Presidente colombiano despreza críticas de Farc em abertura de mesa de paz
O presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, diminuiu nesta sexta-feira a importância das críticas feitas pelos negociadores das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) às políticas de seu governo na abertura do processo de paz e opinou que tiveram "intenções políticas".
Santos falou hoje pela primeira vez em público sobre o discurso do chefe dos negociadores guerrilheiros em Oslo, Luciano Marín Arango, conhecido como "Ivan Márquez", que deixou a impressão de que o processo de paz com as Farc vai ser mais difícil do que se imaginava.
"Não dei muita importância para essas manifestações com intenções políticas", disse em seu programa da Rádio Nacional "En línea con el presidente" (Na linha com o presidente).
Em um longo discurso durante o ato de abertura das negociações de paz, "Ivan Márquez" atribuiu a pobreza e desigualdade de seu país ao modelo de desenvolvimento do governo de Santos.
"A paz não significa o silêncio dos fuzis, mas consiste em transformar a estrutura do Estado e as estruturas econômicas", ressaltou.
Santos respondeu concretamente às críticas sobre a aplicação da Lei de Vítimas e Restituição de Terras, um dos eixos da política social de seu governo, que entrou em vigor em janeiro deste ano.
"Márquez" disse ontem: "a regularização fundiária é uma armadilha, representa a pilhagem legal, os camponeses não têm outro remédio a não ser vender ou arrendar suas terras às transnacionais, e a eles somente interessa a exploração dos recursos minerais e energéticos".
Hoje o presidente respondeu: "quando estes senhores das Farc dizem que esta é uma lei de mentiras, é porque estamos tirando suas bandeiras, é porque eles sabem perfeitamente que isto é algo que tira deles uma de suas bandeiras de propaganda".
O presidente lembrou neste ponto que as Farc - que identificam a distribuição desigual de terras na Colômbia como o motivo que os levou às armas em 1964 - se apropriaram de milhares de hectares.
E depois, em um fórum acadêmico em Bogotá, o presidente enfatizou em que o governo tem limites claros para a negociação.
"Sabemos exatamente o que queremos, sabemos exatamente onde estão as linhas vermelhas, o que podemos ceder, o que não podemos ceder. Tomara que se possa chegar a um resultado porque seria maravilhoso para todo o mundo", disse, ao esclarecer que, em caso de fracasso nas negociações, o governo fez "as coisas de tal forma para que a tentativa de se chegar a paz não custe nada".
Santos se referiu assim às condições nas quais foi colocado este terceiro processo de paz da história da Colômbia: sem concessões de territórios à guerrilha, nem desarmamentos, a fim de evitar os mesmos erros das tentativas anteriores que acabaram fortalecendo as Farc.
Segundo dados do Ministério da Agricultura, há cerca de 8 mil reivindicações de terras de um total de 700 mil hectares por pessoas que se declaram vítimas das Farc.
Precisamente, o problema fundiário na Colômbia será o primeiro a ser abordado pelos negociadores do governo e das Farc em Havana a partir do próximo dia 15 de novembro, segundo um acordo estabelecido no documento assinado em agosto em que se comprometeram com as negociações diretas para o fim do conflito armado.
O próximo encontro entre os negociadores do governo e as Farc acontecerá dez dias antes das negociações oficiais, no dia 5 de novembro, também em Cuba, em uma reunião preparatória, conforme foi anunciado ontem em Oslo.
Fontes ligadas ao processo disseram hoje à Agência Efe que a equipe de delegados governamentais, liderada pelo ex-vice-presidente Humberto de la Calle, partiu hoje da Noruega, mas não se sabe quando vão chegar em Bogotá, pois aparentemente fizeram uma escala em algum ponto da Europa.
Em qualquer caso, segundo afirmou ontem De la Calle, a discrição por sua parte em torno do processo será total, e a opinião pública só terá acesso quando for oportuno.
Enquanto isso, as organizações civis continuam tentando conseguir um lugar na mesa de negociações, como fez hoje a "Ruta Social por la Paz" (Rota Social pela Paz), um movimento recém criado que aglutina os sentimentos de toda a sociedade colombiana, segundo a ex-senadora Piedad Córdoba, uma das porta-vozes do grupo.
Piedad disse que o processo não será legítimo se tiver apenas dois interlocutores. Nesse sentido não descartou que os paramilitares pudessem ser parte das conversas e revelassem "sua verdade", ao mesmo tempo em que acenou para uma possível participação do Exército de Libertação Nacional (ELN), a outra guerrilha colombiana.
"Fizemos um exercício, através da troca de correspondências, para aproximar o ELN da mesa de diálogo, e acreditamos que inclusive já pode haver possíveis aproximações do governo nacional com o ELN e, seguramente, poderemos ter notícias da sua participação em breve", disse.
Embora o ELN reconheça o seu interesse em negociar a paz com o governo, não há, por enquanto, nenhuma confirmação das partes em relação ao assunto.