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'Provas avassaladoras': O que diz relatório da Câmara dos EUA sobre impeachment de Trump

Lucas Jackson/Reuters
Imagem: Lucas Jackson/Reuters

04/12/2019 08h57

Segundo relatório produzido por comitê, Trump colocou seus interesses pessoais "acima dos interesses dos Estados Unidos" ao "solicitar interferência estrangeira" da Ucrânia para ajudar sua reeleição em 2020.

Um comitê legislativo ligado ao processo de impeachment do presidente americano, Donald Trump, concluiu que as evidências de conduta imprópria do mandatário são "esmagadoras".

Segundo o relatório produzido por congressistas da Câmara dos Representantes (equivalente à Câmara dos Deputados brasileira), Trump colocou seus interesses pessoais "acima dos interesses dos Estados Unidos" ao "solicitar interferência estrangeira" da Ucrânia para ajudar sua reeleição em 2020.

O documento da comissão liderada por democratas serve de base para o processo de impeachment contra o líder republicano.

Trump nega todas as acusações e classificou o inquérito de "caça às bruxas" e "antipatriótico".

Depois da publicação do relatório, a secretária de imprensa da Casa Branca, Stephanie Grisham, afirmou que os democratas "fracassaram em produzir qualquer prova de conduta imprópria" e que o relatório "reflete nada mais do que suas frustrações".

O documento agora segue para o Comitê Judiciário da Câmara dos Representantes, que dará início aos trabalhos nesta quarta-feira (4) em torno das acusações formais contra Trump.

O que diz o relatório?

O relatório do inquérito sobre impeachment de Trump-Ucrânia foi divulgado nesta terça-feira (3) pelo Comitê Permanente de Inteligência da Câmara.

Ele afirma que a investigação "descobriu os esforços do presidente Trump ao longo de meses para usar os poderes de seu gabinete a fim de solicitar interferência estrangeira em seu nome nas eleições de 2020".

"O esquema do presidente Trump subverteu a política externa dos EUA em relação à Ucrânia e minou nossa segurança nacional em favor de duas investigações de motivação política que ajudariam sua campanha de reeleição", diz o documento.

"O presidente exigiu que o recém-eleito presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, anunciasse publicamente investigações sobre um rival político que ele aparentemente mais temia, o ex-vice-presidente Joe Biden, e sobre uma teoria desacreditada de que foi a Ucrânia, não a Rússia, que interferiu nas eleições presidenciais de 2016."

Segundo o documento, as evidências de conduta imprópria são "impressionantes" e há também evidências de obstrução do (inquérito do) Congresso".

Análise do repórter da BBC Anthony Zurcher

Qualquer pessoa que ouviu as declarações de Adam Schiff no processo de impeachment há duas semanas não se surpreendeu com o relatório divulgado agora. Mas em meio às 300 páginas do documento há alguns detalhes chocantes.

A companhia telefônica AT&T entregou aos investigadores registros do advogado pessoal de Trump, Rudolph Giuliani, que jogam luz sobre as conexões entre ele e a Casa Branca.

A partir de abril deste ano, ele teve diversas conversas telefônicas com números ligados à Casa Branca, mais especificamente com Agência de Administração e Orçamento, instância governamental responsável em última instância por segurar o envio de recursos para a Ucrânia.

Mesmo sem detalhes sobre o que foi discutido, a simples existência desses contatos já mina os argumentos de quem afirma que Giuliani agiu por conta própria, sem conhecimento de autoridades.

Diversas testemunhas, incluindo o embaixador americano Gordon Sondland, afirmaram que Giuliani os orientou diretamente, em nome do presidente, para pressionar autoridades da Ucrânia a abrirem investigações que fossem vantajosas para Trump.

O que acontece agora?

O Comitê de Inteligência da Câmara aprovou o relatório nesta terça-feira por 13 votos a 9 e o encaminhou ao Comitê Judiciário da Casa.

Os depoimentos da nova fase começarão com quatro acadêmicos constitucionalistas, que vão explicar como o impeachment funciona. A Casa Branca se recusa a participar dessas oitivas, sob alegação de falta de imparcialidade.

As acusações formais contra Trump devem envolver abuso de poder, obstrução de Justiça e desobediência do Congresso.

Os democratas pretendem votar o processo de impeachment na Câmara dos Representantes antes do fim do ano, com uma perspectiva de haver julgamento no Senado em janeiro.

Qual foi a reação dos republicanos?

Antes do rascunho do documento ter vindo à público, republicanos da Câmara dos Representantes divulgaram um relatório próprio de 123 páginas no qual fazem acusações contra "burocratas não eleitos" que testemunharam contra Trump.

Para esse grupo de congressistas, esses depoentes "discordam fundamentalmente do estilo, da visão de mundo e das decisões do presidente Trump".

"Nenhuma das testemunhas dos democratas tem evidências de suborno, extorsão ou qualquer alto crime ou contravenções", afirmam os republicanos, em referência aos trechos da Constituição que permitem a remoção de um presidente.

O chefe do Comitê de Inteligência, Adam Schiff, afirmou as alegações dos republicanos interessam a apenas uma pessoa, Trump, e ignoram as "volumosas evidências" contra o mandatário.

Em Londres, onde participou do aniversário de 70 anos da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), Trump afirmou que Schiff era "maníaco" e "doente".

Do que Trump é acusado?

Os democratas afirmam que Trump usou como barganha duas medidas - uma ajuda militar de US$ 400 milhões e um encontro com o presidente ucraniano na Casa Branca - em troca de investigações na Ucrânia. Para esses congressistas, a pressão política sobre um aliado vulnerável dos EUA configura abuso de poder.

A primeira investigação que Trump queria da Ucrânia envolvia Biden, talvez seu principal adversário no Partido Democrata, e o filho dele Hunter. Este entrou para o conselho de uma empresa de energia ucraniana quando o pai era vice-presidente na gestão de Barack Obama.

A segunda apuração cobrada por Trump era que a Ucrânia corroborasse a teoria conspiratória de que o país, e não a Rússia, interferiu nas últimas eleições presidenciais americanas em 2016, quando Trump foi eleito.

Essa hipótese foi amplamente refutada, e as agências de inteligência americanas são unânimes em afirmar que Moscou estava por trás da invasão dos emails do Partido Democrata naquele ano.

Como funciona o processo de impeachment?

O impeachment é a primeira parte de um processo em duas etapas no qual o Congresso pode remover um presidente do cargo.

Se, depois dos depoimentos, a Câmara dos Representantes aprovar que o caso se aplica a artigos do impeachment, o Senado é obrigado a realizar um julgamento.

Na fase seguinte, é necessária uma maioria de dois terços para condenar e remover um presidente. Mas isso é improvável, já que o partido de Trump controla esta Casa.

Hoje, há 235 deputados democratas, 1 independente e 199 republicanos na Câmara. Dentre os 100 senadores, há 53 republicanos, 45 democratas e 2 independentes.

Apenas dois presidente americanos sofreram impeachment, Bill Clinton e Andrew Johnson, mas nenhum dos dois foi condenado.

O presidente Richard Nixon renunciou antes de terminar o processo de impeachment.