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Justiça decide que Holanda tem responsabilidade no massacre de Srebrenica

19/07/2019 13h22

Imane Rachidi.

Haia, 19 jul (EFE).- Depois de anos de batalha judicial entre "As Mães de Srebrenica" e o Estado da Holanda, o Tribunal Supremo do país decidiu nesta sexta-feira que o país - que enviou seus boinas azuis para proteger o enclave - é responsável pela morte de 350 homens muçulmanos durante o genocídio de julho de 1995.

A máxima instância judicial holandesa considerou que não se pode culpar o Estado por ser, em parte, responsável de todo o genocídio de Srebrenica - onde morreram mais de 8 mil homens muçulmanos - porque os boinas azuis da base de Dutchbat não podiam evitar a queda deste enclave nas mãos das forças servo-bósnias.

No entanto, as forças holandesas deveriam ter oferecido aos 350 homens muçulmanos bósnios (de um grupo de mais de 5 mil pessoas) que recorreram à sua base "a oportunidade de se refugiar" dentro do complexo, ao invés de forçá-los a marchar para os ônibus que transportavam os evacuados sob responsabilidade das Nações Unidas.

Segundo detalhou o porta-voz do Tribunal Supremo da Holanda, Toon Heisterkamp, uma das razões para calcular esse número é que os refugiados que estavam ficando no complexo "iam ser descobertos pelos servo-bósnios quando inspecionaram a base e os deportaram, porque as chances de a comunidade internacional conseguir evitar isso eram muito pequenas".

Na sentença, os juízes explicam que os servo-bósnios tinham "todos os meios para procurar e prender os muçulmanos", mas as forças holandesas deviam ter oferecido a opção de se refugiar nessa base porque estavam cientes de que os homens corriam "perigo real de serem maltratados e assassinados".

No entanto, ressalta que - ao obrigá-los a se somar às evacuações e se entregarem aos servo-bósnios, que os detiveram sob a desculpa de investigar se fizeram algo ilegal - os soldados holandeses os privaram da oportunidade "pequena, mas não desprezável", de se manter fora de perigo.

Depois da detenção dos 350 homens, o criminoso de guerra Ratko Mladic - que hoje cumpre prisão perpétua no presídio internacional da Haia pelo genocídio de Srebrenica - ordenou a sua execução.

O Tribunal Supremo ressalta que ter os servo-bósnios supervisionando a evacuação de cerca de 25 mil pessoas não foi ilegal e lembra que o Dutchbat ajudou mulheres, crianças e idosos a escapar de forma segura, embora "de nenhuma maneira teria conseguido evitar que os sérvios capturassem os homens e os matassem".

O advogado das vítimas, Simon van der Sluijs, declarou à Agência Efe que é "uma lástima que a responsabilidade tenha sido limitada só a 10% do prejuízo provocado", porque as mães, que perderam maridos e filhos, "sofreram não só pelas ações dos servo-bósnios, mas também porque não foram protegidos pelo Dutchbat".

As denunciantes, conhecidas como "As Mães de Srebrenica", culpavam Haia por todas as mortes do genocídio, mas o Tribunal Supremo limitou a sentença aos 350 homens que estavam na base em 13 de julho de 1995.

Para Kada Hotic, que perdeu o marido, seus filhos e 50 familiares mais nesse massacre, a decisão desta sexta-feira "mostra finalmente que (o Estado holandês) aceitou alguma responsabilidade" no ocorrido, mas denunciou que "só reconhece 10% da vida de cada homem morto naquele dia".

"Estávamos protegidos pela ONU. Srebrenica e Zepa eram as zonas protegidas. Nessas duas localidades havia cerca de 60 mil pessoas. Não tínhamos armas para enfrentar o inimigo e não nos protegeram. Nós sofremos o genocídio sob a bandeira da ONU, a sua bandeira, e agora dizem que não são responsáveis", acrescentou Hotic em entrevista concedida à Efe em frente ao Tribunal Supremo na Haia.

Em nome das "Mães de Srebrenica", ela ressaltou que as vítimas têm "o direito de que sejam reconhecidos 100% da responsabilidade dos que cometeram e permitiram o genocídio fosse cometido", e advertiu que esta guerra judicial não termina com o Supremo, pois irão "a um tribunal maior para exigir justiça".

Em comparação com sentenças anteriores, a decisão desta sexta-feira reduziu em 20% a responsabilidade do Estado holandês no ocorrido. Um tribunal local de Haia opinou em 2014 que a Holanda era parcialmente responsável por 30% daquelas mortes, uma sentença confirmada em 2017 por uma corte de apelação. EFE