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Direitos humanos ficam de fora da agenda da cúpula entre Kim e Trump

27/02/2019 17h55

Andrés Sánchez Braun.

Hanói, 27 fev (EFE).- Diversas vozes estão há semanas exigindo que seja incluído na agenda da segunda cúpula entre Estados Unidos e Coreia do Norte, que começou nesta quarta-feira, um assunto que deve ser mais uma vez o grande ausente: a sistemática violação dos direitos básicos dos norte-coreanos do regime.

A primeira reunião entre o líder norte-coreano, Kim Jong-un, e o presidente dos EUA, Donald Trump, realizada no ano passado em Singapura, deixou de fora a lamentável situação dos direitos humanos no país asiático, o que levou diversas organizações e ativistas a clamar aos céus.

Esta situação provavelmente voltará a se repetir na cúpula de Hanói, na qual a prioridade de ambos os países continua sendo melhorar laços e estabelecer os fundamentos para um processo de desnuclearização do regime de Pyongyang.

"Um país que não respeita os direitos do seu próprio povo não respeitará os dos seus vizinhos. Kim Jong-un viola os direitos da sua própria população, por que ele iria falar sobre o desmantelamento das suas armas nucleares de maneira sincera com o presidente Trump?", indagava um grupo conservador sul-coreano que se manifestou em Seul.

Por sua vez, associações de direitos humanos como Human Rights Watch (HRW) falaram em um tom mais conciliador, mas nem por isso menos contundente.

"A Coreia do Norte é possivelmente o pior governo do mundo hoje em dia no que se refere a abusos dos direitos humanos, por isso qualquer diálogo com Kim Jong-un não deveria deixar o tema dos direitos fora da mesa", afirmou nesta semana Phil Robertson, em comunicado o vice-diretor para a Ásia da HRW.

Robertson voltou a denunciar o uso generalizado "do trabalho forçado e infantil, da supressão sistemática da livre expressão e da sociedade civil, e dos gulags que retêm dezenas de milhares de pessoas em áreas montanhosas".

Mas antes de tudo, defendeu que a única maneira de medir se a Coreia do Norte está disposta a abrir portas para a mudança para acabar sendo reconhecida como membro de pleno direito da comunidade internacional é incluir os direitos humanos na agenda, e construir assim um diálogo bilateral "sustentado e profundo".

Em janeiro, o relator da ONU para a situação dos direitos humanos na Coreia do Norte, Tomás Ojea Quintana, se pronunciou da mesma maneira em Seul e pediu à comunidade internacional que não ignore a melhoria de direitos básicos dos norte-coreanos durante o atual processo de diálogo e aproximação com o regime.

Quintana conta com as novas informações que continuamente coleta entrevistando desertores norte-coreanos e que confirmam o que aponta um dilacerador relatório da ONU de 2014.

Este texto revelava crimes contra a humanidade como "extermínio, assassinato, escravidão, desaparições, execuções sumárias, torturas, violência sexual, abortos forçados, privação de alimentos, deslocamento forçado de populações e perseguição por motivos políticos, religiosos e de gênero".

O relator destacou que assinar acordos de paz ou de normalização de relações com Pyongyang sem incluir compromissos na melhoria dos direitos humanos beneficiará todas as partes, menos a mais indefesa e necessitada, a população norte-coreana, além de legitimar de fato os abusos do regime.

Mas basta ver a reação de Pyongyang aos comentários de Quintana ou a um demolidor relatório da HRW de 2018 que documenta como nunca antes foi feito a violência sexual que as norte-coreanas sofrem diariamente, para entender que o regime não tem a mínima intenção de falar sobre o que tacha de "mentiras" para boicotar o atual diálogo.

Muitos analistas afirmam que a prioridade número um para o regime continua sendo garantir sua sobrevivência e estabilidade, ou seja, perpetuar o controle absoluto sobre o país mantendo as fronteiras fechadas, e a população completamente subjugada e extremamente isolada do exterior.

Se for assim, tudo indica que os norte-coreanos voltarão a ser os grandes esquecidos em uma cúpula entre Coreia do Norte e EUA, e a que a reunião acabará sendo outra oportunidade histórica desperdiçada para mudar a deplorável situação em que vivem. EFE