Em meio à crise, barbearias de Caracas se mudam para calçadas
Gonzalo Domínguez Loeda.
Caracas, 15 fev (EFE).- Debaixo de pontes, em cruzamentos de ruas ou em plena calçada, barbeiros e cabeleireiros de Caracas improvisam locais de trabalho para atender clientes e driblar a crise vivida na Venezuela.
A clientela é atendida à luz do sol ou à sombra de uma árvore. Alguns profissionais, como Franklin, montam uma mesa dobrável em frente a uma desgastada cadeira.
Já Alberto ousou adaptar, embaixo do viaduto das Forças Armadas, um improvisado salão de beleza no qual não faltam espelhos, bancos de espera e mesmo um sistema de som para tocar músicas. Ele contou ter encomendado um grafite, em um dos pilares, que mostra Simón Bolívar a cavalo.
O grafite do onipresente Bolívar é inspirado na estátua mais famosa de Caracas, que fica a apenas 200 metros da barbearia improvisada. A arte de rua também "serve como referência para pessoas que querem saber onde fica a praça", de acordo com o barbeiro.
Sem perder o sorriso em nenhum momento, Alberto diz que se especializou em "fazer desenhos" nos cabelos, motivo que mais o faz ganhar clientes.
"Às vezes levo meia hora ou 15 minutos, mas é preciso dedicar um bom tempo", comentou.
A barbearia tornou-se também um oásis de calmaria em meio à poluição das ruas próximas e ao tenso ambiente político que parece tomar conta de toda a Venezuela.
Algum dos pedestres para e pergunta quanto custa o corte. "1.500 em dinheiro ou 2.000 no cartão", responde Alberto citando o preço em bolívares soberanos - cerca de 50 centavos de dólar.
O preço é notavelmente inferior ao cobrado em qualquer estabelecimento convencional, no qual os funcionários devem pagar o aluguel da poltrona ou dar uma porcentagem do lucro ao dono.
"A maioria das pessoas agora prefere trabalhar por conta própria, então decidi fazer o mesmo. Encontrar um lugar está difícil, é muito caro pagar a taxa da cadeira", afirmou Franklin à Efe em seu salão de rua, não muito distante do de Alberto.
Franklin acomoda uma mesa simples embaixo de uma árvore em uma esquina de ruas, e nela limpa o material de trabalho enquanto espera a chegada de clientes, que logo começam a aparecer. Na região há vários edifícios construídos pelos governos chavistas, e seus moradores são defensores do presidente Nicolás Maduro.
Entre eles não faltam mulheres às quais oferecer serviços como corte de cabelo - "devem chegar com eles lavados", esclarece Franklin - e de design de sobrancelhas.
"Se não trabalhar, meus filhos não comem", afirmou, enquanto cortava o cabelo de um cliente.
O cliente em questão é um dos poucos taxistas que percorrem a cidade e teve que parar para que o motor de seu carro esfriasse. Aproveitando o tempo de espera e a sombra, ficou sob as mãos de Franklin, que passava a máquina em seus poucos fios de cabelo.
Com os aparelhos ligados a postes de luz ou outros pontos de energia elétrica de rua, Franklin também conversava com seu vizinho Howard, que aos 19 anos aprendeu o ofício com ele e agora oferece seus serviços em outra esquina.
"A relação direta com o cliente é mais agradável", comentou Franklin, voltou a trabalhar na rua recentemente, após tentar a sorte em um estabelecimento no qual "não podia conversar com muita gente".
"Na rua passam mulheres, e você pode elogiá-las", emendou Howard, ao lado de uma mulher alguns anos mais velha e cuja feição não escondeu o constrangimento pelo comentário.
Franklin olhou ao redor, sorriu com malícia e voltou a se concentrar no cliente. A fila aumentava, e era preciso acelerar o ritmo para garantir o pão de cada dia. EFE
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