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Turquia vira centro do debate sobre política externa nas eleições alemãs

22/09/2017 21h25

Elena Garuz.

Berlim, 22 set (EFE).- A postura autoritária do presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, se transformou em um dos eixos da campanha eleitoral na Alemanha, impondo para as eleições do próximo domingo novos desafios na política internacional além dos que o futuro chanceler terá que enfrentar.

Após o voto britânico a favor do "Brexit" - a saída do Reino Unido da União Europeia (UE) - e a chegada de Donald Trump à Casa Branca, muitos olhares se voltaram para a Alemanha e para a chanceler, Angela Merkel, na busca de estabilidade, mas isso não livrou o país de tensões bilaterais com parceiros estratégicos.

A lista de desentendimentos entre a Turquia e a Alemanha, onde vivem cerca de 3 milhões de cidadãos de origem turca, é extensa desde que o Parlamento alemão reconheceu no ano passado como genocídio o massacre dos armênios cometido pelo império Otomano há mais de um século, algo recebido por Ancara como uma afronta.

As críticas de Berlim às detenções na Turquia de jornalistas, ativistas e opositores - entre eles, vários alemães -, e as acusações de Erdogan à Alemanha de utilizar práticas "nazistas" em suas relações com a Turquia, transformaram Ancara em tema central da campanha.

Tanto Merkel como seu principal adversário na disputa pela Chancelaria, o social democrata Martin Schulz, condenam o autoritarismo na Turquia e defendem que a UE congele ou suspenda as negociações de adesão com esse país, uma postura que ambos têm, com apenas algumas diferenças, em relação à política externa.

Erdogan, por sua vez, pediu aos alemães de origem turca com direito a voto - aproximadamente 720 mil, segundo dados do Escritório Federal de Estatística, pouco mais de 1% do eleitorado - que não votem nem na União Democrata-Cristã (CDU) de Merkel, nem no Partido Social Democrata (SPD) de Schulz, nem nos Verdes, para "dar uma lição aos partidos que estão contra a Turquia".

Além disso, há o medo de uma interferência de Moscou na campanha através de ciberataques e ações de desinformação, como foi denunciado nas eleições dos Estados Unidos.

As relações com o presidente russo, Vladimir Putin, estão estremecidas desde a anexação da Crimeia por parte da Rússia em 2014, ato que foi seguido pela imposição de sanções por parte da UE e dos EUA.

Curiosamente, só se pronunciaram claramente contra essas sanções os extremos do espectro político alemão: o Partido de Esquerda, aglutinador de pós-comunistas e dissidentes do SPD, e o ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD), que defendem estreitar as relações com Moscou.

Os conhecidos como alemães do Volga - descendentes dos alemães que emigraram para a Rússia nos tempos de Catarina, a Grande -, os imigrantes da antiga União Soviética e seus filhos nascidos já na Alemanha representam, com pouco mais de 1,5 milhão de cidadãos com direito a voto, aproximadamente 3% do eleitorado alemão.

Em três eleições regionais, a AfD conseguiu grandes resultados - inclusive de mais de 40% - em circunscrições eleitorais nas quais vivem muitos cidadãos originários da antiga União Soviética.

Segundo analistas políticos, o apoio que a AfD receberá nas eleições gerais virá deste eleitorado, que tradicionalmente vota na CDU.

No entanto, o grande desafio para a Alemanha continua sendo os EUA, após a eleição de Trump como presidente, que "pôs em dúvida as relações na sua forma conhecida até agora", apontou Daniela Schwarzer, diretora do Conselho Alemão de Política Externa (DGAP) ao analisar o contexto internacional antes das eleições.

Da Alemanha se espera, de acordo com o diretor de pesquisa do DGAP, Christian Mölling, que "mostre mais ação onde outros fazem cada vez menos porque estão ocupados consigo mesmos".

Para ele, independentemente de quem será o chanceler, a Alemanha não assumirá sozinha esse papel de liderança e buscará alianças necessárias com outros atores, ao mesmo em tempo que ratificará seu interesse, "precisamente em tempos de 'Brexit', em manter coesa e unir ainda mais a UE".

É provável que o eixo franco-alemão ganhe ainda mais em dinamismo após as eleições, apesar do risco de essa união ser recebida por outros parceiros europeus como um "diretório", o que obrigará a Alemanha a buscar consensos.

Tanto Merkel como Schulz, ex-presidente do Parlamento Europeu, mostram um europeísmo sólido, com a AfD atraindo o voto eurofóbico no espectro oposto.