Entenda a decisão de Toffoli que mandou prender 4 réus no caso Boate Kiss
Em mais um capítulo do caso do incêndio na boate Kiss, que em 2013 matou 242 pessoas em Santa Maria (RS), o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), reverteu na segunda-feira (2) a anulação do júri que havia condenado quatro pessoas pela tragédia. O ministro também determinou a prisão imediata dos réus.
Toffoli analisou recursos apresentados pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) e pelo Ministério Público Federal (MPF) para anular decisões da Justiça gaúcha e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que haviam suspendido as condenações.
O procurador-geral de Justiça do Rio Grande do Sul, Alexandre Saltz, elogiou a decisão do ministro do STF. "Hoje é um dia histórico para a Justiça brasileira. O STF acolheu a tese do Ministério Público do Rio Grande do Sul, dizendo que houve dolo eventual, sim, no caso Kiss; manteve a condenação firmada pelo Tribunal do Júri de Porto Alegre; e determinou a prisão dos quatro acusados", afirmou.
Os condenados
Com a decisão de Toffoli, voltaram a valer as condenações dos ex-sócios da boate Elissandro Callegaro Spohr e Mauro Londero Hoffmann; do vocalista da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos; e do produtor musical Luciano Bonilha Leão. As sentenças vão de 18 anos a 22 anos e seis meses de prisão.
Segundo o jornal gaúcho Zero Hora, os advogados de Bonilha Leão, Spohr e Santos confirmaram que seus clientes foram detidos nesta segunda. A defesa de Hoffmann confirmou estar ciente da ordem de prisão, mas até a madrugada desta terça a detenção não havia sido confirmada.
"Todas as defesas foram pegas de surpresa com essa decisão. Nós vamos ainda analisar os próximos passos, no que tange a recursos", disse Jena Severo, advogado de Bonilha Leão, à Zero Hora.
Os quatro réus foram condenados por homicídio e tentativa de homicídio simples com dolo eventual. As sentenças foram anunciadas pelo Tribunal do Júri do Foro Central de Porto Alegre em dezembro de 2021, após dez dias de um julgamento que contou com relatos comoventes de sobreviventes.
Por que as condenações haviam sido anuladas?
As defesas dos acusados haviam conseguido anular as sentenças em instâncias inferiores ao alegarem ter havido erros no processo e no júri que os tornavam nulos.
Entre outros pontos, os advogados afirmaram que o juiz que presidiu o júri havia sido parcial, questionaram a forma de escolha dos jurados e disseram que não houve igualdade de condições entre o Ministério Público e os advogados da defesa.
Em agosto de 2022, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) anulou as condenações e determinou a realização de um novo júri. Entre os motivos para a anulação estavam irregularidades na escolha dos jurados e realização, durante a sessão de julgamento, de uma reunião reservada entre o juiz presidente do júri e os jurados, sem a participação das defesas ou do Ministério Público.
Em setembro de 2023, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou recurso apresentado pelo MP gaúcho e manteve a anulação das condenações. O caso foi então para o STF.
O que argumentou Toffoli
Ao acolher os recursos apresentados pelo MPF e pelo MP-RS, Toffoli considerou que as nulidades apontadas pelos advogados e acolhidas pelo TJ-RS e pelo STJ não foram apresentadas dentro do prazo processual.
O ministro explicou que, de acordo com o entendimento do STF, no procedimento do júri, as alegações devem ser apresentadas imediatamente, na própria sessão de julgamento, o que não aconteceu.
Um novo júri estava previsto para fevereiro deste ano, mas havia sido suspenso por Toffoli até que o STF julgasse os recursos do MPF e do MP-RS.
A tragédia e o papel dos condenados
O incêndio na boate Kiss ocorreu na madrugada de 27 de janeiro de 2013. Além dos 242 mortos, a tragédia deixou 636 feridos. A maioria das vítimas eram estudantes com idades entre 17 e 30 anos que moravam na cidade universitária de Santa Maria.
O incêndio teve início após um artefato pirotécnico ter sido acionado durante a apresentação da banda Gurizada Fandangueira. Ao atingir uma espuma que havia no palco, a queima do material liberou gases tóxicos que mataram por asfixia a maioria das vítimas da tragédia, segundo perícias.
Segundo a denúncia do Ministério Público, os dois sócios da boate, Spohr e Hoffmann, assumiram o risco de uma tragédia ao usarem "em paredes e no teto da boate espuma altamente inflamável e sem indicação técnica de uso".
A denúncia do MP também afirmou que os sócios contrataram o show da Gurizada Fandangueira sabendo que incluía "exibições com fogos de artifício, mantendo a casa noturna superlotada, sem condições de evacuação e segurança contra fatos dessa natureza, bem como equipe de funcionários sem treinamento obrigatório".
Santos, vocalista da banda, era quem portava nas mãos o artefato pirotécnico. Já Bonilha Leão, assistente de palco do grupo, confirmou ter sido o responsável por comprar o material, por acoplá-lo na luva que Santos usava e por acioná-lo durante o show.
O prédio onde ficava a boate foi demolido em julho deste ano e dará lugar a um memorial em homenagem às vítimas da tragédia.
(Com Agência Brasil)
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