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Roteiro de quatro dias pelo Vale do Mosela

Carlos Albuquerque

31/07/2018 14h00

Numa viagem que começa em Koblenz e vai até Trier, o passeio por uma das regiões com os melhores vinhos brancos do mundo passa por vilarejos idílicos, castelos encantados e pelos vinhedos mais íngremes do mundo.Com 544 quilômetros de extensão a partir de sua nascente na montanha dos Vosges, na França, o Mosela (Mosel, em alemão) é um dos principais afluentes do rio Reno e a segunda via de navegação mais importante da Alemanha.

Essa região romântica, onde celtas e romanos já cultivavam videiras há mais de 2.000 anos, tem hoje mais de 100 cidades e vilarejos vinícolas, cerca de 5.000 viticultores e aproximadamente 9.300 hectares com 70 milhões de videiras.

Como a maior parte dos brasileiros entra na Alemanha por Frankfurt, é mais prático iniciar a sua viagem por Koblenz, cidade do estado da Renânia-Palatinado (Rheinland-Pfalz) situada na confluência do Reno com o Mosela.

Em nosso tour, vamos nos concentrar em Koblenz, Cochem, Bernkastel-Kues e Trier, ou seja, nas cidades e vilarejos históricos do Baixo e Médio Mosela (Untermosel ou Terrassenmosel e Mittelmosel) ao longo de castelos encantados, encostas de ardósia e dos vinhedos mais íngremes do mundo.

Nossa viagem pelo Vale do Mosela vai de Koblenz, onde o rio deságua no Médio Reno, até Trier, uma das cidades mais antigas da Alemanha fundada pelos romanos há mais de 2 mil anos.



1° Dia: Koblenz

Você pode iniciar seu dia no centro histórico do antigo posto militar romano, com suas ruelas, pracinhas e prédios restaurados, já que cerca de 80% da cidade foram destruídos na Segunda Guerra. Na praça Josef-Görres-Platz, a Historiensäule (Coluna da História) relata em bronze 2 mil anos de história de Koblenz.

Na parte inferior da coluna, um barco carregado com barris de vinho simboliza o assentamento romano dos séculos 1° ao 5°, passando pelas Cruzadas na Idade Média, pelo período prussiano, pela destruição em 1944 até a visão de uma cidade voltada para o futuro.

O centro histórico de Koblenz também abriga o famoso Deutsches Eck, uma ponta artificial de terra instalada na confluência entre os rios Reno e Mosela. Devido à sua localização geográfica, os romanos chamaram o local de "Confluentes", o que deu origem ao nome da cidade em alemão.

Com a imponente estátua equestre do imperador alemão e rei prussiano Guilherme 1°, o Deutsches Eck é o símbolo de Koblenz e faz parte do Vale do Alto Médio Reno como Patrimônio Mundial da Humanidade. Após a destruição pela guerra, a escultura colossal – erguida em comemoração à vitória sobre a França que deu origem ao Império Alemão entre 1870/1871 – foi colocada novamente sobre o seu pedestal em 1993. Hoje, o local recebe anualmente mais de 2 milhões de visitantes.

Seguindo rio abaixo, pouco depois do Deutsches Eck você vai passar pela Basílica de São Castor (Kastorkirche), cuja construção original remonta ao século 9°. Junta às demais igrejas românicas Liebfrauenkirche e Florinskirche, ela marca a silhueta do centro histórico. Ali se localiza também a estação Talstation do teleférico sobre o Reno.

Além da vista fantástica sobre a cidade e a confluência do Reno com o Mosela, o bondinho leva o visitante até perto de outra atração imperdível de Koblenz: a gigantesca fortaleza Festung Ehrenbreitstein, a segunda maior da Europa depois de Gibraltar.

Construída entre 1817 e 1828, ali se encontrava na Idade Média um castelo medieval. Hoje, as instalações da fortaleza abrigam o museu Landesmuseum Koblenz, um albergue da juventude, o Memorial do Exército Alemão (Ehrenmal des Deutschen Heeres) e diversos órgãos administrativos. A fortaleza também faz parte do Patrimônio Mundial da Humanidade Vale do Alto Médio Reno. Se não quiser usar o teleférico, há também balsas que fazem a travessia entre o centro histórico de Koblenz e o bairro Ehrenbreitstein.

No bairro Stonzenfels, no sul de Koblenz, encontra-se outra imperdível atração da cidade: o castelo Schloss Stolzenfels. No início do século 19, o rei prussiano Frederico Guilherme 4° reformou as ruínas do castelo medieval, transformando-o em residência de verão. O castelo classicista é considerado hoje a síntese do romantismo do Reno.

Aproveite a noite para conhecer um pouco mais do centro histórico, onde você pode provar especialidades locais e tomar os famosos vinhos da regiãode Koblenz, como na tradicional casa de vinhos Weinhaus Hubertus, construída em 1689, ou beber o famoso Riesling do Vale do Mosela no Winninger Weinstuben, restaurante de vinhos situado bem próximo da estação de teleférico Talstation.



2° Dia: Cochem e Burg Eltz

Você pode percorrer todo o trajeto ao longo do Baixo e Médio Mosela de carro. Mas, se preferir ir de trem, reveze com uma viagem de barco, por exemplo, entre Koblenz e Cochem. Pois o Baixo Mosela (Untermosel ou Terrassenmosel), que abrange os primeiros 100 quilômetros de rio a partir de Koblenz, é o trecho mais sinuoso e mais espetacular devido às suas encostas altas, íngremes e estreitas, com parreiras voltadas para Sul e Oeste e distribuídas em pequenas parcelas de terreno.

Perto de Cochem, na localidade de Bremm, o Calmont é o vinhedo mais íngreme da Europa, com 380 metros de altura e uma inclinação de até 68 graus. As encostas são tão íngremes que as parreiras precisam ser apoiadas com postes e arames, enquanto a sua poda e colheita são feitas com a ajuda de guindastes.

Cochem é um dos lugares mais conhecidos do Vale do Mosela. Encimada por um castelo rodeado de vinhedos, a pitoresca cidade de pouco mais de 5,5 mil habitantes é um ótimo local para pernoitar, com uma boa oferta de adegas, restaurantes e hotéis, além de várias atrações.

Além do calçadão florido ao longo do Mosela, se você passear pelas ruas enviesadas do centro histórico, vai chegar inevitavelmente à praça Marktplatz, ladeada de casas em enxaimel e edifícios históricos, como o prédio da prefeitura, e uma fonte do início do século passado no centro. Se você curte passeio de trenzinho, pode conhecer o centro histórico com o Mosel-Wein-Express, que sai da ponte sobre o Mosela. O passeio de 25 minutos leva também ao bairro de Cond, onde se tem uma vista incrível da região.

Mas o símbolo e principal atração da cidade é o Castelo Reichsburg, situado sobre uma colina a cem metros do rio. A construção original data de 1056, mas ele foi destruído em 1689 e reconstruído no século 19, como mostram as torres neogóticas. Além de ser o maior do gênero na região, ele é conhecido como "Neuschwanstein do Mosela" por sua beleza.

Outro castelo imperdível é o Burg Eltz, situado a menos de 20 quilômetros de Cochem. Ele é uma das poucas fortificações que sobreviveram às destruições ordenadas pelo rei francês Luís 14 na segunda metade do século 17. Como uma espécie de castelo-modelo, ele estampou a antiga nota de 500 marcos durante muitos anos.

Sua construção remonta ao século 12, mas em 1268 ele foi dividido entre três herdeiros. Ao longo dos séculos, os descendentes de cada linha expandiram a sua propriedade dentro da estreita área da edificação. Isso levou ao alto adensamento construtivo, com torres, sacadas e outros elementos.

Outra particularidade é a localização. Burg Eltz se situa dentro de um vale e não sobre uma elevação, como a maioria dos castelos do Mosela. Pode-se ir de carro ou mesmo a pé, a parte do cais do vilarejo de Moselkern.

Antes de continuar a viagem, uma dica: um passeio pelo Vale do Mosela é, sobretudo, relaxante. Se quiser evitar o burburinho de cidades com muitos turistas, um pouco mais adiante, entre Bremm e Cochem, o idílico vilarejo de Beilstein, com as ruínas do castelo Burg Metternich, é boa opção de pernoite para explorar a região.



3° Dia: Médio Mosela

Íngremes encostas de ardósia, castelos,vinhedos e cidades vinícolas também dominam a paisagem do Médio Mosela (Mittelmosel), trecho de 120 quilômetros de rio antes de chegar a Trier. No percurso entre Cochem e Bernkastel-Kues, há várias cidades e atrações que vale a pena conhecer.

Em Alf, o castelo medieval Burg Arras é hoje um hotel com restaurante e museu sobre a cultura da região, sem falar da vista espetacular. Em Bullay, vilarejo em frente a Alf, as ruelas enviesadas e as antigas casas em enxaimel convidam a um passeio e a provar as especialidades da região numa das muitas Strausswirtschaften, adegas caseiras improvisadas típicas do Vale do Mosela.

Em Zell, a fonte Zeller Schwarze Katz homenageia o famoso vinho da cidade, uma das maiores produtoras do Vale do Mosela. Se quiser ter uma vista incrível da região e da cidade, vá até o monte Marienburg, perto de Pünderich, ou ao chamado Beinter Kopf, um local ótimo para fazer piquenique ao sul de Zell.

Traben-Trarbach é conhecida por suas termas e por suas adegas subterrâneas, que se espalham por diversos andares e por centenas de metros de vãos abobadados no subsolo da cidade que, no século 19, foi um dos principais terminais de traslado de vinho da Europa. Essa prosperidade também se espelha nos muitos prédios históricos do local.

Com pouco mais de 7 mil habitantes, Bernkastel-Kues, a cerca de 50 quilômetros de Trier, guarda várias atrações. Encimada pelas ruínas do Burg Landshut, a cidade nasceu de uma fortificação (castellum) romana. Ali, o visitante se sente em outra época ao visitar a praça central Marktplatz com seus edifícios em enxaimel, como a estreita casa Spitzhäuschen, de 1416.

Situada às margens do Mosela, a torre da igreja de São Miguel e São Sebastião (Pfarrkirche St. Michael und St. Sebastian) domina a paisagem urbana ao longo do rio. Por sua oferta hoteleira e gastronômica, Bernkastel-Kues é uma boa opção de pernoite em seu tour pelo Mosela.

Acompanhando o seu tour, estão sempre os vinhedos. A peculiaridade da região está mesmo na bebida, pois muitos consideram os vinhos brancos do Mosela os melhores do mundo. Acompanhado de um bom Riesling ou Müller-Thurgau, não deixe de provar uma deliciosa Zwiebelkuchen (torta de cebola), Speckplätzchen (biscoitinhos de bacon) ou um dos diversos pratos típicos numa das muitas adegas e restaurantes locais.



4° Dia: Trier

Em poucos lugares fora da Itália é possível encontrar tantos prédios de origem romana quanto em Trier (Tréveris), uma das cidades mais antigas da Alemanha e um dos mais antigos centros de venda e produção de vinho na Europa. Com pouco mais de 110 mil habitantes, ela é hoje a terceira maior cidade da Renânia-Palatinado, mas já foi a segunda maior cidade do Império Romano do Ocidente no século 4°.

Fundada em 15 a.C., a cidade do Vale do Mosela passou rapidamente de posto militar à residência de imperadores romanos. Como testemunho dessa época, a Porta Nigra (portão negro) é o maior portão de entrada preservado de uma fortificação romana. Construído no ano 170, externamente, ele lembra um palacete, sendo um bom local para começar seu passeio pelo centro histórico de Trier.

Andando em direção à praça Hauptmarkt, logo à direita, na praça Simeonstiftplatz, você vai ver a mais nova atração de Trier: uma estátua de bronze de 5,5 metros de altura do filósofo Karl Marx – um presente do governo chinês – inaugurada em maio de 2018 em homenagem ao aniversário de 200 anos do filho mais famoso da cidade. Quem quiser saber mais sobre o grande filósofo pode visitar a casa onde ele nasceu, na rua Brückenstrasse n° 10, onde hoje funciona o Museum Karl-Marx-Haus.

Com suas construções renascentistas e barrocas, a praça Hauptmarkt é uma das mais belas do país. Após ser destruído na Segunda Guerra, seu complexo de edifícios foi totalmente reconstruído no final dos anos 1960. Erguida como lugar de festas e eventos em 1430, a casa Steipe é um dos mais bonitos. O prédio gótico foi sede da prefeitura até o século 18 e hoje abriga um café/restaurante.

Da Hauptmarkt são apenas alguns minutos a pé até a Catedral de São Pedro (Dom St. Peter), um presente da imperatriz Helena, mãe de Constantino, primeiro imperador romano a se converter ao cristianismo. No início do século 4°, ela presenteou o bispado de Trier com o seu palácio, para que ali fosse construída a catedral. A atual construção em estilo românico remonta ao século 13, embora desde então o edifício tenha sofrido várias reformas e ampliações. Vizinha à catedral, a Igreja de Nossa Senhora (Liebfrauenkirche) é a igreja gótica mais antiga da Alemanha, erguida em 1243.

Bem perto dali, a monumentalidade da Konstantinbasilika, antiga sala de audiências do imperador Constantino, é prova do poder do antigo Império Romano. Não é à toa que Trier é conhecida como "Segunda Roma". Outros testemunhos da presença romana na cidade são o anfiteatro (Amphitheater), as ruínas das termas Kaiserthermen e Barbarathermen, a coluna sepulcral Igeler Säule e a ponte sobre o rio Mosela Römerbrücke, a mais antiga da Alemanha, construída originalmente no século 1°.

Desde 1986, a Catedral de São Pedro, a Igreja de Nossa Senhora e as construções romanas aqui mencionadas foram elevadas a Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco. Para terminar seu passeio pelo Vale do Mosela, nada como um vinho e um bom jantar num dos muitos restaurantes tradicionais, como, por exemplo, no Zur Glocke, no centro histórico de Trier.

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