Análise: Acordo com Coréia do Norte expõe inconsistência americana
da BBC, em Londres
Poucas vezes o jargão diplomático "otimismo cauteloso” se revela tão pertinente como no anúncio do acordo nuclear norte-coreano.
O recluso regime comunista, os EUA e seus parceiros China, Rússia, Japão e Coréia do Sul finalmente acertaram nas negociações em Pequim alguns ponteiros: em troca de energia e comida, a Coréia do Norte concordou em fechar seu reator nuclear em Yongbyon, provável fonte do plutônio usado na bomba atômica testada em outubro, e permitir a volta ao país de inspetores internacionais.
Questões mais explosivas - como o desarmamento nuclear em si - foram deixadas para conversações futuras.
Por algumas estimativas, a Coréia do Norte pode ter até dez bombas, ou pelo menos combustível para fabricá-las. É preciso, portanto, assumir mais cautela do que otimismo.
O regime norte-coreano tem uma tradição de renegar e de violar pactos internacionais, como o pacto nuclear firmado em 1994 com o governo Clinton.
Este acordo fora tratado com ceticismo e mesmo desprezo pelo presidente George W. Bush.
A atitude hostil do atual governo americano inclusive contribuiu para o regime de Pyongyang acelerar o seu programa nuclear. Ironicamente, agora, Bush concorda com um acordo em moldes semelhantes ao que fora costurado pelos negociadores de Clinton, para o desconsolo dos bolsões neoconservadores em Washington.
Governo fraco
Basta ver as declarações do ex-embaixador americano nas Nações Unidas, John Bolton, logo após o anúncio do acordo em Pequim. Ele disse que o pacto "contradiz premissas fundamentais da política presidencial dos últimos seis anos e, em segundo lugar, faz com que o governo Bush pareça muito fraco no Iraque quando ele precisa parecer forte".
De fato, o mundo mudou desde a ascensão de um governo com pendores unilateralistas e que na seqüência dos atentados do 11 de setembro enquadrou o Iraque (de Saddam Hussein), o Irã e a Coréia do Norte em um "eixo do mal".
No Iraque, os americanos estão atolados em meio a crescentes pressões domésticas para que simplesmente caiam fora da confusão. Já os outros dois "regimes malignos" aceleraram seus programas nucleares.
O unilateralismo do começo da era Bush foi substituído por um multilateralismo à la carte face ao agravamento de crises multilaterais. Nas pendências nucleares da Coréia do Norte e do Irã, vários países europeus e asiáticos estão envolvidos em negociações, embora no caso iraniano os americanos não atuem diretamente.
Assim, dependendo da crise, os americanos não apenas negociam, mas buscam os préstimos de parceiros que nem sempre são seus aliados.
O fim da Guerra Fria permitiu que os EUA tivessem um momento unipolar por uns 15 anos, mas como disse a ex-secretária de Estado do governo Clinton, Madeleine Albright, "nos últimos seis anos houve uma diminuição do respeito pelo poder americano. O mundo será multipolar".
China
No caso específico das negociações norte-coreanas, o papel chinês foi vital nas pressões por concessões tanto sobre seu oneroso aliado comunista como sobre a superpotência americana.
Isto confirma o crescente peso chinês, que no século 21 forja um relacionamento de cooperação e competição com os EUA.
Na sua edição desta terça-feira, o Wall Street Journal diz que o acordo norte-coreano pode significar uma "rara vitória" para a desmoralizada equipe de política externa do governo Bush, chefiada por Condoleezza Rice que prega uma postura mais realista na diplomacia americana, ao invés das ações beligerantes advogadas pelo vice-presidente Dick Cheney, que sempre pressionou pelo esmagamento da Coréia do Norte e não negociações.
Mas o pacto firmado em Pequim justamente expõe a Casa Branca às acusações - tanto de conservadores, como do Congresso com controle democrata - de inconsistência e mesmo de falta de rumos.
Esta inconsistência existe na outra crise nuclear, a iraniana. Os EUA trabalham diplomaticamente pelo fim das ambições iranianas com seus aliados europeus (Grã-Bretanha, França e Alemanha) e também atuam no contexto do Conselho de Segurança das Nações Unidas em árduas negociações por gradativas sanções, mas em particular nas últimas semanas esquentou o clima de confronto com Teerã.
Há inclusive especulações de que o governo Bush se prepara para algum tipo de duelo militar, não apenas em função da crise nuclear, mas das acusações de envolvimento iraniano na guerra iraquiana a favor de milícias xiitas.
Um acordo com a Coréia do Norte permitiria ao governo Bush devotar mais atenção à crise iraniana, mas em qual direção?
O recluso regime comunista, os EUA e seus parceiros China, Rússia, Japão e Coréia do Sul finalmente acertaram nas negociações em Pequim alguns ponteiros: em troca de energia e comida, a Coréia do Norte concordou em fechar seu reator nuclear em Yongbyon, provável fonte do plutônio usado na bomba atômica testada em outubro, e permitir a volta ao país de inspetores internacionais.
Questões mais explosivas - como o desarmamento nuclear em si - foram deixadas para conversações futuras.
Por algumas estimativas, a Coréia do Norte pode ter até dez bombas, ou pelo menos combustível para fabricá-las. É preciso, portanto, assumir mais cautela do que otimismo.
O regime norte-coreano tem uma tradição de renegar e de violar pactos internacionais, como o pacto nuclear firmado em 1994 com o governo Clinton.
Este acordo fora tratado com ceticismo e mesmo desprezo pelo presidente George W. Bush.
A atitude hostil do atual governo americano inclusive contribuiu para o regime de Pyongyang acelerar o seu programa nuclear. Ironicamente, agora, Bush concorda com um acordo em moldes semelhantes ao que fora costurado pelos negociadores de Clinton, para o desconsolo dos bolsões neoconservadores em Washington.
Governo fraco
Basta ver as declarações do ex-embaixador americano nas Nações Unidas, John Bolton, logo após o anúncio do acordo em Pequim. Ele disse que o pacto "contradiz premissas fundamentais da política presidencial dos últimos seis anos e, em segundo lugar, faz com que o governo Bush pareça muito fraco no Iraque quando ele precisa parecer forte".
De fato, o mundo mudou desde a ascensão de um governo com pendores unilateralistas e que na seqüência dos atentados do 11 de setembro enquadrou o Iraque (de Saddam Hussein), o Irã e a Coréia do Norte em um "eixo do mal".
No Iraque, os americanos estão atolados em meio a crescentes pressões domésticas para que simplesmente caiam fora da confusão. Já os outros dois "regimes malignos" aceleraram seus programas nucleares.
O unilateralismo do começo da era Bush foi substituído por um multilateralismo à la carte face ao agravamento de crises multilaterais. Nas pendências nucleares da Coréia do Norte e do Irã, vários países europeus e asiáticos estão envolvidos em negociações, embora no caso iraniano os americanos não atuem diretamente.
Assim, dependendo da crise, os americanos não apenas negociam, mas buscam os préstimos de parceiros que nem sempre são seus aliados.
O fim da Guerra Fria permitiu que os EUA tivessem um momento unipolar por uns 15 anos, mas como disse a ex-secretária de Estado do governo Clinton, Madeleine Albright, "nos últimos seis anos houve uma diminuição do respeito pelo poder americano. O mundo será multipolar".
China
No caso específico das negociações norte-coreanas, o papel chinês foi vital nas pressões por concessões tanto sobre seu oneroso aliado comunista como sobre a superpotência americana.
Isto confirma o crescente peso chinês, que no século 21 forja um relacionamento de cooperação e competição com os EUA.
Na sua edição desta terça-feira, o Wall Street Journal diz que o acordo norte-coreano pode significar uma "rara vitória" para a desmoralizada equipe de política externa do governo Bush, chefiada por Condoleezza Rice que prega uma postura mais realista na diplomacia americana, ao invés das ações beligerantes advogadas pelo vice-presidente Dick Cheney, que sempre pressionou pelo esmagamento da Coréia do Norte e não negociações.
Mas o pacto firmado em Pequim justamente expõe a Casa Branca às acusações - tanto de conservadores, como do Congresso com controle democrata - de inconsistência e mesmo de falta de rumos.
Esta inconsistência existe na outra crise nuclear, a iraniana. Os EUA trabalham diplomaticamente pelo fim das ambições iranianas com seus aliados europeus (Grã-Bretanha, França e Alemanha) e também atuam no contexto do Conselho de Segurança das Nações Unidas em árduas negociações por gradativas sanções, mas em particular nas últimas semanas esquentou o clima de confronto com Teerã.
Há inclusive especulações de que o governo Bush se prepara para algum tipo de duelo militar, não apenas em função da crise nuclear, mas das acusações de envolvimento iraniano na guerra iraquiana a favor de milícias xiitas.
Um acordo com a Coréia do Norte permitiria ao governo Bush devotar mais atenção à crise iraniana, mas em qual direção?