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Violência e conflitos marcam Dia Internacional dos Povos Indígenas no México

09/08/2022 22h35

Mitzi Fuentes e Daniel Sánchez.

Tuxtla Gutiérrez/Hermosillo (México), 9 ago (EFE).- Violência, deslocamento forçado, conflitos ambientais e atritos com o governo marcaram o Dia Internacional dos Povos Indígenas nesta terça-feira no México, onde mais de 23 milhões de pessoas se reconhecem como sendo descendente de povos originários, um dos números mais altos do continente americano.

De sul a norte, onde vivem 68 povos indígenas reconhecidos com sua própria língua, os habitantes nativos enfrentam a proliferação de grupos armados, principalmente em Chiapas, o estado do sudeste com a maior população indígena do país e onde o deslocamento interno triplicou desde 2021 devido à violência.

É o caso de Juan Santis Méndez, um indígena tzotzil que fugiu de sua comunidade devido ao confronto entre civis chamados "Los Machetes" e o grupo armado do crime organizado "Los Herrera", em 8 de julho de 2021, no município de Pantelhó.

Um ano e 20 dias após o ocorrido, ele se refugia em San Cristóbal de Las Casas com outros 200 indígenas, que pedem a proteção do governo local, reparação dos danos, restituição de terras e indenização.

"Tivemos medo, eles vieram à minha comunidade e atiraram bombas e balas, tememos pela vida das crianças, por isso fugimos para as montanhas, hoje para voltar eles nos pedem uma multa de 50 mil pesos (cerca de US$ 2,5 mil) que não temos", disse ele à Agência Efe.

História semelhante é a de Carmela Gómez Pérez, uma indígena tzotzil e mãe de quatro filhos de Pantelhó, que afirmou não estar bem porque está preocupada com a perda de seu projeto de vida e de suas ferramentas de trabalho, e também sente que perdeu sua identidade porque as roupas que ele usa não são de sua cultura.

"Invadiram a minha casa, queimaram, até a documentação dos meus filhos, eu os ando (tenho) sem documentos e não consigo matriculá-los na escola", disse a mulher à Efe ao relembrar o deslocamento forçado que sofreu em julho de 2021.

CONFLITO SEM FRONTEIRAS.

A violência no sul se repete no norte, como no estado fronteiriço de Sonora, onde a investida do crime organizado e a ameaça aos seus recursos naturais, principalmente a água, são os principais conflitos dos povos originários, muitos deles binacionais, porque compartilham terras com os Estados Unidos.

Alejandro Aguilar Zeleny, professor e pesquisador do Centro do Instituto Nacional de Antropologia e História (INAH) de Sonora, lamentou que no México praticamente não existam povos indígenas que não tenham sofrido a violência do crime organizado.

"Há alianças estranhas entre grupos de narcotraficantes, entre a exploração das florestas, a mineração e a violência contra as próprias comunidades", disse o especialista.

O professor destacou que nas comunidades indígenas muitas crianças são órfãs porque seus pais foram fisgados ou vitimizados pelo crime organizado, além do fato de que há altos índices de gravidez na adolescência e mães solteiras devido à violência.

"Todos os povos estão exigindo e reivindicando o reconhecimento de seus direitos territoriais, seus conhecimentos e formas de uso desses recursos, isso está relacionado à preservação da identidade, língua e cultura", acrescentou.

O professor e pesquisador do INAH citou que em Sonora, onde existem oito povos indígenas em três grandes regiões, o governo do México iniciou reuniões para definir o Plano de Justiça para povos indígenas que poderia ser replicado em todo o país.

O Instituto Nacional dos Povos Indígenas (INPI) está trabalhando com os governos tradicionais das tribos Yaqui, Mayo, Comca'ac e Guarijios.

Mas Enrique Robles Barnett, presidente do Conselho de Anciãos da Nação Comca'ac, lamentou que ainda não tenha visto o andamento do Plano de Justiça para o povo Seri, onde suas principais demandas são água potável, saúde, educação e canais de comunicação.

"Toda vez que participamos dos grupos de trabalho com o governo, colocamos todas as necessidades dos povos, (nós) colocamos na frente do povo do governo para que eles nos apoiem, mas acho que estão demorando muito tempo, porque já tivemos 42 mesas de trabalho e ainda não vimos nada", questionou.

GOVERNO INDIGENISTA?.

Os povos indígenas enfrentam esses problemas apesar do presidente, Andrés Manuel López Obrador, ter reivindicado a "resistência indígena", como ele chama o período que começou em 1521 com a conquista da Espanha.

O governo destinou 339,55 bilhões de pesos (quase US$ 17 bilhões) em programas sociais para mais de 2,05 milhões de famílias indígenas e afro-mexicanas do país, quase 70% a mais que no semestre anterior, disse Adelfo Regino, chefe do INPI, nesta terça.

"Neste governo, o orçamento para os povos indígenas e afro-mexicanos tem aumentado constantemente", disse durante entrevista coletiva no Palácio Nacional, sede do governo.

Mas há habitantes nativos que ainda não veem o apoio.

"Eles não nos enviaram uma resposta se vão nos apoiar ou não, o que queremos é que nos levem em conta, nos comprem terras ou nos paguem o aluguel de onde moramos", disse Carmela Gómez Pérez. EFE