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Mortes de motoristas de ônibus por coronavirus expõem riscos dos trabalhadores essenciais sem proteção

Ricardo Senra - @ricksenra - Da BBC Brasil em Londres

09/04/2020 10h59

Quatorze funcionários do transporte público de Londres morreram após serem diagnosticados com o vírus; governo classifica motoristas como 'trabalhadores-chave' na crise.

Antes de virar motorista de ônibus, Emeka Ihenacho, 36, trabalhou por anos como carteiro no bairro onde cresceu, no norte de Londres. As duas profissões o tornaram uma figura bastante popular na região.

A maior parte de seus amigos e conhecidos soube pelos jornais locais e pela televisão que ele está entre os 14 funcionários do transporte público de Londres que morreram depois de testarem positivo para o novo coronavírus.

"Eu não quero uma carta ou telefonema, eu quero que o prefeito veja os rostos reais da tragédia, meu filho e o os outros motoristas de ônibus que perderam suas vidas", disse Anne Nyack, mãe de Ihenacho, em um programa matinal de TV, nesta quarta-feira.

Junto a médicos, enfermeiros, policiais, professores e alguns funcionários públicos, os motoristas são considerados "trabalhadores-chave" na resposta do governo britânico à epidemia.

A função é tão crucial que, sem eles, a maioria dos outros trabalhadores-chave não conseguiria chegar ao local de trabalho para continuar exercendo suas funções.

A um jornal de bairro, um amigo que conheceu Ihenacho na escola, aos 8 anos de idade, disse querer "que as pessoas se lembrem dele e pensem no sacrifício que ele fez".

As mortes geraram um debate sobre medidas de proteção para funcionários do transporte público na capital inglesa.

'Só álcool-gel'

A maioria dos 14 mortos no sistema de transporte público de Londres são motoristas de ônibus, mas também há casos como um motorista de metrô e um funcionário de uma garagem.

Segundo o governo municipal de Londres, mais de 25 mil pessoas estão na ativa na Transport for London, a agência pública de transportes da cidade.

A mãe do motorista disse que o filho era asmático e que não tinha máscaras ou luvas para trabalhar, "só álcool-gel".

Questionado, o prefeito de Londres, Sadiq Kahn, disse que o "o ministério da saúde, a secretaria de transportes e a Organização Mundial da Saúde dizem que equipamentos de proteção individual (EPI) só devem usados por profissionais de saúde".

"E sabe-se que faltam EPIs no sistema público de saúde", continuou.

Uso de ônibus em Londres caiu 85% com a pandemia.

Após as mortes, a prefeitura começou a testar a entrada de passageiros pela porta de trás - mais longe do motorista.

Autoridades já haviam bloqueado bancos próximos aos motoristas, que ficam separados dos passageiros por uma barreira de acrílico com uma película para impedir contato com gotas de saliva dos passageiros.

Segundo o prefeito, ônibus, trens e garagens estão sendo limpos mais frequentemente "com desinfetantes antivirais daqueles usados em hospitais".

Trabalhadores-chave

Todos os trabalhadores classificados pelo governo britânico como funcionários-chave têm direito a manter seus filhos em creches ou escolas públicas.

Elas foram fechadas em 23 de março para os demais alunos, como parte dos esforços para conter a expansão do novo coronavírus ao país.

Muitas vezes pouco prestigiadas, as funções ocupadas por trabalhadores-chave têm sido alvo de uma série de rodadas de aplausos realizadas em janelas de todo o país.

Eles também receberam o agradecimento especial da rainha Elizabeth 2ª, em um raro discurso transmitido pela televisão no último dia 5.

"Quero agradecer a todos na linha de frente do NHS (o serviço público de saúde britânico), assim como os profissionais de saúde e aqueles que ocupam cargos essenciais, que generosamente continuam suas atividades diárias fora de casa para ajudar a todos nós."

Fora mensagens anuais de Natal, este foi apenas o quinto pronunciamento televisionado da rainha em 68 anos de reinado. Antes, a mandatária, que completou 93 anos de idade, tinha ido a televisão em seu Jubileu de Diamante, em 2012, após a morte da rainha mãe, em 2002, depois da morte da princesa Diana,em 1997, e durante a Primeira Guerra do Golfo, em 1991.

Quem são

Foram considerados essenciais pelo governo britânico os seguintes trabalhadores:

Saúde e serviço social: médicos, enfermeiras, parteiras, paramédicos, cuidadores, produtores e distribuidores de remédios e equipamento médico, e equipes que atuem na linha de frente de serviços de saúde e assistência social, incluindo voluntários.

Educação: funcionários de berçários e maternais, professores, assistentes e trabalhadores essenciais de escolas e secretarias.

Alimentação: profissionais que atuem na produção, processamento, distribuição, venda e entrega de comida.

Segurança: policiais, membros das forças armadas, civis e fornecedores ligados ao Ministério da Defesa, bombeiros, oficiais de fronteiras e do sistema carcerário.

Transporte: descritos como "aqueles responsáveis por manter operações de transporte de passageiros e cargas no ar, água, estradas e trilhos e os que trabalharem nas cadeias de distribuição e fornecimento".

Outros: Determinados funcionários de bancos e do sistema financeiro; óleo, gás, eletricidade, água e esgoto; tecnologia e infraestrutura; trabalhadores de indústrias químicas e nucleares, de telecomunicações, correios e entregas, gerenciamento de lixo, empregados do sistema de justiça, de entidades religiosas, ONGs, funerárias, serviços públicos e jornalistas de empresas estatais.

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