença - são realizados com a coleta de uma amostra de sangue.

Isso porque o diagnóstico precoce é essencial para evitar complicações e para o sucesso do tratamento.

Em anúncio recente, por conta do Julho Amarelo, ação que visa prevenir e conscientizar sobre as hepatites virais, o governo disse que pretende aumentar o número de testagem e que irá ampliar a expectativa de tratamento para 50 mil por ano.