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Caminhoneiros mantêm greve mesmo após governo anunciar acordo

25/05/2018 06h24

Acordo, que não é unânime, prevê redução de 10% no valor do diesel nas refinarias por 30 dias. Nesse tempo, governo vai procurar maneiras de reduzir os preços dos combustíveis. Nem todos os grevistas acatam proposta.A Polícia Rodoviária Federal (PRF) divulgou nesta sexta-feira (25/04) que não identificou nenhuma desmobilização nos locais de paralisação de caminhoneiros nas rodovias brasileiras, apesar do anúncio, feito pelo governo nesta quinta-feira, de um acordo para suspender a greve.

Na Régis Bitencourt, em São Paulo, carretas e caminhões permanecem estacionadas ao logo da rodovia. O mesmo ocorre em rodovias no Paraná, em Santa Catarina, no Rio Grande do Sul e no Distrito Federal.

Governo e representantes de caminhoneiros chegaram nesta quinta-feira a um acordo para que a paralisação dos trabalhadores fosse suspensa por 15 dias. Em troca, a Petrobras vai manter a redução de 10% no valor do diesel nas refinarias por 30 dias, enquanto o governo vai costurar formas de reduzir os preços. Com isso, o preço de referência nas refinarias ficará em R$ 2,10 por esse período.

A Petrobras também manteve o compromisso de custear esse desconto, estimado em 350 milhões de reais, nos primeiros 15 dias. Os 15 dias seguintes serão patrocinados pela União.

O governo também prometeu uma previsibilidade mensal nos preços do diesel até o fim do ano sem mexer na política de preços da Petrobras e vai subsidiar a diferença do preço em relação aos valores estipulados pela estatal a cada mês. Segundo o jornal Folha de S. Paulo, essa medida custará aos cofres da União cerca de R$ 5 bilhões.

"Nos momentos em que o preço do diesel na refinaria cair e ficar abaixo do fixado, a Petrobras passa a ter um crédito que vai reduzindo o custo do Tesouro", explicou o ministro da Fazenda, Eduardo Guardia.

O governo também se comprometeu a zerar a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) para o diesel até o fim do ano e negociará com os estados pelo fim da cobrança de pedágio para caminhões que trafegam vazios, com eixo suspenso.

Uma nova rodada de negociações está prevista em 15 dias. Até lá, os representantes dos caminhoneiros se comprometeram a suspender a greve. Além disso, a Advocacia-Geral da União (AGU) obteve ao menos 19 liminares que proíbem a obstrução de rodovias federais.

Sem unanimidade

A decisão de suspender a paralisação, porém, não foi unânime. Das 11 entidades do setor de transporte, em sua maioria caminhoneiros, que participaram do encontro, uma delas, a Associação Brasileira dos Caminhoneiros (Abcam), que representa 700 mil caminhoneiros, recusou a proposta.

O presidente da associação, José Fonseca Lopes, deixou a reunião no meio da tarde e disse que continuará parado. "Todo mundo acatou a posição que pediram, mas eu não. Vim resolver o problema do PIS, do Cofins e da Cide, que está embutido no preço do combustível", disse Lopes.

Caminhoneiros autônomos também disseram que não vão interromper a greve.

Governo apura locaute de empresas

O ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, afirmou que o governo apura se houve prática de locaute pelas empresas de transporte. Locaute ocorre quando empresas impedem empregados de trabalhar em razão de próprios interesses e não das reivindicações dos trabalhadores. No caso do movimento dos caminhoneiros, do qual participam autônomos, as transportadoras poderiam ter interesse direto em forçar a redução do preço do diesel.

"Eu diria que nós temos indícios de uma aliança, um acordo entre os caminhoneiros autônomos e as distribuidoras de transportadores", afirmou Jungmann. "Isso é grave porque representa indícios de locaute, o que não é permitido pela lei."

Causas e impactos

Desde o início da semana, caminhoneiros em todo o Brasil suspenderam os transportes e paralisaram rodovias. Caminhões carregados ocupam gramados e postos de combustíveis em protesto aos sucessivos reajustes do preço do diesel.

"Em 20 dias, o valor foi de R$ 3,19 a R$ 3,70", disse o caminhoneiro Juarez sobre a variação média no estado de São Paulo. "A gente só sai daqui quando o preço cair. E tem que ser em definitivo, não só por alguns dias", argumentou o motorista, que estacionou seu veículo na altura de Jacareí, interior de São Paulo.

No Brasil, cerca de 15 milhões de caminhoneiros são responsáveis pela quase totalidade do transporte de cargas que abastecem os brasileiros, principalmente produtos perecíveis. Veículos, grãos, mantimentos, bebidas e combustíveis viajam longas distâncias nas rodovias para chegar aos consumidores.

É difícil estimar quantos caminhoneiros deixaram de trabalhar desde o início da paralisação. Mas os reflexos são críticos e estão por toda parte: grandes cidades anunciaram a redução da frota de ônibus no transporte coletivo por falta de combustível; aeroportos alertam que não há estoque suficiente para aviões encherem os tanques nos próximos dias, o que levou ao cancelamento de voos; e o desabastecimento de produtos básicos preocupa supermercados e feiras livres.

Em algumas montadoras, por exemplo, as atividades estão suspensas momentaneamente por falta de peças. Grandes redes de fast food também reclamam que itens como carnes e pães não chegaram na data esperada. Muitos produtos de origem animal estão sendo descartados. Na região de Passos, em Minas Gerais, por exemplo, mais de 500 mil litros de leite foram inutilizados.

A Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae) alertou que a greve dos caminhoneiros pode prejudicar o fornecimento de água no Rio, pois a entrega de produtos químicos utilizados no tratamento pode ser afetada.

No setor de alimentos, o Ceasa do Rio já registrou alta de preços, e em São Paulo, a greve afetou supermercados, principalmente quanto à disponibilidade de frutas, legumes e verduras, que são de abastecimento diário.

Com uma carga de feijão, o caminhoneiro Marcos disse esperar mais respeito pelo trabalho que faz. "Quem carrega o Brasil são os caminhoneiros. Sem a gente, não tem comida, combustível e não tem nem educação", diz.

Diesel consome 70% do ordenado

Setores importantes da economia pressionaram por um acordo. Por outro lado, os caminhoneiros dizem sentir apoio da população. Na Dutra, carros de passeio buzinam em apoio ao movimento, moradores das cidades próximas levam cobertores, mantimentos e água até o local onde os caminhões estão estacionados. Fogueiras e mesas improvisadas acompanham os grupos durante os dias de paralisação nas estradas – em alguns pontos, a temperatura caiu para 8?C durante a noite.

"Estamos recebendo muito apoio de muita gente. Alguns empresários trouxeram banheiro químico pra gente, outros levam a gente pra tomar banho. Acho que ninguém aguenta mais esse aumento geral no custo de vida", disse um dos caminhoneiros, que entregou uma carga de celulares em São José dos Campos e não tem data para voltar para Salvador, na Bahia, onde mora sua família.

Ademar, filho e neto de caminhoneiros, disse que o custo com diesel consome 70% do que ganham com frete. "Não está sobrando nada pra gente. Além do combustível, tem o gasto com pneu, com manutenção, com pedágio. Sem falar na falta de segurança nas estradas", afirmou.

PV/dw/abr/ots

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