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Svetogorsk, a cidade russa que se declarou "livre dos gays"

12/03/2017 06h00

Ignacio Ortega.

Moscou, 12 mar (EFE).- Svetogorsk é uma pequena cidade da Rússia na fronteira com a Finlândia que ganhou fama depois que seu prefeito declarou publicamente que, entre seus pouco mais de 15.000 habitantes, não há "nem um só gay".

"Em Svetogorsk não houve, não há e não haverá nem um só gay", afirmou no início de mês um orgulhoso Sergei Davidov, prefeito dessaa cidade situada na região de Leningrado.

Davidov, um coronel do exército russo na reserva, inclusive convidou o maior crítico da diversidade sexual neste país, o deputado Sergei Milonov, para visitar a cidade para comprovar que está no certo.

"Com todo respeito a Milónov, é importante dizer que o deputado dedicou muitos esforços a esse problema, mas não alcançou resultados tão extraordinários", ressaltou.

Milonov é o político que promoveu a adoção da lei contra a propaganda homossexual, símbolo da homofobia em um país onde os gays quase não saíram das catacumbas, muito menos do armário.

O prefeito de Svetogorsk lembrou que nos últimos anos em São Petersburgo, considerada a cidade mais liberal da Rússia, "têm acontecido com frequência passeatas de orgulho gay".

"Você já viu alguma vez uma passeata do orgulho gay em Svetogorsk? Portanto, convidamos Milonov a aprender de nossa experiência e todos aqueles que queiram pôr em dúvida a presença de indivíduos com orientação sexual não tradicional", desafiou.

Tudo começou com a aparição em uma loja local, que se encontra a poucas centenas de metros de uma escola, de balas em forma do órgão sexual masculino, o que a prefeitura considerou inadmissível.

Então, Davidov considerou necessário estudar o tema e declarar que em Svetogorsk, cidade fechada desde os tempos soviéticos por ser fronteiriça com o mundo ocidental, não há gays.

"Não passarão, nem sequer do Ocidente", disse, em referência à vizinha Finlândia.

Ainda que ressaltando que os homossexuais são "livres" para viver onde acharem conveniente, Milonov se mostrou feliz de que haja cidades russas onde não viva gente "com tendência ao vício e ao pecado".

Além disso, defendeu a criação de "condições ideais para o desenvolvimento harmônico e moral do cidadão", o que contribuirá, entre outras coisas, ao "aumento da natalidade".

Os ativistas homossexuais de São Petersburgo não deixaram barato, decidiram rebater a categórica afirmação do prefeito de Svetogorsk e se deslocaram para serem "os primeiros gays" a pisar na cidade.

Inclusive tentaram reunir-se com o prefeito, mas este se negou a recebê-los e finalmente foram detidos, da mesma forma que jornalistas que tentaram entrar na cidade nos últimos dias.

"As declarações do prefeito são um reflexo da situação no resto do país. Na Rússia é o Estado o que promove a homofobia", destacou nesta semana à Agência Efe Alexei Sergueyev, um dos ativistas da Aliança de Heterossexuais e LGBT pela Igualdade de Direitos, que viajou para Svetogorsk.

As coisas começaram mal, já que dois dos ativistas foram retidos logo após chegar em ônibus à cidade, entre eles um conhecido jornalista local, Boris Konakov, que revelou recentemente ter contraído o vírus da aids.

"Prometi que os gays não passariam, então não passarão", reforçou Davidov.

Os demais puderam passear pela cidade e tirar fotos a fim de estimular outros homossexuais a visitar Svetogorsk, e pôr em dúvida a afirmação que é "uma cidade livre de gays".

"Queremos promover o turismo gay em Svetogorsk. Não há outra cidade igual no mapa mundial", disse Sergueyev, que considera que a ironia é uma boa forma de combater a intolerância e a agressividade.

Como para entrar nesta cidade fechada se necessita uma permissão especial ou um convite de um residente local, algo do que careciam os ativistas, estes foram detidos por agentes do Serviço Federal de Segurança (FSB, a antiga KGB).

"Eles nos entregaram uma advertência por escrito, nos levaram à estação de ônibus e nos obrigaram a apagar as imagens de vídeo que não gostaram", detalhou o ativista.

No entanto, Sergueyev acredita que eles cumpriram sua missão, já que mais de 50 jornais russos abordaram a polêmica sobre "a cidade sem gays", um assunto que habitualmente é censurado pelos veículos de comunicação oficiais.

"De quebra, encorajamos as pessoas a saírem do armário, especialmente nas cidades pequenas, onde se conhece todo mundo e os homossexuais têm medo", salientou.

No entanto, após as declarações do prefeito de Svetogorsk, outros dirigentes de cidades da região também expressaram sua ambição de se transformar em capitais da luta contra a diversidade sexual.

Sergueyev reconhece que o povo russo é homofóbico, embora não no sentido estritamente religioso, "como nos Estados Unidos", mas é "otimista", já que as novas gerações são mais livres e estão em permanente contato com o Ocidente através da internet.