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Opinião: Görlitz tem que ter consequências

Kay-Alexander Scholz (md)

17/06/2019 15h47

O partido populista de direita AfD quase emplaca seu primeiro prefeito numa cidade alemã, não fosse a união das legendas adversárias. Görlitz é um paradigma do atual momento político alemão, opina Kay-Alexander Scholz."Foi por pouco!" É o que muitos provavelmente estão dizendo na Alemanha depois que um candidato do partido populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD) não conseguiu conquistar a primeira prefeitura para a legenda. No entanto, aí já começa o grande "porém". O resultado foi relativamente apertado, afinal, 45% escolheram o AfD.

Para este resultado apertado, todas as forças tiveram que ser agrupadas. Foi necessária uma aliança suprapartidária para evitar a vitória do populista Sebastian Wippel. Estes incluíam os herdeiros da revolução pacífica do leste alemão na União Democrata-Cristã (CDU), o partido da chanceler Angela Merkel, assim como os herdeiros da ditadura da Alemanha Oriental do partido A Esquerda. Para isso, foram levantadas questões sobre princípios partidários. A base da CDU não vai deixar barato.

Mas nesta eleição o que esteve em jogo não foi apenas a política a nível local. A eleição na cidade mais oriental da Alemanha é paradigma de um dilema ainda maior.

O AfD se tornou recentemente a força política mais forte em uma área ampla em torno de Görlitz em nível municipal, nos parlamentos e conselhos distritais – com um mandato de cinco anos. A nova "área do AfD" se estende até Berlim e avança pela fronteira com a Polônia até o Mar Báltico. A vitória do candidato da CDU em Görlitz muda pouco no fato de que a AfD está a caminho de se tornar um grande partido a nível regional, com valores entre 20% e 30%.

Nas próximas eleições estaduais, agendadas para o segundo semestre, o AfD provavelmente se tornará a força mais forte em dois Estados. Para que um governo seja formado, então, sem a participação do AfD, três ou quatro partidos têm que se unir. Como aconteceu agora em Görlitz. E já há indícios de que a CDU poderia cooperar com A Esquerda.

Entre os que vivem no leste da Alemanha e que conheceram a Alemanha Oriental volta a circular, por isso, o termo depreciativo "partido de bloco". Na Alemanha Oriental, estes eram partidos placebo, sem perfil próprio, que existiam para preservar a aparência de democracia durante a ditadura. Quem mandava mesmo era o partido Partido Socialista Unificado da Alemanha (SED). Mesmo que essa comparação histórica esteja errada, ela aponta para uma distância alarmante entre cidadãos e partidos.

O objetivo após as eleições estaduais será deter o AfD. Mas isso também significará passar por cima daquela que, conforme o estado atual, será a maior força política. Isso levanta a questão sobre o que se seguirá ao velho princípio democrático, segundo o qual o partido mais forte vence ou fica responsável por formar a coalizões?

Outras questões serão adicionadas. O que ocorrerá com a concorrência dos partidos ao longo de seus perfis, se eles colocarem de lado seus próprios objetivos ou candidatos para evitar algo ou alguém? Será que isso ainda é uma concorrência justa de opiniões?

Será que isso pode ser algo bom a longo prazo? Não há o perigo de que as eleições sejam questionadas e percam legitimidade? Se, por exemplo – uma proposta feita recentemente – for necessário se votar pelo tempo necessário até que saia um resultado que seja considerado adequado por determinados partidos?

Naturalmente, a Alemanha tem uma responsabilidade histórica especial: fascismo nunca mais, ditadura nunca mais! Mas não seria por isso que todos deveriam ter interesse ??em cultivar uma democracia viva? No entanto, quem divide o mundo entre "bom" e "mau" – o que infelizmente é frequente atualmente no debate político – vai na direção errada. Esta dicotomia lembra antigos contos de fadas alemães. Parece ser um defeito dos alemães desenvolver um romantismo político a partir disso. Mas onde há muita emoção e pouco pensamento de cabeça fria faltam as nuances e a ânsia por acordos. Em vez disso, ocorrem as polarizações e as inimizades. Assim, vai diminuindo a fé na força da política democrática.

O "bom" resultado de Görlitz não esconde o terremoto político pelo qual a politicamente tão estável Alemanha está passando atualmente. Este é refletido não somente pelo AfD mas também pela fraqueza dos partidos tradicionais SPD (Partido Social-Democrata) e CDU e pela ascensão quase mágica dos Verdes. O bem da democracia depende, portanto, de políticos corajosos que pensem e trilhem novos caminhos.

Que tal, por exemplo, discussões reais sobre erros e visões? Erros e omissões, como o fato de Görlitz não poder ser razoavelmente alcançada por trem ou avião até hoje. Para a alegada "cidade europeia", isto é uma vergonha. Por que quase não se falou em visões durante a campanha eleitoral, sobre como essa cidade no triângulo fronteiriço com a Polônia e a República Tcheca pode fazer algo verdadeiramente novo e transnacional? O fato de um candidato da CDU com raízes romenas ter ganho poderia talvez provocar tal discussão verdadeiramente cosmopolita.

Ou que tal um renascimento da política como solucionadora de problemas? E problemas urgentes não faltam. Se as pessoas fossem colocá-los no centro das atenções, tirariam força da polarização. A Dinamarca tenta, por isso, com um governo minoritário. Por que não? Na Alemanha, isso talvez pudesse ajudar a fechar novamente os abismos políticos que atravessam o país – indo até Görlitz.

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Autor: Kay-Alexander Scholz (md)