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Brasil eleva emissões e se afasta de meta climática

Nádia Pontes (de Berlim)

25/10/2017 13h08

Com mais desmatamento, país registrou 9% mais emissões de gases do efeito estufa em 2016, o que dificulta alcançar objetivos do Acordo de Paris. E isso apesar da recessão, que tende a jogar cifras para baixo.Em 2016, as emissões de gases de efeito estufa no Brasil saltaram de 2,091 para 2,278 bilhões de toneladas de carbono equivalente (tCO2e). Isso representa um aumento de 9%, atingindo o nível mais alto desde 2008, segundo divulgado pelo Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG) nesta quarta-feira (25/10).

Os números colocam o país numa situação atípica. Atualmente, o Brasil é único país de grande porte que aumentou a carga de poluição enquanto a economia encolheu. O país atravessa a pior recessão de sua história, com retração de 3,6% no PIB em 2016. No ano anterior, o recuo havia sido de 3,8%. Até então, o padrão registrado era proporcional: as emissões subiam motivadas pelo aquecimento da economia.

O desempenho é anunciado às vésperas da Conferência do Clima (COP), que será realizada em novembro na cidade de Bonn, na Alemanha.

"Patinamos ao redor de 2 bilhões de toneladas por ano e agora saltamos para 2,2 bilhões", comentou André Ferretti, gerente de Estratégias de Conservação da Fundação Grupo Boticário e coordenador-geral do Observatório do Clima.

Segundo Ferreti, o país está se afastando da meta que prometeu cumprir em 2020, quando as emissões não poderiam ultrapassar 2,2 bilhões tCO2e – exatamente a marca de 2016. O receio é de que, quando o país voltar crescer, outros setores, como o de energia, devem adicionar mais algumas toneladas ao patamar atual.

Os pesquisadores do SEEG, uma iniciativa do Observatório do Clima que reúne 35 instituições, dizem que a alta do desmatamento no ano passado (27%) puxou as emissões. Na linguagem científica, o corte da floresta representa "mudança de uso da terra", item que registrou aumento de 23% em 2016 – o que corresponde a mais da metade de todos os gases estufa lançados em território brasileiro.

"O descontrole do desmatamento, em especial na Amazônia, nos levou a emitir, em 2016, 218 milhões de toneladas de CO2 a mais que em 2015", afirmou Ane Alencar, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). Um cenário tido como grave: "O desmatamento é em sua maior parte ilegal e não se reflete no PIB do país", complementa.

Como parte do Acordo de Paris, o Brasil se comprometeu a acabar com o desmatamento ilegal até 2020, além de reflorestar 12 milhões de hectares em áreas degradadas. Uma meta que parece distante.

A atividade agropecuária, aclamada como motor econômico do país, registrou aumento de 1,7% nas emissões em ralação a 2015. Como ela está atrelada ao desmatamento, os pesquisadores somam as emissões diretas da atividade àquelas da mudança de uso da terra – o que resulta em 74% da carga de poluição brasileira.

No Congresso Nacional, os interesses do setor são defendidos pela forte bancada ruralista. "O presidente está fazendo tudo o que esses mais de 200 deputados pedem", criticou Carlos Rittl, diretor-executivo do Observatório do Clima."O pacote de benesses do presidente em troca da libertação das acusações de corrupção tem um impacto muito ruim na política ambiental."

Segundo o SEEG, só o setor do agronegócio brasileiro tem o mesmo peso do Japão no ranking global de emissões, em que o país asiático ocupa a oitava posição (1,6 bilhão tCO2e).

Por outro lado, a agropecuária tem potencial para liderar uma revolução rumo à economia de baixo carbono, aposta Tasso Azevedo, coordenador técnico do SEEG. "O nosso maior desafio no combate à mudança climática é também a nossa maior oportunidade", afirmou Azevedo. Se a atividade empregasse técnicas de baixa emissão – o que inclui o abandono do desmatamento –, os riscos de queimadas e secas cairiam significativamente, destaca Azevedo.

Para fazer os cálculos de estimativas de emissões, o SEEG usa a metodologia baseada nas diretrizes mais recentes do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), conforme publicado no seu quinto relatório (AR5), de 2013. O mesmo método foi usado para calcular a meta brasileira no Acordo de Paris. Criado no Brasil, o SEEG também é aplicado em cálculos no Peru e Índia.

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