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Ucrânia leva 'os horrores da guerra' até Putin; mas qual o risco disso?

Presidente russo Vladimir Putin em discurso no fórum anual do grupo Valdai, em Moscou, em 2022 - Mikhail Metzel/SPUTNIK via REUTERS
Presidente russo Vladimir Putin em discurso no fórum anual do grupo Valdai, em Moscou, em 2022 Imagem: Mikhail Metzel/SPUTNIK via REUTERS

Roman Goncharenko

02/06/2023 09h43

A espiral de violência continua. Nos últimos dias, a Rússia tem lançado bombardeios diários contra Kiev, que teriam deixado mortos, incluindo uma criança. Na região russa de Belgorod, que faz fronteira com a Ucrânia, há também constantes relatos de ataques. A imprensa russa noticiou o abatimento de um drone em Kaluga nesta quinta-feira (1) - um dia após um ataque em Moscou ter chamado atenção internacional.

Há quase um ano já são registrados ataques de drones, principalmente contra instalações militares e de infraestrutura energética, não somente em regiões ucranianas anexadas pela Rússia, como a Crimeia, mas também no próprio território russo. Um dos primeiros alvos foi uma refinaria na região de Rostóvia, em junho de 2022.

Ataques em regiões mais distantes da fronteira são mais raros. Em dezembro, a base aérea militar Engels, em Saratov, foi atacada duas vezes.

A Ucrânia normalmente não assume a responsabilidade por esses ataques. Ao mesmo tempo, a Rússia bombardeia todo o território ucraniano com muito mais frequência, utilizando não somente drones, mas também mísseis de vários tipos. Os danos e as vítimas não são proporcionais.

Nos últimos meses, aumentaram dos dois lados os ataques de drones e bombardeios em regiões que não estão na zona de combate.

O que está por trás do ataque em Moscou?

Analistas divergem sobre as causas que levaram a essa expansão. O austríaco especialista em Rússia Gerhard Mangott aponta uma ligação entre o ataque com drones em Moscou, o bombardeio de zonas russas na fronteira e a atuação de "partisans" - como ele chama os combatentes de grupos paramilitares da Legião da Liberdade da Rússia e do Corpo de Voluntários Russos, compostos supostamente por cidadãos russos, que atuam do lado da Ucrânia.

"É evidente que o lado ucraniano quer levar os horrores da guerra para a Rússia. Quer deixar claro para a população que o Estado não é capaz de protegê-los, nem na região de fronteira e nem em Moscou", avalia Mangott. Segundo ele, isso desvia a tentativa do Kremlin de "criar a impressão para a sociedade russa de que não há guerra, como se tudo estivesse normal".

Já o especialista militar alemão Gustav Gressel, do think tank Conselho Europeu de Relações Exteriores, tem outra avaliação e afirma que é preciso distinguir os ataques em Moscou dos acontecimentos em Belgorod. Segundo ele, os ataques em Moscou são "instrumentos de guerra psicológica". "A história de Belgorod e os ataques na fronteira, por outro lado, estão relacionados à contraofensiva".

De acordo com Gressel, a Ucrânia quer obrigar a Rússia a proteger militarmente a fronteira e, para isso, Moscou precisaria retirar tropas do território ucraniano. Para o especialista, o grau de eficácia dessa estratégia das forças ucranianas na contraofensiva só será medido dentro de algumas semanas.

A reação do Ocidente aos ataques em Moscou

O Ocidente teve uma reação contida aos acontecimentos recentes. Ao ser questionado pela DW, um porta-voz do governo alemão afirmou na quarta-feira que o direito internacional permite que a Ucrânia ataque o território russo em legítima defesa, mas acrescentou que Berlim é contra o uso de armas fornecidas pela Alemanha nessa situação.

A reação dos Estados Unidos, o principal fornecedor de armas a Kiev, foi semelhante. O porta-voz da Casa Branca, John Kirby, afirmou que nenhuma arma norte-americana foi usada no ataque a Moscou e destacou que os EUA "não apoiam ataques dentro da Rússia".

No entanto, representantes do Corpo de Voluntários Russos já utilizaram veículos blindados americanos em uma incursão em território russo. Gressel espera que isso não volte a se repetir, pois "isso poderia tirar do sério os alarmistas da escalada em Washigton. Justamente a Casa Branca é exageradamente cautelosa, Kiev deveria ser mais prudente".

De modo geral, porém, ele está convencido de que "Kiev tem direito de atacar alvos na Rússia", pois "ninguém pediu para Putin começar essa guerra". O especialista acrescenta que o presidente russo precisa arcar com as consequências de seus atos agora.

Caças F-16 para intimidação?

No contexto da expansão dos ataques em território russo, Oleg Ignatov, do Grupo Crises Internacionais, avalia que a Ucrânia tenta "aumentar o preço da guerra para Rússia". Segundo o especialista, os Estados Unidos têm muita influência na Ucrânia, mas não em todas as áreas. Ignatov acredita que Washington pode convencer Kiev a não usar armas americanas, como o sistema de mísseis Himars, em ataques ao território russo, mas não mais do que isso.

O desejo de Kiev de receber mais armas do Ocidente deve ter um efeito dissuasivo. Na mais recente cúpula do G7, no Japão, o presidente americano, Joe Biden, afirmou que seu homólogo ucraniano, Volodimir Zelenski, prometeu não usar os caças F-16, que a Ucrânia pede há tempos, para atacar a Rússia. Até agora, o Ocidente decidiu apenas treinar os pilotos ucranianos.