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Brexit: derrota dura após vitória relâmpago de Boris Johnson traz mais confusão ao processo

Henry Nicholls - 3.out.2019/Reuters
Imagem: Henry Nicholls - 3.out.2019/Reuters

22/10/2019 17h23

Parlamento aprova, pela primeira vez, acordo de saída da UE, mas rejeita cronograma do premiê; com isso, o processo volta para o limbo.

A sessão desta terça-feira (22/10) no Parlamento britânico começou com uma vitória ? a primeira ? do premiê Boris Johnson em sua tentativa de fazer avançar o Brexit, processo de saída do Reino Unido da União Europeia (UE). Mas essa vitória durou poucos minutos, e o Brexit logo voltou para o limbo.

Primeiro, o Parlamento aprovou, por 329 votos a 299, o acordo costurado (chamado de Lei do Acordo de Retirada, ou Withdrawal Agreement Bill) por Johnson com seus pares da UE. Trata-se do primeiro acordo acatado pelo Parlamento britânico desde o plebiscito que decidiu o Brexit, em 2016.

No entanto, essa aprovação seria a primeira de uma série de votações no Parlamento exigidas para que o acordo de fato fosse ratificado. Poucos minutos depois, Johnson foi derrotado na segunda votação: os parlamentares rejeitaram o cronograma pedido pelo premiê, que queria tramitação de urgência para a legislação para votá-la nos três próximos dias ? com o objetivo de manter o Brexit no prazo previsto, de 31 de outubro.

O prazo foi considerado inviável pelos legisladores, que afirmaram que três dias seriam insuficientes para analisar uma legislação tão complexa e propor emendas.

Com a rejeição dos parlamentares, Johnson anunciou uma "pausa" no acordo aprovado, afirmando que vai consultar a União Europeia a respeito de novos adiamentos ao Brexit e insistindo que o Reino Unido deveria deixar o bloco europeu na semana que vem.

"Agora, a UE deverá decidir como responder ao pedido do Parlamento por adiamento", declarou Johnson na tribuna parlamentar. "Vou falar com os Estados-membros da UE a respeito de suas intenções. Até que eles tomem uma decisão, vamos pausar essa legislação. Deixem-me ser claro, nossa política continua ser a de que não devemos adiar."

Johnson também deixou a porta aberta para uma eventual saída da UE mesmo que não haja acordo. "O governo deve agora tomar o único caminho responsável e acelerar nossos preparativos para um desfecho sem acordo", declarou o premiê.

Com isso, então, cria-se nova confusão em torno do processo do Brexit. Não se sabe se o acordo aprovado nesta terça terá prosseguimento, se o prazo de 31 de outubro será implementado ou mesmo se haverá um acordo de saída (hipótese em que, a partir de 31 de outubro, as relações migratórias, comerciais, aduaneiras e fronteiriças entre UE e Reino Unido ficam completamente indefinidas).

'Próximos passos'

Pelo Twitter, a porta-voz da Comissão Europeia, braço executivo da UE, Mina Andreeva, afirmou que o órgão espera que o governo do Reino Unido "informe sobre os próximos passos. Donald Tusk (presidente do Conselho Europeu, que define a agenda política do bloco) está em consulta com líderes a respeito do pedido de uma extensão (do Brexit) até 31 de janeiro de 2020".

Até agora, alguns líderes europeus se mostravam relutantes a novas extensões. "Temos um acordo. Por que precisaríamos de uma prorrogação?", questionou o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, no sábado, após a costura do acordo entre Johnson e a UE.

Outros representantes executivos do bloco também afirmaram que não há mais margem de negociação para novos acordos caso este não vigore.

De volta a Londres, o líder da oposição trabalhista, Jeremy Corbyn, que chegou a pedir um novo plebiscito sobre o Brexit, afirmou que o Parlamento mostrou nesta terça que "se recusa a debater uma legislação tão importante em apenas dois dias com pouca análise sobre o impacto econômico da lei".

"O primeiro-ministro é autor de sua própria desgraça", prosseguiu Corbyn. "Então faço a ele uma oferta: trabalhe conosco para acertar um cronograma razoável, e suspeito que esta Casa vá votar para debater, analisar e, espero, confiar nos detalhes dessa lei. Seria o jeito sensato de seguir adiante, e essa é a oferta que faço em nome da oposição."

O resultado da votação nesta terça também levou parlamentares escoceses a pedirem independência.

"O fato é que se trata de mais uma derrota humilhante para o premiê, que tentou impor nesta Casa uma lei que exige o devido escrutínio", declarou no Parlamento o líder do partido escocês SNP, Ian Blackford.

"Está absolutamente claro o que deve acontecer agora (...). O premiê foi instruído a buscar uma extensão (para o Brexit). (...) Ficou claro que este governo não tem confiança, que ignorou o povo escocês e o Parlamento escocês. É óbvio que se queremos garantir nossos direitos como cidadãos europeus, então a Escócia tem de se tornar um país independente."

Mais cedo, Johnson dissera que, se o impasse em torno do acordo com a UE se estendesse até o ano que vem, ele preferiria extinguir a legislação por completo e convocar novas eleições, com a expectativa de ganhar apoio popular nas urnas.

O que diz o acordo

O acordo agora em suspenso é o primeiro já aprovado pelo Parlamento britânico em torno do Brexit ? até então, três tentativas feitas pela premiê anterior, Theresa May, haviam sido rejeitadas pelos legisladores.

As principais mudanças em relação ao acordo proposto anteriormente por May se referem à Irlanda: desde o início das negociações, uma das questões essenciais para o premiê britânico era se livrar do controverso backstop, a "salvaguarda irlandesa", que na visão dos críticos levaria o Reino Unido a ficar vinculado aos regulamentos da União Europeia por tempo indeterminado.

Trata-se de uma política negociada por May sobre o futuro da fronteira entre a Irlanda (república independente que integra a UE) e a Irlanda do Norte (território que, junto com Escócia, País de Gales e Inglaterra, forma o Reino Unido) ? e que se tornou o principal obstáculo encontrado pelos parlamentares britânicos para aprovar o pacto anterior de saída.

O atual acordo elimina essa polêmica cláusula. Assim, o primeiro-ministro espera contar com o apoio do seu partido e do Partido Unionista Democrático (DUP) da Irlanda do Norte para a aprovação do novo texto no Parlamento.

Pelo novo acordo, o Reino Unido segue se comprometendo a pagar a "conta do divórcio", avaliada em quase 50 bilhões de euros.

Está prevista também uma "fronteira aduaneira legal" entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda, a qual permanecerá dentro da União Europeia. Mas, na prática, a "fronteira" em termos alfandegários será entre a Grã-Bretanha e a ilha da Irlanda, uma vez que os controles serão feitos nos "portos de entrada" da Irlanda do Norte (o que evitará a necessidade de levantar uma fronteira dentro da ilha para executar esses procedimentos).


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