Caio Blinder: Iraque pode prejudicar Hillary Clinton

da BBC, em Londres

No seu longo aquecimento para a maratona presidencial americana 2008, a senadora democrata e ex-primeira-dama Hillary Clinton fez um cálculo aparentemente correto: os obstáculos nas primárias partidárias seriam bem mais fáceis de transpor do que na corrida em si contra o oponente republicano.

Para a grande guerra eleitoral, Hillary precisaria mostrar que tinha músculo em segurança nacional e assim neutralizar a imagem de frouxidão democrata.

E ao longo dos anos no Senado, Hillary foi coerente com este cálculo, em particular ao votar em 2002 a favor da resolução que autorizou o presidente George W. Bush a usar força no Iraque.

Antes de formalizar sua candidatura no sábado passado, Hillary inclusive viajou para o Iraque e o Afeganistão. Mas agora que ela é assumidamente candidata, o ponto forte pode enfraquecê-la.

Contra

A guerra é cada vez mais impopular entre os americanos e dois terços deles são contra a decisão de Bush de enviar mais 21 mil soldados ao Iraque. A base de ativistas democratas (que está à esquerda do resto dos eleitores) nunca engoliu a decisão da ex-primeira-dama de apoiar a guerra.

A maioria dos postulantes democratas à presidência apoiou a guerra e voltou atrás. A situação mais cômoda é a do senador Barack Obama, que desponta como o principal rival de Hillary na corrida democrata. Ele não estava no Senado em 2002 e sempre foi crítico da empreitada de Bush no Iraque.

Até agora a ex-primeira-dama não renegou seu voto de 2002. Mas Hillary sendo Hillary, existe um calculismo que os detratores denunciam como mero oportunismo de alguém que não mede esforços ou malabarismo para chegar ao cume.

Ela está em processo de revisão. Em particular, desde a semana passada, após a entrada formal de Barack Obama na corrida presidencial, Hillary está calibrando sua postura. Ela é a favor do projeto de resolução não mandatória no Congresso enfatizando não ser do "interesse nacional dos EUA aprofundar seu envolvimento militar no Iraque".

Em várias entrevistas, Hillary criticou tanto o presidente George W. Bush como o primeiro-ministro iraquiano Nuri al-Maliki como incapazes de tirar o Iraque do atoleiro.

A senadora por Nova York tem sua própria proposta de resolução, puramente simbólica, sugerindo o limite de 132 mil soldados americanos no Iraque em 1º de janeiro de 2008. Outra idéia é um prazo de seis meses para o governo Maliki tentar conter a violência sectária.

Revisionismo

O revisionismo (ou malabarismo) é tortuoso e pode não apaziguar a inquieta base antiguerra no Partido Democrata.

Na semana passada, em uma entrevista, Hillary disse não apoiar o corte de fundos para as tropas americanas no Iraque (como prega uma ala partidária), mas afirmou também que está disposta a apoiar este corte se o governo de Bagdá não remover a influência das milícias sectárias no Exército.

O malabarismo de Hillary e a confusão sobre suas posições em função dos seus cálculos políticos não escapam aos humoristas.

O quadro de abertura do lendário programa de televisão Saturday Night Live, no dia da formalização da candidatura, tinha a personagem Hillary Clinton dizendo que, para cada ponto de aumento na popularidade de Barack Obama, mais tropas deveriam voltar para casa. Mas se o rival emperrasse, "as tropas poderiam ficar no Iraque".

Hillary Clinton é peso-pesado na disputa presidencial, respeitada por sua inteligência e acumulou muita experiência (e dinheiro) para a campanha, mas parece ter feito um erro de cálculo sobre a velocidade da guinada do estado de espírito dos americanos em relação à guerra, sem falar deste sentimento dentro do Partido Democrata.

A corrida eleitoral ainda tem muito chão pela frente e com tantos anúncios de lançamento de candidatos democratas e republicanos nos últimos dias está simplesmente embolada. Alguns pesquisas ainda colocam Hillary na dianteira na maratona das primárias democratas, mas estão aí as lições da história.

Na disputa pela indicação democrata em 1972, o favorito inicial era Edmund Muskie, mas, com o fervor contrário à guerra do Vietnã, ele perdeu para George McGovern. A outra lição foi a "lavada" que o pacifista vitorioso McGovern tomou do republicano Richard Nixon. Cálculos eleitorais são complicados e imprecisos.

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