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Afeganistão vive um 2018 com pequenos gestos de paz e muita violência

20/12/2018 22h31

Baber Khan Sahel.

Cabul, 20 dez (EFE).- O Afeganistão viveu seu primeiro cessar-fogo em 17 de anos de conflito em 2018, um ano marcado por níveis de violência que têm se mantido ao longo dos meses, mas encorajado por um encontro entre os talibãs e o representante especial dos Estados Unidos para os esforços de paz.

Depois de três anos de atrasos, o país também realizou as eleições parlamentares que estavam pendentes e sofreu com uma grave seca que assolou dois terços do país, afetando 1,4 milhão de pessoas e deixando dezenas de milhares de deslocados.

O governo afegão começou o ano oferecendo aos talibãs um diálogo de paz "sem precondições", além de reconhecimento político, passaportes, a realocação de suas famílias e a libertação de seus prisioneiros, um convite que os insurgentes rejeitaram, insistindo em uma negociação direta com os Estados Unidos.

No entanto, em um gesto sem precedentes desde a invasão americana em 2001, os talibãs anunciaram em junho um cessar-fogo unilateral de três dias, que coincidiu com outro decretado pelo governo afegão e que derivou em abraços insólitos entre insurgentes e soldados.

A esperança para um processo de paz aumentou ainda mais no final de ano, depois que o representante especial dos Estados Unidos para os esforços de paz, Zalmay Khalilzad, manteve duas rodadas de diálogo com representantes do escritório político do talibã no Catar.

O presidente afegão, Ashraf Ghani, deu os últimos retoques a 11 meses de avanços pequenos, mas significativos, com o anúncio no fim de novembro em Genebra da formação de uma equipe negociadora de 12 membros para empreender possíveis conversas com a organização do mulá Hibatullah.

No entanto, esses gestos não deixaram nenhuma marca no plano militar.

Além de expandir seu controle nas zonas rurais, os talibãs conseguiram em maio tomar várias áreas da capital provincial de Farah (oeste) e, apenas três meses mais tarde, assumiram o controle de boa parte de Ghazni (sul).

A breve ocupação dessas cidades, das quais foram expulsos por bombardeios dos EUA e ofensivas das tropas afegãs, concluiu com o corte de serviços básicos, a destruição da infraestrutura e cerca de mil baixas, a maioria delas entre o grupo insurgente.

As autoridades já não revelam as baixas entre suas forças, mas segundo o Inspetor Especial Geral para a Reconstrução do Afeganistão (SIGAR, na sigla em inglês) do Congresso dos EUA, entre maio e outubro houve um registro recorde delas em comparação com anos anteriores.

A pressão insurgente no campo de batalha também se traduziu em uma queda no território controlado por governo central, que caiu para apenas 55% em 2018, o número mais baixo desde que o SIGAR contabilizou esse dado pela primeira vez em 2015.

Entre as ações talibãs se destacam o ataque que em outubro causou a morte em Kandahar (sul) do chefe da polícia provincial e reconhecido comandante anti-talibã, o general Abdul Raziq; o chefe da inteligência regional, Mumin Hussainkhil, e o jornalista, Muhammad Salim Angar, da emissora "Kandahar State TV".

Um insurgente que trabalhava como guarda-costas do governador de Kandahar abriu fogo contra várias autoridades locais e da Otan em um complexo governamental, em uma ação na qual também ficaram feridas seis pessoas, enquanto o comandante aliado, o tenente-general Austin "Scott" Miller, saiu ileso.

Em geral, as baixas civis pelo conflito se estabilizaram em 8.050 (2.798 mortos e 5.252 feridos), transformando 2018 no ano mais violento da última década, segundo dados da missão da ONU no Afeganistão (Unama).

Um quarto dessas baixas foi causado pelo grupo jihadista Estado Islâmico (EI), enquanto em 2017 esse número foi de apenas 6%, o que consolida o seu papel em um ano no qual realizaram atentados contra um grande número de eventos civis e locais de culto, especialmente da minoria xiita hazara.

Fora do conflito, o Afeganistão sofreu este ano uma forte seca provocada por um déficit de 70% nas chuvas, o que afetou 1,4 milhão de pessoas e deixou 223.100 deslocados em um país onde a metade da população vive abaixo da linha de pobreza.

No lado positivo, 4 milhões de afegãos foram convocados às urnas nas eleições parlamentares realizadas em outubro para escolher 250 legisladores entre 2.500 candidatos, em um episódio que marca um aumento da maturidade democrática no país.

Finalmente, em outro ponto positivo, aconteceu uma queda na produção de ópio no país que é o maior produtor de papoula do mundo.

Este ano, o cultivo de papoula caiu 20% e a produção de ópio sofreu uma redução de 29% devido à seca e a uma queda nos preços da droga na região, segundo dados da ONU e do governo afegão. EFE