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O que pode acontecer se o resultado da eleição dos EUA for contestado?

04/11/2020 09h44

Apesar de contagens incompletas em vários Estados-chave que poderiam determinar o resultado da corrida presidencial dos Estados Unidos, o presidente Donald Trump proclamou vitória sobre o oponente democrata Joe Biden nesta quarta-feira.

A ação prematura confirmou as preocupações dos democratas por semanas de que Trump tentaria contestar os resultados das eleições. Isso poderia desencadear uma série de dramas jurídicos e políticos nos quais a Presidência poderia ser determinada por uma combinação de tribunais, políticos estaduais e Congresso.

Aqui estão as diferentes formas pelas quais a eleição norte-americana pode ser contestada:

Ações judiciais

Os dados da votação inicial mostram que os democratas estão votando pelo correio em um número muito maior do que os republicanos. Em Estados como Pensilvânia e Wisconsin, que não contam as cédulas pelo correio até o dia da eleição, os resultados iniciais pareceram favorecer Trump porque demoraram mais para computar as cédulas enviadas pelo correio.

Os democratas expressaram preocupação de que Trump declararia vitória, como fez nesta quarta-feira, antes que as cédulas pudessem ser totalmente contabilizadas.

Uma eleição acirrada pode resultar em ações judiciais sobre os procedimentos de votação e contagem de votos em Estados-chave. Casos abertos em Estados individuais podem eventualmente chegar à Suprema Corte dos EUA, como a eleição da Flórida em 2000, quando o republicano George W. Bush prevaleceu sobre o democrata Al Gore por apenas 537 votos depois que o tribunal superior suspendeu a recontagem.

Trump indicou Amy Coney Barrett como juíza da Suprema Corte poucos dias antes da eleição, criando uma maioria conservadora de 6 votos a 3 que poderia favorecer o presidente se os tribunais opinassem sobre uma eleição contestada.

"Queremos que a lei seja usada de maneira apropriada. Portanto, iremos para a Suprema Corte. Queremos que todas as votações parem", disse Trump nesta quarta-feira, embora as leis eleitorais do país exijam que todos os votos sejam contabilizados, e muitos Estados levam dias para terminar a contagem de cédulas oficiais.

Colégio eleitoral

O presidente dos EUA não é eleito por maioria do voto popular. Pela Constituição, o candidato que obtiver a maioria dos 538 votos no Colégio Eleitoral passa a ser o próximo líder da nação. Em 2016, Trump perdeu no voto popular nacional para a democrata Hillary Clinton, mas garantiu 304 delegados no Colégio Eleitoral contra 227 de sua oponente.

O candidato que ganha o voto popular de cada Estado normalmente leva todos os delegados. Neste ano, o Colégio Eleitoral se reúne no dia 14 de dezembro para votar. As duas Câmaras do Congresso se reunirão em 6 de janeiro para contar os votos e nomear o vencedor.

Normalmente, os governadores certificam os resultados em seus respectivos Estados e compartilham as informações com o Congresso.

Mas alguns acadêmicos destacaram um cenário no qual o governador e as Casas Legislativas em um Estado fortemente contestado apresentam dois resultados eleitorais diferentes. Os Estados-chave de Pensilvânia, Michigan, Wisconsin e Carolina do Norte têm governadores democratas e um Legislativo controlado pelos republicanos.

De acordo com especialistas jurídicos, não está claro neste cenário se o Congresso deve aceitar a chapa eleitoral do governador ou não contar os votos do Estado.

Embora a maioria dos especialistas considere o cenário improvável, há precedentes históricos. O Legislativo da Flórida, controlado pelos republicanos, considerou apresentar seus próprios delegados em 2000, antes que a Suprema Corte encerrasse a disputa entre Bush e Gore. Em 1876, três Estados determinaram "delegados em duelo", levando o Congresso a aprovar a Lei da Contagem Eleitoral (ECA) em 1887.

Segundo a lei, cada Casa do Congresso decidiria separadamente qual lista de "delegados em duelo" aceitar. Hoje, os republicanos controlam o Senado enquanto os democratas controlam a Câmara dos Deputados, mas a contagem eleitoral é conduzida pelo novo Congresso, que tomará posse em 3 de janeiro.

Se as duas câmaras discordarem, não está totalmente claro o que aconteceria.

A lei diz que o Colégio Eleitoral aprovado pelo "Executivo" de cada Estado deve prevalecer. Muitos estudiosos interpretam isso como o governador, mas outros rejeitam esse argumento. A lei nunca foi testada ou interpretada pelos tribunais.

Ned Foley, professor de Direito da Ohio State University, chamou a redação da ECA de "virtualmente impenetrável" em um artigo de 2019 que explora a possibilidade de uma disputa de Colégio Eleitoral.

Outra possibilidade improvável é que o vice-presidente de Trump, Mike Pence, em seu papel de líder do Senado, possa tentar rejeitar inteiramente os votos dos delegados disputados de um Estado se as duas câmaras não concordarem, de acordo com a análise de Foley.

Nesse caso, a Lei do Colégio Eleitoral não deixa claro se um candidato ainda precisaria de 270 votos, a maioria do total, ou se poderia prevalecer com a maioria dos votos de delegados restantes —por exemplo, 260 dos 518 votos que sobrariam se os votos da Pensilvânia no Colégio Eleitoral fossem invalidados.

"É válido dizer que nenhuma dessas leis foi submetida a testes de resistência antes", disse Benjamin Ginsberg, advogado que representou a campanha de Bush durante a disputa de 2000, a jornalistas em uma teleconferência em 20 de outubro.

Os partidos poderiam pedir à Suprema Corte que resolvesse qualquer impasse no Congresso, mas não é certo que o tribunal estaria disposto a decidir como o Congresso deveria contar os votos do Colégio Eleitoral.

"Eleição de contingência"

A determinação de que nenhum dos candidatos obteve a maioria dos votos no Colégio Eleitoral desencadearia uma "eleição de contingência" sob a 12ª Emenda da Constituição. Isso significa que a Câmara dos Deputados escolhe o próximo presidente, enquanto o Senado escolhe o vice-presidente.

Cada delegação estadual na Câmara tem um único voto. Hoje, os republicanos controlam 26 das 50 delegações estaduais, enquanto os democratas têm 22; uma está dividida igualmente e outra tem sete democratas, seis republicanos e um libertário.

Uma eleição contingente também ocorre no caso de empate 269-269 após a eleição; existem vários caminhos plausíveis para um impasse em 2020.

Qualquer disputa eleitoral no Congresso aconteceria antes de um prazo estrito —20 de janeiro, quando a Constituição determina que o mandato do atual presidente termine.

De acordo com a Lei de Sucessão Presidencial, se o Congresso ainda não declarou um vencedor presidencial ou vice-presidencial até então, o Presidente da Câmara atuaria como presidente interino. Nancy Pelosi, uma democrata da Califórnia, é a atual presidente.

(Por Joseph Ax e Brad Heath)