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A história de Sara Rogel, jovem salvadorenha que passou quase uma década presa por aborto

09/06/2021 11h24

Episódio joga luz no calvário vivido por mulheres em país onde qualquer caso de aborto é penalizado.

A salvadorenha Sara Rogel estava prestes de terminar seus estudos quando recebeu a sentença de 30 anos de prisão.

Em outubro de 2012, a jovem, então com 18 anos, foi presa e condenada por "homicídio qualificado", depois de passar por um aborto que, segundo ela, foi resultado de uma queda.

"Foi um acidente que virou minha vida de cabeça para baixo. Eu amava meu bebê e, por um tombo, fui parar na cadeia", disse ela em entrevista coletiva na última terça-feira (8/6), após sua libertação.

Passados quase dez anos da detenção de Sara em um presídio feminino, a Justiça de El Salvador decidiu comutar sua pena e, depois de várias audiências e processos, um juiz decretou, no fim de maio, sua liberdade condicional.

"Foi muito difícil, porque me dei conta de tantas coisas já presa. Roubaram meus sonhos, desde de poder saber onde estava minha filha até terminar meus estudos, estar longe dos meus pais, de quem eu nunca havia me separado, longe dos meus irmãos", contou.

Seu caso não é único: segundo a ONG Agrupación Ciudadana, que advoga pela descriminalização do aborto em El Salvador, outras 16 mulheres estão presas atualmente no país em circunstâncias similares.

O país centro-americano, bastante conservador e de maioria católica, não prevê em lei nenhuma possibilidade de aborto, nem mesmo no caso de estupro ou de risco para a vida da mãe.

A rigidez legal faz com que dezenas de mulheres, principalmente nas regiões mais pobres, sejam anualmente presas pela morte dos seus fetos, até mesmo quando afirmam ter sofrido abortos espontâneos.

Existe expectativa de que o governo do presidente Nayib Bukele, eleito em 2019 com a promessa de reformas estruturais no país, promova mudanças também nessa área.

Mas qualquer decisão sobre o aborto terá de passar antes pelo Congresso (no qual o partido de Bukele tem ampla maioria desde março), que não levantou discussões sobre o tema.

O caso de Sara Rogel

Sara Rogel afirmou que nunca imaginou que sua gravidez se converteria em um pesadelo.

"Eu amava a minha bebê. Tinha tudo o que uma mãe desejaria, que é ter seu bebê, que estava prestes a chegar", disse em sua entrevista coletiva.

Segundo ela, aos oito meses de gestação, ela sofreu uma queda em sua casa, na zona rural do centro do país, e foi levada inconsciente ao hospital. "Não sabia o que tinha acontecido, não sabia nada da minha filha", declarou.

Segundo denunciam coletivos feministas, quando mulheres que chegam aos hospitais de El Salvador com sintomas de aborto induzido ou espontâneo, equipes hospitalares muitas vezes chamam a polícia antes mesmo de iniciar seu tratamento.

"Quando me dei conta já estava privada de liberdade, sem saber onde estavam meus pais, o que tinha acontecido com a minha bebê", contou.

Agora, tendo passado quase uma década presa, a jovem acredita que o ocorrido acabou com suas aspirações.

"Queria me formar em enfermagem e infelizmente aconteceu tudo isso", lamentou.

Na prisão, "desejava voltar pra minha casa, estar com meus pais, com a minha família".

"Foi muito doloroso, porque nunca imaginei que de uma vez só perderia minha filha e, pior, que fosse parar atrás das grades por tantos anos quando não tive culpa", declarou.

Sara afirmou também que sua missão agora é dar visibilidade à situação de mulheres que continuam presas em El Salvador por casos semelhantes ao seu.

"Hoje estou aqui pedindo que se faça justiça para minhas companheiras que continuam presas. Porque, assim como eu sofri esse dano, há muita gente atrás das grades há muitos anos. Quero justiça para elas também", declarou.

Grupos femininas salvadorenhos denunciam que a penalização total do aborto afeta principalmente as mulheres mais pobres e vulneráveis, em processos judiciais que, segundo esses ativistas, costumam ter irregularidades e ausência de garantias de direitos.

Nos últimos anos, ações promovidas por esses grupos obtiveram a libertação de ao menos 50 mulheres condenadas por aborto.

Em 2020, Cindy Erazo foi libertada depois de passar seis anos na cadeia, condenada a 30 anos de prisão por homicídio qualificado, após ter uma emergência médica em seu oitavo mês de gravidez.

Em 2019, Evelyn Hernández, também condenada a pena semelhante, depois de seu bebê recém-nascido ter sido encontrado morto no banheiro onde ela deu à luz e desmaiou, foi libertada após passar quase três anos na prisão.


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