Topo

Esse conteúdo é antigo

Sanders 'socialista', Biden 'moderado' ou Bloomberg 'gastador': por que Superterça pode decidir adversário de Trump

26.02.2020 - Bernie Sanders e Joe Bider participam de debate com outros pré-candidatos à indicação do partido Democrata para disputar a Presidência dos EUA - Jonathan Ernst/Reuters
26.02.2020 - Bernie Sanders e Joe Bider participam de debate com outros pré-candidatos à indicação do partido Democrata para disputar a Presidência dos EUA Imagem: Jonathan Ernst/Reuters

Alessandra Corrêa

De Winston-Salem (EUA) para a BBC News Brasil

03/03/2020 07h07

Eleitores americanos irão às urnas hoje em uma série de votações simultâneas que poderão consolidar a liderança do senador Bernie Sanders ou abrir caminho para um nome da ala moderada na disputa para ser o candidato do Partido Democrata à Presidência dos Estados Unidos.

A segunda terça-feira de março é considerada crucial do calendário eleitoral americano e ganhou o apelido de Superterça na década de 1980, quando três Estados realizaram prévias simultâneas na segunda terça-feira de março. Neste ano, a votação ocorre em 14 Estados e no território de Samoa Americana.

Estão em jogo 1.357 dos 1.991 delegados necessários para garantir a nomeação do Partido Democrata. Na convenção nacional do partido, programada para julho, são os delegados selecionados nas prévias que votam no candidato escolhido pelos eleitores de seus Estados, decidindo assim o representante democrata que irá enfrentar o presidente republicano Donald Trump na eleição geral de 3 de novembro.

Sanders, o senador independente pelo Estado de Vermont que se define como socialista democrático, tem até agora 60 delegados, o maior número entre todos os pré-candidatos democratas, e lidera as pesquisas de intenção de voto.

Mas, depois de um desempenho fraco nas primeiras três votações — em Iowa, New Hampshire e Nevada —, o ex-vice-presidente Joe Biden venceu a primária da Carolina do Sul no último sábado, ganhando novo fôlego. Biden tem 53 delegados.

A Superterça marca também o primeiro teste nas urnas do bilionário Mike Bloomberg, ex-prefeito de Nova York, que entrou na disputa mais tarde e, por isso, não participou das primeiras quatro prévias iniciais. Bloomberg já investiu mais de meio bilhão de dólares em sua campanha, mas seu fraco desempenho nos últimos debates gerou dúvidas sobre suas chances.

"(A votação) deverá enviar uma mensagem contundente sobre quem é o candidato mais viável na disputa", diz à BBC News Brasil o cientista político Vincent Hutchings, professor da Universidade de Michigan.

Buttigieg, Klobuchar e Steyer

A escolha do candidato democrata ocorre em um momento em que a prioridade para o partido é derrotar Donald Trump na eleição geral. Pesquisas indicam que, para os eleitores democratas, isso é mais importante do que nomear um candidato que tenha propostas com as quais concordem.

Parte dos democratas acredita que esse nome seja Sanders. Outros, porém, temem que o senador esteja muito mais à esquerda do que a maioria dos americanos e, assim, possa afastar eleitores insatisfeitos com Trump que estariam dispostos a votar em um candidato democrata mais moderado na eleição geral.

Mas, até agora, os votos dos democratas insatisfeitos com a candidatura de Sanders estavam pulverizados entre diversos pré-candidatos considerados mais moderados, nenhum com força suficiente para ameaçar a liderança do senador de Vermont. A expectativa é de que isso possa mudar na Superterça.

Diante de resultados decepcionantes na Carolina do Sul, três candidatos da ala moderada abandonaram a disputa nos últimos dias. O bilionário Tom Steyer fez seu anúncio ainda na noite de sábado. No domingo, o ex-prefeito de South Bend (no Estado de Indiana), Pete Buttigieg, anunciou que suspendera a sua campanha. Na segunda-feira, foi a vez da senadora Amy Klobuchar, de Minnesota, sair do páreo.

Segundo analistas, a saída de Buttigieg, Klobuchar e Steyer pode fazer com que os eleitores que não apoiam Sanders se unam em torno de um único nome. Ainda na segunda-feira, Buttigieg e Klobuchar anunciaram seu apoio a Biden.

Durante a maior parte do ano passado e no início deste ano, Biden parecia ser o candidato favorito. Mas seu fraco desempenho nas primárias iniciais fez com que muitos duvidassem de sua candidatura e levou à queda nas pesquisas de intenção de voto.

Agora, impulsionado pela vitória na Carolina do Sul e com o apoio de vários nomes importantes do partido, o ex-vice-presidente espera que a Superterça possa consagrá-lo como a alternativa moderada a Sanders.

Pesquisas

Biden, que foi vice de Barack Obama, o primeiro presidente negro dos Estados Unidos, tem a seu favor grande apoio entre os eleitores desta etnia, uma parte importante do eleitorado em vários Estados do Sul do país que votam nesta terça.

Mas analistas destacam que muitos dos eleitores nos Estados que participam da Superterça já votaram antecipadamente, antes que o bom resultado na Carolina do Sul e o apoio de Buttigieg e Klobuchar dessem novo fôlego à sua campanha.

Além disso, não há garantias de que os eleitores de Buttigieg e Klobuchar agora votarão em Biden. Analistas ressaltam que a base de apoiadores de Buttigieg, que caso tivesse sido eleito seria o primeiro presidente americano abertamente gay, inclui tanto moderados quanto liberais, que poderiam transferir seus votos para Sanders, para a senadora Elizabeth Warren, de Massachusetts, ou até mesmo para Bloomberg.

Sanders lidera as pesquisas nos dois maiores Estados a votar nesta Superterça: Califórnia e Texas. O senador conta com forte apoio entre latinos, que representam grande parte do eleitorado nesses Estados.

A Califórnia, que é o Estado mais populoso dos Estados Unidos, costumava realizar sua primária em junho, no fim da corrida eleitoral, quando o impacto do resultado já não era tão forte. Neste ano, porém, resolveu antecipar a votação. Estão em jogo 415 delegados, número maior do que em qualquer outro Estado.

Mas Sanders enfrenta uma disputa mais acirrada em Estados do Sul. Na Carolina do Norte, o senador aparece praticamente empatado com Biden. Ambos são seguidos de perto por Bloomberg.

Delegados

No sistema eleitoral americano, o que conta para que um candidato garanta a indicação de seu partido não é o número de votos, e sim o número de delegados que prometem apoiá-lo.

Para ser o escolhido do Partido Democrata na eleição geral, um candidato precisa do apoio de metade mais dos 3.979 delegados. O número de delegados em jogo nesta Superterça representa mais de 30% desse total.

A fórmula para determinar o número de delegados distribuídos em cada Estado leva em conta a população e o peso do partido naquele Estado. Para conquistar delegados, um candidato precisa de pelo menos 15% dos votos. Caso fique abaixo desse percentual, não leva nenhum delegado.

Hutchings, da Universidade de Michigan, acredita que, caso Sanders vença na Califórnia, será difícil para outro candidato passá-lo.

Para o cientista político Lincoln Mitchell, da Universidade Columbia, em Nova York, Sanders deve ganhar o maior número de delegados na Superterça. "Mas a questão é de quanto será essa vantagem", diz Mitchell à BBC News Brasil.

Mitchel ressalta que se, por exemplo, Sanders conquistar 40% dos delegados, e Biden 30%, é provável que Sanders seja nomeado. "(Mas) se a diferença entre Sanders e Biden for de, digamos, cinco pontos percentuais, teremos uma disputa acirrada, em que qualquer um dos dois candidatos pode vencer (a indicação do partido)."

O analista observa que a presença de Warren na disputa é benéfica para Biden. "Se ela estivesse fora da corrida, muitos de seus votos iriam para Sanders", salienta.

Mitchell afirma ainda que, caso Bloomberg termine em terceiro lugar na Superterça, deveria abandonar a disputa. "Ele está ajudando Bernie, o que não é seu objetivo."

Mas, apesar da importância desta rodada de votos, especialistas lembram que as prévias democratas se estendem até junho, e ainda é cedo para prever quem será o candidato escolhido.