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Paris-2024 pode ser a última chance para skatistas brasileiros em Olimpíadas?

Pedro Barros, medalhista de prata do skate park, nos Jogos Olímpicos de Tóquio-2020 - Gaspar Nóbrega/COB/Gaspar Nóbrega/COB
Pedro Barros, medalhista de prata do skate park, nos Jogos Olímpicos de Tóquio-2020 Imagem: Gaspar Nóbrega/COB/Gaspar Nóbrega/COB

Modalidade que fez sua estreia como esporte olímpico em Tóquio-2020 e fez sucesso no Brasil ainda não foi confirmada depois de 2024.

Torcedores brasileiros se acostumaram a passar algumas madrugadas das últimas duas semanas acompanhando manobras com nomes complicados, como "caballerial tail de back", e vendo atletas ganharem medalhas no skate, esporte que fez a sua estreia olímpica em nas Olimpíadas de Tóquio.

O desempenho do Brasil no skate ajudou a dar popularidade à modalidade: foram três pratas nos quatro torneios disputados — até agora o esporte em que o Brasil mais ganhou medalhas em Tóquio, ao lado do boxe (em que foi conquistada e duas já garantidas). Quase 20% das medalhas brasileiras recebidas no Japão até agora foram conquistadas pelo skate.

No entanto, o futuro do skate como modalidade olímpica é incerto. O skate está garantido nos Jogos Olímpicos de Paris 2024 — mas depois disso ainda não há definição sobre se permanecerá no calendário olímpico.

Em dezembro do ano passado, o Comitê Olímpico Internacional (COI) aceitou o pedido feito pelos organizadores de Paris de incluir quatro esportes na programação: escalada, surfe, skate (os três fizeram sua estreia como esportes olímpicos em Tóquio) e break dance.

Em comum, os quatro esportes têm grande apelo entre pessoas mais jovens — tanto como praticantes quanto como espectadores.

"O COI está empenhado em estabelecer um novo padrão para jogos inclusivos, com equilíbrio de gênero e centrados na juventude. Paris-2024 apresentou sua proposta ao COI para integrar quatro novos esportes intimamente associados à juventude e recompensar a criatividade e o desempenho atlético", diz a nota dos organizadores dos Jogos de Paris 2024.

"Todos os quatro são fáceis de entender e os participantes formam comunidades muito ativas nas redes sociais. Nos próximos cinco anos, a inclusão desses eventos nos Jogos Olímpicos ajudará a inspirar milhões de crianças a praticar esportes."

O skate se aproveitou de uma desburocratização no processo de adoção de novos esportes nas Olimpíadas, no entanto essa via mais rápida faz com que o esporte precise ser revisado a cada edição.

Quando um esporte se torna permanente, o anúncio costuma ser feito sete anos antes de Jogos em que isso vira norma.

Como um esporte se torna olímpico

Antigamente, o caminho tradicional para um esporte ser considerado olímpico era longo e cheio de burocracias. O primeiro passo era uma atividade ser reconhecida como esporte pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) e depois pelas Federações Esportivas Internacionais. Nessa etapa, exigia-se que o esporte adira à Carta Olímpica (uma espécie de Constituição dos Jogos) e siga o código de antidoping.

A Carta Olímpica diz que, para virar atividade olímpica, um esporte precisa ser praticado por homens em pelo menos 75 países em quatro continentes e por mulheres em pelo menos 40 países em três continentes. A Carta também exclui competições que são essencialmente cerebrais ou que dependem de propulsão mecânica — por isso atividades que já são consideradas esportes, como xadrez e automobilismo, não podem virar modalidades olímpicas.

Mas desde a última década, o COI vem modernizando a legislação esportiva que guia os Jogos, com um projeto chamado Agenda Olímpica 2020 — os Jogos de Tóquio foram os primeiros a se beneficiarem destas mudanças.

Uma das principais mudanças foi na desburocratização para inclusão de novos esportes. Em vez daqueles caminhos tradicionais apontados na Carta Olímpica, agora os próprios países-sede podem propor novos esportes a serem incluídos apenas nos Jogos que vão sediar.

A mudança dá maior agilidade à inclusão de novos esportes — no entanto algumas dessas modalidades como o skate acabam se tornando apenas temporárias, dependendo da vontade do comitê organizador dos Jogos em cada sede.

A Agenda Olímpica 2020 também passou a usar outra competição do COI — os Jogos Olímpicos da Juventude — como laboratórios para testar a popularidade de novas modalidades esportivas, antes de incluí-las na programação oficial. Foi o caso do skate e escalada, que tiveram sua estreia como "esportes de demonstração" nos Jogos da Juventude de 2014, em Nanjing, na China. Outros esportes testados em Nanjing foram abandonados, como a arte marcial chinesa wushu e patinação de velocidade com patins em linha.

O sucesso de skate e escalada junto ao público fez com que as modalidades fossem adotadas nos Jogos de Tóquio. O mesmo teste foi feito com dança break, que foi testada — e aprovada — nos Jogos Olímpicos da Juventude de 2018 em Buenos Aires, e agora virarão modalidade em Paris 2024. Em todos os casos, também houve outro critério que agradou ao COI: o alto número de participantes mulheres, já que uma das metas da Agenda Olímpica 2020 é ter mais equilíbrio de gênero no esporte.

Skate é uma atividade popular em Los Angeles, que sediará as Olimpíadas de 2028. A Califórnia e Los Angeles são considerados berços do esporte, onde vivem atletas de ponta, como Tony Hawk, Lance Mountain e Stacy Peralta. Mas a manutenção do esporte nos Jogos depende das prioridades do comitê organizador local americano e do próprio COI até lá.

Em entrevista para a ABC News, o CEO da equipe olímpica de skate dos EUA, Josh Friedberg, disse que espera que o skate seja mantido em 2028 nos Jogos de Los Angeles, já que a cidade e seu entorno possuem equipamentos populares, como nas praias de Santa Monica e Venice.

Revisões

Mas mesmo os esportes considerados "permanentes" podem eventualmente serem retirados das Olimpíadas.

O COI está constantemente revisando e retirando atividades das Olimpíadas. É o que aconteceu ao longo dos 125 anos de Jogos Olímpicos com cabo-de-guerra, críquete, lacrosse, esqui aquático, entre outros.

Dois esportes introduzidos em Tóquio — caratê e baseball/softball — não serão disputados em Paris-2024. Golfe e rúgbi, que foram introduzidos no Rio de Janeiro, em 2016, serão revisados após Tóquio-2020.

Também existe a preocupação com o interesse da audiência e com o custo de se construir estruturas para o esporte.

A Agenda Olímpica 2020 prioriza o uso de arenas já existentes nas cidades-sede e tenta minimizar a necessidade de construção de novos aparelhos. Em Paris-2024, a meta é que 95% das arenas olímpicas usadas nos Jogos sejam já existentes ou temporárias. Para Los Angeles-2028, não se planeja a construção de nenhum equipamento esportivo permanente.

Essas metas afetam a inclusão ou exclusão de esportes olímpicos nos Jogos.

O baseball e softball, por exemplo, foram excluídos após os Jogos de Pequim 2008, mas foram retomados em Tóquio a pedido do comitê organizador japonês — pois o esporte é muito popular no Japão e o país já possuía estruturas adequadas para a sua prática. Ambos os esportes não estarão nos Jogos de Paris de 2024, mas cogita-se que eles voltem em Los Angeles 2028, já que também são populares nos EUA.

Outros esportes amplamente praticados pelo mundo nunca foram incluídos por não gerarem um interesse comercial grande, como sinuca e squash. No caso do squash, houve um lobby forte da federação para a inclusão do esporte no Rio de Janeiro em 2016, mas ele acabou derrotado pelo golfe.

Negócio do skate

A transmissão do skateboarding olímpico na televisão deu ao esporte uma visibilidade inédita. Por anos, o esporte foi ignorado por emissoras de televisão, por ser estigmatizado e considerado parte de uma cultura urbana marginal.

Agora a postura do COI tem sido exatamente oposta a esse pensamento.

"Queremos levar esporte para os jovens. Com as muitas opções que os jovens têm, não podemos mais esperar que eles venham automaticamente até nós. Temos que ir até eles", disse o presidente do COI, Thomas Bach, quando foram os novos esportes para Tóquio.

Essa mudança já vinha acontecendo desde que se acrescentou as provas de ciclismo BMX em Pequim 2008 e de snowboarding, nos Jogos de Inverno de Nagano, no Japão, em 1998.

Muitas dessas modalidades que vem recebendo atenção do COI já vinham rendendo bilhões de dólares a setores privados que investiram neles quando havia pouco interesse do mainstream. O caso mais emblemático é o da emissora esportiva americana ESPN, que criou em 1995 o X Games, competição exclusiva para esportes radicais.

Muitos dos ídolos do skateboarding mundial — incluindo os medalhistas brasileiros — foram revelados nos X Games.

No Brasil, a cultura de skate existe há décadas. Brasil e Japão se beneficiaram que o esporte virou modalidade olímpica justamente em um momento bom da sua atual geração de competidores. Há alguns anos, o skate competitivo era dominado por atletas americanos, que foram pioneiros na popularização dos torneios.

Em Tóquio, foram 80 skatistas homens e mulheres de 25 países competindo em quatro torneios — nas modalidades park e street.

O caso do Brasil ilustra como um esporte pode ser impulsionado com as olimpíadas — com milhões de espectadores parando pela primeira vez na vida para acompanhar uma competição.

Empresas de equipamentos esportivos afirmam que a demanda por skates explodiu depois das medalhas de prata de Rayssa Leal, Pedro Barros e Kelvin Hoefler. Rayssa, conhecida como Fadinha, ganhou mais de quatro milhões de seguidores no Instagram ao longo dos Jogos.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado anteriormente, as modalidades do skate nas Olimpíadas de Tóquio foram park e street, e não skate e street. O erro foi corrigido.