Brasil retoma exportação de energia hidrelétrica a vizinhos e busca mais competitividade

Por Leticia Fucuchima

SÃO PAULO (Reuters) - O Brasil está retomando as exportações de energia para Argentina e Uruguai a partir de usinas hidrelétricas, que estão com excedentes de água nos reservatórios devido às fortes chuvas, enquanto o governo trabalha em ajustes para ampliar a competitividade dessas operações, disseram integrantes do setor à Reuters.

A exportação comercial de energia hidrelétrica é uma modalidade relativamente nova e só ocorre quando as usinas acumulam excedentes nos reservatórios que não poderiam ser aproveitados pelo sistema brasileiro, de modo que não afetam a segurança do fornecimento interno de energia.

As operações ganharam impulso em 2023, quando chuvas abundantes levaram várias usinas do país a verter água de seus reservatórios. Naquele ano, foram enviados a Argentina e Uruguai 494 megawatts (MW) médios na modalidade, com um ganho de R$782 milhões ao país.

Já no ano passado, a frustração de chuvas no período úmido e a seca severa que veio na sequência praticamente inviabilizaram as operações. Houve apenas exportação pontual no mês de junho, somando 32 MW médios e R$1,8 milhão.

Agora, as fortes chuvas do período úmido, principalmente nas grandes usinas da região Norte, voltaram a propiciar condições para a venda de excedentes hidrelétricos aos países vizinhos.

No mês passado, o Brasil enviou 12 MW médios de energia hidrelétrica a Argentina e Uruguai, o que gerou benefício tarifário de cerca de R$600 mil para os consumidores brasileiros, informou a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) à Reuters.

Os volumes exportados podem crescer substancialmente a partir de ajustes que estão sendo realizados no processo para ampliar a competitividades da fonte hidrelétrica, que "compete" com a energia termelétrica nesse tipo de operação.

"Estamos em situação bastante favorável no que tange à possibilidade de exportar recursos hidrelétricos, com a situação dos reservatórios e das usinas do Norte", afirmou Marisete Pereira, presidente da Abrage, associação que representa os grandes geradores hidrelétricos.

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Ela afirmou que está sendo feito um ajuste no processo, referente aos horários que as ofertas de exportação hidrelétrica chegam ao ONS, o que deve proporcionar mais competitividade à fonte e permitir que volumes maiores possam ser exportados.

À Reuters, a CCEE afirmou que "estuda junto ao Ministério de Minas e Energia aprimoramentos na sistemática que otimiza o ganho para o país e estimula a competitividade".

A presidente da Abrage destacou que a mudança é algo simples e que deve ser resolvida em breve, para que o país possa aproveitar a geração excedente das hidrelétricas até o fim do atual período úmido.

A Engie Brasil Energia, uma das maiores em geração hidrelétrica do país, disse que para 2025 tem uma expectativa "muito mais positiva" para as exportações da fonte, após um 2024 de hidrologia ruim.

"Os atuais níveis dos reservatórios e a previsão da hidrologia indicam grande chance de o Brasil dispor novamente desta oportunidade de exportação, até em níveis superiores ao de 2023", afirmou Marcos Keller Amboni, diretor de regulação e mercado da companhia.

Ele ressaltou ainda que as operações "monetizam" uma energia que hoje está sendo desperdiçada, diante da sobreoferta estrutural de energia que o Brasil deve enfrentar por mais alguns anos.

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As chuvas deste ano têm favorecido a geração hidrelétrica principalmente no Norte, onde os principais empreendimentos operam a fio d'água (sem reservatório de acumulação), estando sujeitos às vazões dos rios.

A usina de Santo Antônio, instalada no rio Madeira, bateu recorde de geração instantânea nesta semana, alcançando a potência de 3.564 MW. Já Belo Monte, no rio Xingu, atingiu geração de 6.082 MW médios em janeiro deste ano, a segunda melhor marca para o mês desde 2022, quando atingiu recorde de geração."

Já os principais reservatórios de hidrelétricas do país, localizados no subsistema Sudeste/Centro-Oeste, atingiam 67,75% da capacidade na última medição do ONS, realizada na quinta-feira.

MUDANÇA ESTRUTURAL

Geradores e especialistas veem ainda espaço para mudanças estruturais no mecanismo de exportação hidrelétrica, com o objetivo de valorizar melhor os recursos brasileiros.

Donato da Silva, CEO da consultoria Volt Robotics, defende a criação de um mercado estruturado entre os países para permitir exportações firmes de energia hidrelétrica. Hoje, as exportações são definidas diariamente, dependendo da necessidade do comprador e das ofertas feitas pelos geradores, de forma que não há garantia de continuidade.

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A Abrage, que congrega os geradores da fonte, trabalha em uma solução estrutural para "antecipar" as exportações de excedentes hidrelétricos. A ideia é poder ofertar os recursos aos países vizinhos um pouco antes de as usinas começarem a verter água, para minimizar o desperdício.

"Quando temos uma sinalização, com 15 dias, de que vai ter vertimento, que a gente possa exportar energia para não jogar água fora", explicou Pereira.

(Por Letícia Fucuchima)

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