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Justiça portuguesa gera polêmica ao justificar violência em caso de traição

23/10/2017 14h31

Lisboa, 23 out (EFE).- Uma sentença do Tribunal de Relação do Porto está gerando grande polêmica em Portugal porque utiliza o adultério cometido por uma mulher para justificar a violência doméstica cometida pelo ex-marido e pelo antigo amante.

A decisão judicial - emitida em 11 de outubro, mas só divulgada agora - condena os dois homens a prisão, mas deixa as penas em suspenso, o que foi muito criticado nesta segunda-feira por associações dos direitos das mulheres e por juristas do país.

As críticas são aos argumentos usados para justificar a violência sofrida pela mulher e que citam a Bíblia, leis de 1886 e inclusive povos que castigam o adultério com pena de morte.

"O adultério da mulher é um gravíssimo atentado à honra e dignidade do homem. Existem sociedades em que a mulher adúltera é alvo de apedrejamento até à morte. Na Bíblia, podemos ler que a mulher adúltera deve ser punida com a morte", indica o juiz.

De acordo com Elisabete Brasil, da organização União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), esta sentença é uma mostra da mentalidade "patriarcal, machista e sexista" que ainda existe em parte da sociedade portuguesa.

A advogada apontou que a decisão "legitima a violência doméstica em um marco conceitual que põe em questão a igualdade entre as pessoas", já que defende que "as mulheres devem ter um comportamento diferente do que é visto como normal para os homens".

O caso aconteceu em 2015, quando a mulher foi agredida com uma arma medieval repleta de pregos pelo ex-marido e pelo ex-amante. Antes ela foi sequestrada pelo antigo amante, que exigia reatar a relação e que entrou em contato com o ex-marido para que a confrontassem conjuntamente.

"É quase uma apologia à pena de morte em caso de adultério e responsabiliza às mulheres pela violência que recebem", criticou Elisabete, que lamentou que estes casos aconteçam em Portugal, país que, ao seu ver, leis sobre a violência sexual visto inclusive como "vanguardista" na União Europeia.

Apesar de reconhecer que estas sentenças não são comuns na Justiça portuguesa, ela lembrou que esse não é um caso isolado e outas decisões discriminatórias já foram ditas, como uma na qual se justificava que a sexualidade da mulher perdia importância depois dos 50 anos.