Topo

Herdeiro de profissão familiar, paquistanês diz não ter remorso por matar

18/01/2019 10h03

Jaime León.

Lahore (Paquistão), 18 jan (EFE).- Filho, neto e bisneto de carrascos, Sabir Masih, de 34 anos, já executou cerca de 300 prisioneiros, um trabalho que para ele é comum e que não gera remorso, mesmo em um momento no qual o Paquistão é considerado um dos países que mais aplicam a pena de morte no mundo todo.

"É uma rotina para mim e não me arrependo de ter enforcado tanta gente. Eu só sigo ordens", afirmou, com semblante tranquilo, o homem de traços marcantes e uma gagueira notável.

A primeira execução aconteceu em julho de 2006, quando ele tinha 22 anos. O réu em questão tinha sido condenado por matar uma pessoa durante um assalto a banco, e o pai de Sabir, que deveria cumprir a determinação, estava trabalhando em um caso em outra cidade.

"O preso estava recitando versos do Corão. O superintendente fez um sinal para mim, puxei a alavanca e o condenado ficou pendurado. Não fiquei com medo, porque já tinha visto uma execução antes", lembrou ele.

Em oito meses, ele fez mais de 100 execuções. A contagem aumentou até 2008, quando o governo impôs uma suspensão da pena de morte. Durante os dois anos em que a decisão vigorou, Sabir continuou recebendo como funcionário público do sistema penitenciário da província do Punjab, mas sem executar ninguém.

Em 16 de dezembro de 2014, porém, um grupo de talibãs matou 125 estudantes em um ataque a uma escola na cidade de Peshawar, o que fez o então primeiro-ministro Nawaz Sharif revogar a suspensão da pena para casos de terrorismo e, três meses depois, para todos os casos. Três dias depois do ataque, Sabir enforcou os dois primeiros condenados, e desde então foram cerca de 100 execuções.

O Paquistão executou 506 pessoas desde o fim da moratória e se tornou o quarto país que mais aplica essa condenação, atrás apenas de Arábia Saudita, Irã e Iraque.

A última execução de Sabir foi a de Imran Ali, condenado por estuprar e assassinar uma menina de sete anos, um caso polêmico que gerou protestos violentos para pedir mais segurança e uma ação rápida contra o criminoso, que acabou morto em outubro.

"Ele ficou calado. O superintendente disse que ele só queria pedir perdão ao pai da Zainab (Ansari), mas permaneceu em silêncio", contou o carrasco.

Grupos de direitos humanos, como a Anistia Internacional, consideram que o Paquistão "viola o direito e as normas internacionais" na aplicação das penas à forca. Organizações locais, por sua vez, criticam os sistemas policial e jurídico pela pouca eficácia, o que acarreta sentenças injustas.

Nada disso abala Sabir. Para ele, a pena de morte ajuda a reduzir os crimes - mesmo que pesquisas evidenciem o contrário - e faz parte de uma tradição da família.

"Gosto da profissão porque é a profissão da minha família. Sou feliz com o que faço e não me sinto incomodado", afirmou, com orgulho.

A família faz esse trabalho há seis gerações. O avô do pai de Sabir já fazia isso, desde os tempos em que o Paquistão era parte da Índia britânica. Seu tio-avô Tara Masih foi o encarregado de executar o ex-primeiro-ministro Zulfikar Ali Bhutto, em 1977, após ser deposto em um golpe de Estado e condenado por um tribunal.

Mas a ineficiência do judiciário paquistanês ficou clara em 2016, quando a Suprema Corte absolveu os irmãos Ghulam Qadir e Ghulam Sarwar de um assassinato, para depois descobrir que os dois tinham sido executados meses antes. Sabir tinha sido o responsável pelos enforcamentos.

"Se um inocente é enforcado não é culpa minha, é culpa do juiz que determinou a execução", argumentou, com parcimônia.

Calmo, o momento no qual Masih mais se empolga na fala é ao explicar, com gestos, como acontecem as execução, passo a passo: da corda no pescoço até a dica dada sobre não colocar a língua para fora para não cortá-la durante o processo.

Masih já viu todo tipo de reação nos instantes finais, desde presos que choram, até os que ficam em silêncio, passando pelos que escolhem rezar. Alguns inclusive parecem ter orgulho de morrer assim.

"Pessoas de grupos terroristas e extremistas gritam frases como " Allahu Akbar" (Deus é grande) e dizem que venceram. Para eles, é uma vitória e não uma derrota", revelou. EFE