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Levar o cachorro na rua se torna um novo dilema no Irã

03/02/2019 06h05

Marina Villén.

Teerã, 3 fev (EFE).- Embora, de acordo com o islamismo, o cachorro seja um animal impuro, começava a ser habitual ver, em certas regiões de Teerã, pessoas passeando com os seus animais de estimação pela rua, um costume que as autoridades agora querem eliminar.

O chefe da polícia de Teerã, general Hossein Rahimi, anunciou esta semana que eles obtiveram permissão do Ministério Público da capital para "tomar medidas contra pessoas que venham a passear com seus cachorros em lugares públicos".

Rahimi se justificou, em declarações à imprensa oficial, dizendo que os cachorros causam medo em algumas pessoas e que os espaços públicos "não são lugar" para estes animais.

Também não será permitido transportar cães em carros. De acordo com o chefe da polícia de Teerã, os agentes vão monitorar e agir "seriamente" para impedir que as normas sejam violadas.

O melhor amigo do homem para alguns, sempre foi visto com maus olhos pelas autoridades do Irã, da mesma forma que ocorre em outros países islâmicos da região.

Trata-se de uma regra básica para o islã, que considera que o contato com o animal deixa o muçulmano impuro e o impede de completar os seus ritos religiosos.

A saliva e o pelo são os que mais "sujam" às pessoas e fazem com que a oração "não seja válida", na opinião do líder supremo do Irã, Ali Khamenei.

O falecido aiatolá Ruhollah Khomeini, fundador da República Islâmica, disse inclusive, nos anos 80, que se uma terra pisada ou urinada por um cachorro fosse usada depois para a construção, esse edifício já não seria puro.

Por isso, embora não existissem leis específicas que o proibissem, tradicionalmente não era comum alguém ter um cachorro como animal de estimação no Irã e, muito menos, passear come ele em espaços públicos.

Maral tem um cão de porte pequeno, mas só deixa o animal andar pelo quintal e pelo terraço de casa para evitar conflitos.

"Por medo, eu não o levo na rua. Acho que alguns vizinhos podem de incomodar ou a polícia pode tirá-lo de mim, alegando que não tenho direito de andar com ele", disse à Agência Efe.

A arquiteta, de 30 anos, contou que até agora não existia uma lei que proibisse, mas, como na prática poderia ter problemas, ela nunca quis "arriscar a vida de Nabat".

Com o recente anúncio da polícia, ela disse que a situação pode piorar e que as restrições tendem a ser aplicadas com muito mais rigidez.

Em Teerã, geralmente os donos são de classes média e alta e adotaram nos últimos anos a moda ocidental de ter animais de estimação.

Behrang, especialista em Informática, há quatro anos sai todas as noites para passear com o seu cachorro na rua ou em um parque perto de casa. Ele disse nunca ter tido problemas com a polícia, mas afirmou que passou a notar a rejeição de algumas pessoas.

"Às vezes, quando estou na rua passeando com ele, vejo gente que começa a andar mais rápido ou muda de calçada. Isto me chateia porque não é a minha intenção incomodar os outros", acrescentou.

Problemas com vizinhos fizeram com que algumas pessoas deixassem seus animais de estimação nos poucos abrigos que existem e que costumavam acolher cachorros de rua em muito mau estado. Agora, eles estão lotados diante da negligência das autoridades.

Para apoiar a nova legislação, a agência de notícias "Fars" lançou um vídeo afirmando que outros países também têm certas restrições sobre os cães e exibiu imagens de um cachorro mordendo uma criança na região nordeste de Teerã.

Este exemplo foi aproveitado pelos internautas para ironizar a decisão. Uma das brincadeiras nas redes sociais indicava que "com a desculpa de que um cachorro mordeu uma pessoa, proibiram os passeios em lugares públicos e nos carros".

A publicação, em tom irreverente, continuava dizendo que um "maddah" (cantor religioso) certa vez saiu atirando e questionava, com sarcasmo: "Não deveriam proibir o trânsito dos 'maddah' na cidade?". EFE