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Kamala Harris suaviza mensagem e quer EUA "porto seguro" para migrantes

11/06/2021 06h29

Lucía Leal.

Washington, 10 jun (EFE).- A vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, suavizou o duro recado que havia dado a potenciais migrantes da América Central durante sua viagem a Guatemala e México no início da semana, quando pediu que "não venham" a seu país pela fronteira sul de forma ilegal.

Nesta quinta-feira, em entrevista exclusiva à Agência Efe, ela afirmou estar "comprometida" em garantir que seu país seja um "porto seguro" para os solicitantes de asilo.

Kamala Harris também defendeu que seu país não está "ignorando" Honduras e El Salvador e revelou que, durante suas reuniões na Guatemala, pediu que as ONGs e a imprensa do país sejam autorizados a atuar sem impedimentos.

Confira a entrevista:.

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Agência Efe: Gostaria de começar perguntando sobre a mensagem que a senhora enviou aos centro-americanos que estão considerando emigrar aos EUA: "Não venham. Se chegarem à fronteira, não poderão entrar". A senhora recebeu críticas de seu próprio partido, e segundo as legislações americana e internacional, os migrantes que chegam à fronteira têm o direito de pedir asilo. O que diz àqueles que estão fugindo por correr risco de morte ou têm outras razões legítimas para buscar asilo? Também diz "não venham"?

Kamala Harris: "Não. Deixe-me ser muito clara. Estou empenhada em garantir que os Estados Unidos proporcionem um porto seguro para aqueles que buscam asilo. Ponto.

Efe: A senhora também recebeu críticas de especialistas que acreditam que o governo americano não está dando proteção humanitária suficiente para as pessoas vulneráveis no Triângulo Norte, nem está criando vias legais suficientes para que elas migrem desses países para os Estados Unidos. Qual é sua resposta?

Kamala: Deixamos claro que temos que expandir os caminhos da migração legal, e muito desse trabalho será feito através do Congresso dos Estados Unidos, por isso os estamos pressionando a fazer isso. Estamos fazendo isso enquanto reconstruímos nosso sistema de imigração, que se deteriorou no último governo (de Donald Trump), mas também temos que abordar as causas profundas da migração, e é por isso que viajei para Guatemala e México (...), porque essas questões são sobre a fome na região, o impacto dos furacões ou o impacto da covid-19.

SEM VISITAS A HONDURAS EL SALVADOR.

Efe: Sua missão se concentra nos três países do Triângulo Norte, mas nesta viagem a senhora visitou apenas um, deixando Honduras e El Salvador fora do roteiro. Existem acusações de corrupção contra os presidentes desses países, e até de vínculos com o tráfico de drogas, no caso de Honduras. Essas acusações tornam esses países mais difíceis de lidar, e eles desempenharam um papel na sua decisão de não visitá-los?

Kamala: Fui para a Guatemala porque esse é um dos principais lugares de onde estamos vendo a migração, mas nosso governo tem trabalhado nos três países. Portanto, não é que estejamos ignorando os problemas em El Salvador e Honduras, estamos lidando com eles. O governo dos Estados Unidos está engajado e continua engajado com os governos de El Salvador e Honduras, particularmente porque nos preocupamos com o povo desses dois países.

Efe: Mas a senhora pretende falar diretamente com os líderes de Honduras e El Salvador e pretende visitar esses países neste ano?

Kamala: Como eu disse, estamos nos engajando com esses dois países, já estamos nos engajando com eles em um nível muito alto.

Efe: Mas a senhora não acha que também é necessário se comunicar com os presidentes desses países para cumprir sua missão, ou isso é muito problemático por causa das alegações de corrupção?

Kamala: Penso que é importante que nos comuniquemos em um alto nível. Por exemplo, nosso secretário de Estado (Antony Blinken) se comunicou com eles, e esse é um dos níveis mais altos que existem. Todos (na equipe de segurança nacional) estão lidando com parte disso, mas não há nenhuma região nesses três países que tenhamos ignorado.

"PREOCUPAÇÃO" COM SOCIEDADE CIVIL NA GUATEMALA.

Efe: Parte de sua estratégia é trabalhar mais com a sociedade civil e o setor privado, mas na Guatemala, por exemplo, há uma lei que acaba de ser aprovada e que pode ameaçar a sobrevivência de muitas ONGs. E o presidente do México advertiu os Estados Unidos para que não financie algumas organizações (como Artículo 19 e Mexicanos contra a Corrupção e a Impunidade). Como os Estados Unidos podem garantir que estão fortalecendo a sociedade civil se alguns governos da região estão tentando limitar suas atividades?

Kamala: Deixe-me dizer que levantei essa questão, porque é uma preocupação concreta que tenho. É uma questão que me preocupa profundamente, porque queremos ter certeza de que existe independência: um judiciário independente, uma imprensa independente, e que as organizações sem fins lucrativos, as ONGs, possam fazer seu trabalho sem interferências. Deixei isso bem claro. E devo dizer que fui muito franca com o presidente (da Guatemala, Alejandro) Giammattei e o presidente (do México, Andrés Manuel) López Obrador sobre as preocupações que tenho com a corrupção e a impunidade, e fui muito direta com cada um deles sobre essas preocupações.

(Nota da edição: após a entrevista, a porta-voz de Kamala Harris, Symone Sanders, disse à Efe que a vice-presidente apenas "se referia a suas reuniões na Guatemala", e não no México, quando falou que as ONGs precisam "fazer seu trabalho sem interferências").

Efe: E como eles reagiram quando lhes disse isso?

Kamala: Acho que eles apreciaram minha franqueza. E esta viagem foi mais para deixar claro quais são nossas prioridades, e essa é uma das minhas principais prioridades. Se vamos ter um impacto real na abordagem das causas fundamentais - e isso inclui minha tentativa de envolver o setor privado, as organizações sem fins lucrativos, as fundações e os filantropos, e conseguir que as agências do governo federal dos EUA façam mais trabalho sobre isso - temos que abordar os problemas de corrupção e impunidade.

E em geral, um dos outros temas da minha viagem tem sido reconhecer que estamos interligados, que nosso mundo é interdependente e que as coisas que acontecem naquela região afetam os Estados Unidos. E por muitas razões, inclusive por isso, temos uma preocupação que manifestei quando lá estive.

PERSPECTIVA DE GÊNERO.

Efe: A senhora se certificou de incluir uma perspectiva de gênero em sua missão, e nesta viagem se encontrou com mulheres empresárias tanto na Guatemala como no México. Como primeira mulher a ser vice-presidente dos Estados Unidos, por que acha importante colocar as mulheres no centro das soluções, e como pode conseguir que esse tipo de perspectiva de gênero deixe de ser vista como secundária ou sem importância?

Kamala: Ao longo de minha carreira, uma de minhas prioridades tem sido me concentrar nas mulheres e nas meninas, não apenas garantindo que sejam protegidas, mas que sua voz seja ouvida nos debates, de uma maneira poderosa. Portanto, sim, foi algo deliberado. Em ambos os países, eu quis enfatizar as necessidades das mulheres e das meninas: na Guatemala (me encontrei com mulheres que são), agricultoras ou empreendedoras; no México (o grupo incluía), líderes sindicais, e falamos sobre muitos assuntos.

E há também a questão da violência: falamos da violência em toda a região, em muitos dos países, mas vamos também enfatizar a violência particular contra mulheres e crianças. Relaciono isso com o trabalho que realizei, reconhecendo que quando as mulheres têm independência econômica e poder econômico, são mais capazes de se libertar de situações abusivas e de se proteger. Ah, e na Guatemala lancei uma iniciativa de US$ 40 milhões para capacitar as mulheres jovens.

Efe: No México, a senhora disse que falou com o presidente López Obrador sobre a necessidade de repensar as restrições de viagem. Podemos esperar que a fronteira com o México seja aberta novamente para viagens não essenciais no final deste verão (no hemisfério norte), graças ao programa de vacinação daquele país?.

Kamala: Isso é uma prioridade, temos que abordar em algum momento, remover as restrições de viagem. Vendo que, pelo menos nos Estados Unidos, estamos nos aproximando de trazer a pandemia sob algum tipo de controle, o que fizemos foi criar um grupo de trabalho de alto nível, e trabalharemos com esses outros países para trabalhar os detalhes de como minimizar e levantar as restrições de viagem.