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Peru e Colômbia devolvem leões de circo à natureza

Jaime Campoamor Velasco (av)

29/04/2016 15h50

Após uma vida em cativeiro na América do Sul, 33 felinos partem para santuário da fauna na África do Sul por iniciativa de uma ONG. Ação integra os recentes avanços sul-americanos pelos direitos dos animais.

Quando um ser humano comete um delito, o castigo possível é ser privado da liberdade - durante um tempo limitado, pois é consenso que viver atrás de grades é algo terrível. Mas muitos animais nascem e passam toda a existência em cativeiro, por vezes sofrendo mutilações e castigos unicamente para o benefício dos donos, que não se importam com sua saúde ou bem-estar.

A organização Animal Defenders International (ADI) anunciou recentemente que pretendia devolver à África um grupo de 33 leões resgatados de circos no Peru e na Colômbia. A ONG americana denunciou a situação dos felinos, muitos deles desdentados e de garras mutiladas, e alguns praticamente cegos.

Em sua campanha pela libertação dos leões, a ONG ADI recolheu doações através do website GreaterGood.com, a fim de arrecadar os fundos necessários para levar os animais até a reserva particular Emoya Big Cat, na província sul-africana de Limpopo.

Nesta quinta-feira (28/04), as autoridades ambientais colombianas iniciaram o transporte até Bogotá de nove felinos entregues por um circo. De lá, seguirão para Lima, de onde partirão para Johannesburgo, junto com outros 24 animais do Peru.

"Os leões estão regressando ao lugar a que pertencem, grandes recintos num meio ambiente natural", anunciou Savannah Heuser, fundadora do santuário da fauna na África do Sul.

Primeiro "habeas corpus" para um não humano

Em 2011 o Peru aprovou a Lei dos Circos, proibindo o uso de animais selvagens em espetáculos circenses. Dois anos mais tarde a Colômbia seguia seu exemplo. Diante da entrada em vigor dessas leis, o presidente da ADI, Jan Creamer, afirmou, em comunicado, que era hora de "devolver à casa, ao paraíso, esses leões que suportaram um inferno na terra".

Em janeiro de 2016, além disso, ambos os países aprovaram legislação reconhecendo os animais domésticos e selvagens como "seres que sentem" e estabelecendo normas para o cuidado deles.

"Todos os países da América Latina estão legislando contra esses abusos", observa Bernardo Ortiz, ambientalista e ex-diretor da ONG Traffic na América do Sul, acrescentando: "Ainda que em todos os países do continente se trate mal aos animais selvagens em cativeiro, nos últimos cinco anos houve avanços no Equador, na Colômbia, no Brasil e no Peru. Chegou o momento de tomar decisões a respeito. Na Colômbia se está tratando de um tema crítico, neste momento: se os animais têm direitos ou não."

Há alguns meses, a Associação de Funcionários e Advogados pelos Direitos dos Animais (Afada) a Argentina abordou o caso de um orangotango mantido em jaula solitária na capital. Ao pleitear o primeiro habeas corpus para um não humano, a associação argumentou que os animais "sentem e têm emoções. Isso faz com que sejam pessoas não humanas, não uma coisa, e com direitos".

Ligações com o crime organizado

Um dos aspectos mais críticos do tema é o tratamento cruel dispensado aos animais selvagens na América Latina, desde sua captura até o cativeiro, e sobretudo durante o transporte, aponta Bernardo Ortiz.

"Como o tráfico de animais selvagens é totalmente ilegal, para evitar a detecção a fase de transporte se dá em condições horríveis, entre caixotes e nos compartimentos de carga dos caminhões. Nesses traslados é enorme tanto a taxa de mortandade quanto o sofrimento animal."

O colaborador da ONG Traffic, que combate o tráfico animal, acrescenta que leões como os resgatados no Peru e na Colômbia certamente não foram capturados na África e trazidos para a América, mas são descendentes de várias gerações em cativeiro.

Juan Manuel Carrión, diretor da Fundação Zoológica do Equador e do Jardim Zoológico de Quito, observa que "o comércio de vida silvestre é tão nefasto, organizado, dependente das máfias e associado ao comércio de drogas, que acho difícil erradicar esse problema a médio prazo".

A seu ver, a única solução é conscientizar a população para que deixe de comprar animais selvagens como mascotes. Se isso ocorrer, os zoológicos modernos - que não têm fins comerciais, mas representam um serviço público de educação ambiental - seguirão sendo necessários para ensinar e aproximar os mais jovens do mundo animal.