Intervenção no Rio completa um mês sem resultados efetivos
Morte da vereadora Marielle Franco e persistência da violência elevam pressão sobre estratégia do governo Michel Temer. Governo ainda não tem um plano para financiar ações de segurança no Estado.Classificada pelo presidente Michel Temer como uma "jogada de mestre”, a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro completou um mês ainda sem um plano detalhado de financiamento e ainda sem mostrar resultados efetivos na diminuição da violência. A estratégia do Planalto ainda passou a sofrer com a pressão do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e de seu motorista, que ocorreu quatro dias antes do aniversário.
No dia 16 de fevereiro, Temer assinou o decreto que nomeou como interventor na segurança do Estado o general do Exército Walter Braga Netto. Na prática, o militar passou a ser o superior das forças de segurança do Estado, que incluem a secretarias da Segurança Pública e de Administração Penitenciária, as polícias Militar e Civil e o Corpo de Bombeiros. A ação está prevista para durar até 31 de dezembro.
Além da morte de Marielle e de seu motorista, que causaram repercussão internacional, o Rio de Janeiro registrou outros episódios brutais, como a morte de quatro pessoas no Complexo do Alemão, entre elas um menino de um ano durante um confronto entre bandidos e policiais. Os episódios desafiaram a propaganda otimista que o governo divulgou nos dias seguintes à assinatura do decreto e a expectativa do Planalto de que a medida aumentaria a sensação de segurança no Rio.
Segundo a ONG Fogo Cruzado, que mantém um mapa colaborativo que registra confrontos envolvendo armas de fogo no Rio de Janeiro e região metropolitana, foram registrados 743 tiroteios ou disparos de armas de fogo na região entre 16 de fevereiro – data da assinatura do decerto de intervenção – e 18 de março. O número é superior ao período de 30 dias anterior à assinatura da medida, quando foram registrados 715 tiroteios e disparos. O levantamento ainda aponta que o número de mortes aumentou 19% – foram 152 mortes no último mês, contra 127 entre 16 de janeiro e 16 de fevereiro.
Ao assinar a intervenção, Temer redefiniu a pauta política, desviando as discussões do seu malsucedido plano de reformar a Previdência para a questão da segurança pública, um tema com maior apelo entre a população. "É uma jogada de mestre, mas não é eleitoral”, disse Temer em entrevista à rádio Bandeirantes em fevereiro.
Antes da morte de Marielle, o aniversário da intervenção estava sendo encarado pelo Planalto como uma oportunidade propagandear a medida. Temer planejava vir ao Rio de Janeiro neste domingo para apresentar um balanço do período. Mas diante da repercussão da morte da vereadora, auxiliares do presidente avaliaram que ele deveria cancelar a viagem, sob o risco de sofrer constrangimentos ou de ser acusado de usar o episódio para uso político, apontou o jornal O Estado de S. Paulo.
Poucas medidas
Ainda que fosse ao Rio, Temer teria por enquanto pouco a apresentar no seu balanço. De efetivo até agora, a intervenção só resultou na troca das chefias das polícias Militar e Civil e da Secretaria de Segurança e apreensões de armas e munições pela Polícia Rodoviária Federal em rodovias de acesso ao Estado.
As Forças Armadas, por enquanto, se limitaram a realizar operações na Vila Kennedy, na Zona Oeste do Rio, ações não muito diferentes daquelas realizadas pelo Exército ao longo do ano passado no âmbito de um decreto do ano passado de Garantia da Lei e de Ordem (GLO) ainda em vigor.
A ação da Vila Kennedy, porém, rendeu até agora a única vitrine positiva da intervenção. Sob a proteção dos soldados, foram realizadas ações sociais no local, como a emissão de documentos e mutirões de vacinação. No sábado, o general Braga Netto visitou o local para observar as ações. Ele não comentou sobre a morte de Marielle e críticas aos resultados da intervenção.
Financiamento
A conta da intervenção ainda continua um mistério. O governo Temer prometeu ajuda financeira ao Rio por meio do BNDES, mas a falta de pagamentos anteriores por parte do Estado vem emperrando a possibilidade de liberação.
Não há nenhuma estimativa de quanto será necessário para financiar as ações. O problema se repete até mesmo com o novo Ministério da Segurança Pública, cuja criação ocorreu paralelamente à intervenção. O titular da pasta, Raul Jungmann disse na semana passada ao jornal O Globo que é um ministro "sem equipe, sem dinheiro e sem teto”.
Ao site G1, o general Richard Nunes, nomeado como novo secretário de Segurança, disse que ainda está aguardando os valores. "Se os recursos prometidos forem entregues a nós, os resultados irão aparecer", disse.
Indagado na quarta-feira sobre a possibilidade de contratar mais policiais, o interventor Braga Netto devolveu a responsabilidade ao governo do Rio. "Eu não posso pagar salários nem fazer concurso, quem faz isso é o governo do estado. O governador está contando com receita federal, que até agora não veio”, disse. Já o governador Luiz Henrique Pezão afirmou que não pediu recursos. "Quem tem que pedir é ele (Braga Netto)”, disse.
Diante da pressão, aliados de Temer vêm afirmando que um mês não seria mesmo suficiente para gerar efeitos decisivos.
"Imbecil é quem imaginou que em 30 dias nós teríamos solucionado a questão da violência no Rio de Janeiro, essa nunca foi a nossa pretensão, nós temos um trabalho de longo curso, ele será realizado", afirmou o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, na quinta-feira (15/03).
No mesmo dia, o ministro Jungmann afirmou que "os resultados existem e vão ganhar cada vez mais visibilidade". "A intervenção nunca se propôs a fazer mágica. Se propôs a trabalho, trabalho, trabalho", disse.
O comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas, por sua vez disse que os resultados ainda vão surgir. "Os problemas, pela sua profundidade, exigem estudos e planejamento detalhado. Mas acreditamos que, agora, no prosseguimento, os resultados começarão a surgir.” Sobre a morte da vereadora Marielle Franco, Villas Bôas disse que o episódio "aumenta a importância da intervenção”.
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No dia 16 de fevereiro, Temer assinou o decreto que nomeou como interventor na segurança do Estado o general do Exército Walter Braga Netto. Na prática, o militar passou a ser o superior das forças de segurança do Estado, que incluem a secretarias da Segurança Pública e de Administração Penitenciária, as polícias Militar e Civil e o Corpo de Bombeiros. A ação está prevista para durar até 31 de dezembro.
Além da morte de Marielle e de seu motorista, que causaram repercussão internacional, o Rio de Janeiro registrou outros episódios brutais, como a morte de quatro pessoas no Complexo do Alemão, entre elas um menino de um ano durante um confronto entre bandidos e policiais. Os episódios desafiaram a propaganda otimista que o governo divulgou nos dias seguintes à assinatura do decreto e a expectativa do Planalto de que a medida aumentaria a sensação de segurança no Rio.
Segundo a ONG Fogo Cruzado, que mantém um mapa colaborativo que registra confrontos envolvendo armas de fogo no Rio de Janeiro e região metropolitana, foram registrados 743 tiroteios ou disparos de armas de fogo na região entre 16 de fevereiro – data da assinatura do decerto de intervenção – e 18 de março. O número é superior ao período de 30 dias anterior à assinatura da medida, quando foram registrados 715 tiroteios e disparos. O levantamento ainda aponta que o número de mortes aumentou 19% – foram 152 mortes no último mês, contra 127 entre 16 de janeiro e 16 de fevereiro.
Ao assinar a intervenção, Temer redefiniu a pauta política, desviando as discussões do seu malsucedido plano de reformar a Previdência para a questão da segurança pública, um tema com maior apelo entre a população. "É uma jogada de mestre, mas não é eleitoral”, disse Temer em entrevista à rádio Bandeirantes em fevereiro.
Antes da morte de Marielle, o aniversário da intervenção estava sendo encarado pelo Planalto como uma oportunidade propagandear a medida. Temer planejava vir ao Rio de Janeiro neste domingo para apresentar um balanço do período. Mas diante da repercussão da morte da vereadora, auxiliares do presidente avaliaram que ele deveria cancelar a viagem, sob o risco de sofrer constrangimentos ou de ser acusado de usar o episódio para uso político, apontou o jornal O Estado de S. Paulo.
Poucas medidas
Ainda que fosse ao Rio, Temer teria por enquanto pouco a apresentar no seu balanço. De efetivo até agora, a intervenção só resultou na troca das chefias das polícias Militar e Civil e da Secretaria de Segurança e apreensões de armas e munições pela Polícia Rodoviária Federal em rodovias de acesso ao Estado.
As Forças Armadas, por enquanto, se limitaram a realizar operações na Vila Kennedy, na Zona Oeste do Rio, ações não muito diferentes daquelas realizadas pelo Exército ao longo do ano passado no âmbito de um decreto do ano passado de Garantia da Lei e de Ordem (GLO) ainda em vigor.
A ação da Vila Kennedy, porém, rendeu até agora a única vitrine positiva da intervenção. Sob a proteção dos soldados, foram realizadas ações sociais no local, como a emissão de documentos e mutirões de vacinação. No sábado, o general Braga Netto visitou o local para observar as ações. Ele não comentou sobre a morte de Marielle e críticas aos resultados da intervenção.
Financiamento
A conta da intervenção ainda continua um mistério. O governo Temer prometeu ajuda financeira ao Rio por meio do BNDES, mas a falta de pagamentos anteriores por parte do Estado vem emperrando a possibilidade de liberação.
Não há nenhuma estimativa de quanto será necessário para financiar as ações. O problema se repete até mesmo com o novo Ministério da Segurança Pública, cuja criação ocorreu paralelamente à intervenção. O titular da pasta, Raul Jungmann disse na semana passada ao jornal O Globo que é um ministro "sem equipe, sem dinheiro e sem teto”.
Ao site G1, o general Richard Nunes, nomeado como novo secretário de Segurança, disse que ainda está aguardando os valores. "Se os recursos prometidos forem entregues a nós, os resultados irão aparecer", disse.
Indagado na quarta-feira sobre a possibilidade de contratar mais policiais, o interventor Braga Netto devolveu a responsabilidade ao governo do Rio. "Eu não posso pagar salários nem fazer concurso, quem faz isso é o governo do estado. O governador está contando com receita federal, que até agora não veio”, disse. Já o governador Luiz Henrique Pezão afirmou que não pediu recursos. "Quem tem que pedir é ele (Braga Netto)”, disse.
Diante da pressão, aliados de Temer vêm afirmando que um mês não seria mesmo suficiente para gerar efeitos decisivos.
"Imbecil é quem imaginou que em 30 dias nós teríamos solucionado a questão da violência no Rio de Janeiro, essa nunca foi a nossa pretensão, nós temos um trabalho de longo curso, ele será realizado", afirmou o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, na quinta-feira (15/03).
No mesmo dia, o ministro Jungmann afirmou que "os resultados existem e vão ganhar cada vez mais visibilidade". "A intervenção nunca se propôs a fazer mágica. Se propôs a trabalho, trabalho, trabalho", disse.
O comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas, por sua vez disse que os resultados ainda vão surgir. "Os problemas, pela sua profundidade, exigem estudos e planejamento detalhado. Mas acreditamos que, agora, no prosseguimento, os resultados começarão a surgir.” Sobre a morte da vereadora Marielle Franco, Villas Bôas disse que o episódio "aumenta a importância da intervenção”.
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