Congresso: um emaranhado político que desafia a lógica
Brasil pode vir a ter 91 partidos, um dos sistemas políticos mais fragmentados do mundo, que testa habilidade de presidente e dificulta formatação de um projeto de governo. Cláusula de barreira dificilmente será votada.Com um dos sistemas político-partidários mais fragmentados do mundo, o Brasil tem hoje 35 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e outras 56 siglas em processo de formação. São 27 as legendas com representação no Congresso. A Câmara dos Deputados tem atualmente em funcionamento 267 frentes parlamentares, ou seja, praticamente um agrupamento político com interesses específicos para cada dois deputados. Esse emaranhado político tende a prosseguir e retroalimentar uma relação complexa com o governo, já que a reforma para reduzir o número de partidos deixou subitamente a pauta de prioridades do Executivo e do Legislativo.A maior parte das frentes parlamentares existentes hoje não tem força e nem organização para pressionar a pauta de votações, mas pelo menos três delas têm peso político considerável: a Frente Evangélica, a Frente da Segurança Pública (conhecida como “Bancada da Bala”) e a Frente Mista Agropecuária, composta por políticos ligados ao agronegócio. O trio já foi batizado de BBB, Bala, Bíblia e Boi, e representa o segmento mais conservador do Congresso. Nos atuais registros da Câmara, a bancada evangélica tem 180 deputados e quatro senadores. Há também a bancada católica, com 195 deputados e cinco senadores. Em assuntos referentes a aborto, por exemplo, muitas vezes essas frentes religiosas têm visões em comum.A Frente da Segurança Pública congrega 265 deputados, muitos deles policiais. Já a bancada ruralista é uma das mais organizadas e com maior poder econômico. Além de se reunir periodicamente, todas as terças-feiras, a Frente do Agronegócio tem sede própria numa região nobre de Brasília, o Lago Sul. Os parlamentares, 200 deputados e 22 senadores, organizam debates sobre as pautas que lhes interessam para acelerar votações e barrar a apreciação de temas que trombam nos interesses econômicos da classe.O impeachment da presidente Dilma Rousseff fez florescer no Congresso mais um grupo poderoso, o Centrão, formado por mais de 200 parlamentares que se uniram à sombra do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), preso na Operação Lava Jato em outubro de 2016. O Centrão, porém, já dá sinais de cansaço. O grupo se dividiu e não votará coeso na sucessão para a eleição do próximo presidente da Câmara. Depois de perder o mandato, Dilma Rousseff afirmou que a fragmentação partidária impede a governabilidade.“A excessiva fragmentação eleva os custos de transação no sistema político, pois aumenta a complexidade das negociações e da composição da base parlamentar”, afirma Cláudio Couto, cientista político e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV).“O impeachment de Dilma foi resultado de falha institucional do sistema ou falha pessoal, a inabilidade de produzir maiorias? Tendo a achar que a inabilidade pessoal de negociar com o Congresso era mais importante que a falha do sistema, com muito partidos e um Congresso muito forte”, comenta,por sua vez, Bruno Speck, cientista político da Universidade de São Paulo (USP).Um reflexo imediato desta intrincada negociação do Executivo com o Legislativo seria o aumento de ministérios. Não por acaso o presidente Michel Temer já sinalizou que poderá fazer uma reforma ministerial para acomodar forças políticas após a sucessão no Congresso. Com a crise do sistema carcerário, a Frente da Segurança Pública sugeriu a Temer que crie um ministério com o mesmo nome do grupo parlamentar – provavelmente também vai pleitear a indicação do titular da pasta.Um governo fatiado para dar poderes a diferentes grupos políticos também é um governo que perde a coesão e a clareza de seu projeto político. “Prejudica a capacidade de coordenação do governo”, diz Couto, para quem a classe política “opera de forma corporativa, aos moldes de um cartel, pouco sensível à percepção negativa que a sociedade tem dela”.A reforma política que foi aprovada no Senado com facilidade no fim de 2016 chegará agora à Câmara. O texto, que é uma emenda constitucional, prevê que só poderão ter representatividade no Congresso e direito ao fundo partidário (verbas públicas) o partido que alcançar pelo menos 2% dos votos válidos para deputado federal em todo o país na eleição de 2018 e também 2% dos votos para deputado federal em, no mínimo, 14 unidades da federação.A proposta acaba, ainda, com as coligações proporcionais – a união de legendas em que os mais bem votados acabam dando cadeiras a políticos que jamais seriam eleitos sozinhos. Como a fragmentação é maior na Câmara, essa reforma só ganhará fôlego com empenho das grandes bancadas, como PMDB, PSDB e PT. Mas, ainda que haja determinação política dessas legendas, juntas elas não representam mais de 35% dos votos da Câmara.
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