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O pôquer das potências mundiais na Venezuela

Diego Zúñiga (md)

25/01/2019 17h36

A crise no país com as maiores reservas de petróleo do mundo se tornou um caso internacional. Entre os atores desse jogo estão EUA, China, Rússia e até a Turquia. A disputa de interesses é travada silenciosamente.Faz bastante tempo que os efeitos da crise política que afeta a Venezuela começaram a se fazer notar também além das fronteiras. Isso não só tem relação com o crescente fluxo migratório que pressiona os serviços de vários países da região, mas também tem bastante a ver com questões geopolíticas.

Qual é a importância da crise venezuelana para o mundo? Por que algumas potências reconhecem o presidente da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, como chefe de Estado legítimo, enquanto outras dão seu total respaldo ao presidente Nicolás Maduro?

Agustín Blanco Muñoz, historiador da Universidade Central da Venezuela, atribui isso ao fato de a Venezuela ser "o último grande polo vivo do socialismo-comunismo", uma peça no xadrez mundial que serve de contrapeso à hegemonia dos Estados Unidos na América Latina.

"Isso pode ser qualificado como uma ingerência direta da China e da Rússia, com grandes investimentos no país", explica. O especialista vê o choque entre Estados Unidos, de um lado, e Rússia e China, do outro, como uma confrontação "quase silenciosa, sem manifestações de inimizade, porque Washington não pode abrir uma disputa dura, olho no olho, com Pequim e Moscou".

Blanco Muñoz pondera, entretanto, que os Estados Unidos não ficarão de braços cruzados, porque "China e Rússia tomaram muito espaço na Venezuela, e o plano desses países é de se estender à América Latina". "Isso é algo que preocupa quem já foi dono daquele quintal, ou seja, os Estados Unidos", afirma.

"Última metástase do comunismo"

O cientista político Ivo Hernández, especialista em América Latina na Universidade de Münster, na Alemanha, vê o problema de forma parecida. "Os regimes não democráticos do mundo apoiam a última metástase do comunismo. Rússia e China são duas potências geopolíticas que investiram enormes quantias de dinheiro" para manter o governo de Maduro, afirma.

Hernández atribui o problema à "nefasta política externa do [ex-presidente americano] Barack Obama, que não deu atenção à América Latina". Por outro lado, ele elogia o atual ocupante da Casa Branca. "Independentemente do que se possa pensar de Donald Trump e de sua política interna, o que ele fez é eticamente inquestionável, porque se aliou às democracias", opina o especialista, se referindo ao apoio quase instantâneo dado por Trump à autoproclamação de Guaidó como presidente interino.

"Isso estava combinado. Os Estados Unidos, através de seu vice-presidente, Mike Pence, enviaram comunicados de apoio a Guiadó", ressalta Blanco Muñoz. "Atrás de Trump, veio o Grupo de Lima, liderado pela Colômbia e pelo Brasil", acrescenta. Para ele, o protagonismo assumido por esses dois países latino-americanos tem a ver com o fato de fazerem fronteira com a Venezuela.

Hernández, por outro lado, vê a postura do Grupo de Lima como uma forma de "reivindicar a defesa da democracia, apesar de infelizmente estarmos vendo máculas na região, como o caso mexicano".

"Novo Eldorado"

Mas existem também outros atores. A Turquia, por exemplo. Em dezembro de 2018, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, foi a Caracas para se encontrar com Maduro. Ele ofereceu, inclusive, "cobrir as necessidades" que o país sofre.

"Aqui temos um novo Eldorado, o Arco Mineiro do Orinoco, onde há ouro e muitos outros metais. Para cobrir a baixa na produção de petróleo, o governo foi abrindo as portas do Arco Mineiro. E Erdogan deixou dinheiro e saiu muito satisfeito com tudo o que levou assinado", explica Blanco Muñoz. "Por isso, quando me dizem que a Venezuela vai se afundar economicamente, respondo que os donos da Venezuela – China e Rússia principalmente – não vão deixar essa nova colônia cair."

"Neste momento, a Venezuela está atravessada por fenômenos globais que superam a capacidade de reação da própria população: é um eixo do narcotráfico mundial, está aliada com os piores elementos do narcoterrorismo e conta com o apoio intelectual da espionagem cubana, que foi formada pela Stasi alemã, que não é de se menosprezar", afirma Hernández.

"A Venezuela tem a sustentação de Forças Armadas corrompidas em parte pelo narcotráfico", acrescenta. "Mas também obteve liquidez que foi injetada nos últimos meses tanto pelo governo chinês como pelo russo, endividando a Venezuela de maneira irresponsável. Tudo feito às costas da população, com acordos que não foram aprovados por uma Assembleia, mas negociados por um tirano", acusa.

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