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Por que os hospitais em Gaza estão na linha de fogo e há crime de guerra?

Incubadoras em hospital de Gaza deixam de funcionar sem energia Imagem: Reprodução / TV Al Jazeera

23/11/2023 04h00Atualizada em 23/11/2023 18h32

A Faixa de Gaza tem 36 hospitais, mas duas em cada três dessas instituições estão hoje fora de operação devido aos bombardeios ou à falta de insumos em função da guerra Israel-Hamas, segundo as Nações Unidas (ONU). A infraestrutura que resta está superlotada, e o cenário é dramático: gestantes e pacientes com câncer se amontoam ao lado de feridos em estado grave - muitos são crianças e adolescentes - e pessoas traumatizadas. Há energia apenas por algumas horas, quando há. Operações chegam a ser conduzidas à luz de telefones celulares.

A ONG Médicos sem Fronteiras afirma que milhares de pessoas foram feridas desde o início da guerra, muitas delas estariam agora em estado crítico. A isso somam-se as dezenas de milhares de pessoas que acudiram aos hospitais para se proteger do conflito. Diante do quadro, França e Itália anunciaram o envio de navios-hospitais da Marinha à costa de Gaza para prover alguma ajuda.

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Esses locais são a única esperança para inúmeros feridos, e um dos poucos refúgios que sobraram para a parcela de civis que não fugiu para o sul de Gaza. Israel, porém, argumenta que essas estruturas são possivelmente também centrais de comando, depósitos de armas e abrigos de reféns do Hamas.

E é por isso que os hospitais - de uma forma raramente antes tão explícita - se tornaram alvos de ataques.

De fato, hospitais foram deliberadamente atacados em conflitos anteriores - na Síria, para citar um exemplo recente. Que os hospitais, porém, tenham deliberadamente sido usados como escudos por uma das partes do conflito, tornando-se, por causa disso, um alvo explícito de guerra do outro lado, é algo novo.

Onde os combates são mais intensos?

Os combates no norte de Gaza ocorrem principalmente em quatro clínicas.

O Al-Shifa é o maior hospital da Faixa de Gaza. Antes de ser invadido por forças israelenses, ele abrigava ao menos 2.500 pessoas, segundo a ONU. No sábado (18/11), centenas de pessoas fugiram dali, seguindo o que o diretor do Al-Shifa disse serem ordens do Exército israelense para evacuar o local - Israel nega ter ordenado tal medida. Os quase 300 que permaneciam no local no dia seguinte, entre funcionários e pacientes, incluindo 31 bebês prematuros, começaram a ser retirados por uma equipe da Organização Mundial de Saúde (OMS).

Israel tem realizado operações militares dentro do Al-Shifa, à procura do centro de operações do Hamas que, segundo diz, se encontra sob o vasto complexo médico. Recentemente, as forças israelenses afirmaram ter encontrado armas e um "quartel central operacional" no local - o Hamas nega.

No domingo (19), as forças armadas israelenses divulgaram o que afirmam ser imagens do circuito interno de segurança do Al-Shifa que mostrariam reféns sendo levados para dentro do hospital no dia 7 de outubro, logo após os ataques do Hamas.

Não muito longe dali fica o Hospital Infantil Rantisi, invadido pelo Exército isralense no início da semana. O porão da unidade abrigaria uma central de comando do Hamas que foi abandonada; alguns reféns também teriam sido mantidos no local. O hospital está fora de operação. Ainda segundo o Exército isralense, os últimos pacientes foram evacuados para "um hospital seguro" - o diretor dos hospitais na Faixa de Gaza, Mohammed Sakut, fala em evacuação forçada, e diz que os pacientes foram deixados "na rua, sem assistência".

Mais ao sul, o hospital Al-Quds, com mais de 100 leitos, teria abrigado até a semana passada até 14 mil pessoas, segundo a ONU. Com os estoques esgotados de combustível, água e alimentos, a instituição teve suas operações encerradas no domingo anterior, segundo a Sociedade do Crescente Vermelho Palestino (braço da Cruz Vermelha na região). Os abrigados foram evacuados para o sul do enclave, e 21 combatentes palestinos foram mortos no entorno do hospital, segundo militares israelenses.

Também no norte de Gaza, em Jabalia, maior assentamento de refugiados do enclave, fica o Hospital Indonésio, financiado em 2015 por Jakarta e com 110 leitos. Ao menos 30 pessoas teriam morrido em bombardeios à clínica, segundo o Hamas. O Exército israelense acredita que o subsolo do hospital também abrigue uma central de comando terrorista, e afirma ter encontrado uma base de lançamento de foguetes próximo dali.

O que diz o direito internacional?

Via de regra, infraestrutura civil - tais como hospitais, escolas, igrejas e instalações de água potável - têm proteção especial à luz do direito internacional e não podem ser atacados. Mas o direito internacional também diz que "em caso de dúvida a respeito de um bem que normalmente se presta a fins civis [...] estar sendo utilizado para contribuir eficazmente para ação militar, será presumido que não está sendo utilizado com tal propósito". Neste caso, esses locais perdem seu status especial de proteção.

Se o Hamas, que é classificado como organização terrorista por Estados Unidos e União Europeia, de fato estiver usando essas estruturas civis como escudo para suas centrais de comando, trata-se de um crime de guerra à luz do direito internacional.

Se um hospital for de fato claramente usado com fins militares, um ataque israelense estaria coberto pelo direito internacional - desde que observados critérios rígidos. "Mesmo que seja o caso, Israel não está livre da obrigação de proteger civis", explica Marc Weller, professor de direito internacional na Universidade de Cambridge.

"Essas pessoas em risco não são escudos humanos voluntários; são civis, que não perdem seu direito a proteção." O uso da violência por parte de Israel precisa ser "direcionado ao Hamas e seus combatentes", segundo Weller. "Isso quer dizer que Israel não pode atacar alvos onde o dano a civis for desproporcionalmente alto em relação ao ganho militar."

Esse é um cálculo que tem que ser refeito constantemente ao longo de uma operação militar, explica Weller. Se por acaso for constatado que os prédios atacados não estão (mais) sendo usados militarmente, os ataques têm que cessar o mais rápido possível.

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