França apaga palavra "raça" da Constituição e vai na contramão de textos internacionais
A palavra aparece no artigo prevendo que a República deve “assegurar a igualdade diante da lei de todos os cidadãos sem distinção de origem, raça ou religião”, escrito em 1946 – pouco depois do fim da Segunda Guerra Mundial. O contexto do fim do nazismo justificava, para os deputados, a menção à raça, mas perdeu pertinência ao longo dos anos e hoje não deve mais ser utilizado.
“A palavra ‘raça’ foi introduzida na Constituição em 1946, após o nazismo, para indicar que toda raça era igual, para por um fim às discriminações e rejeitar as teorias racistas. Entretanto, a persistência de sua menção é atualmente mal entendida, ao contrário de sua intenção inicial”, declararam os deputados do partido República em Marcha (LRM), do presidente Emmanuel Macron, em um comunicado.
Medida divide opiniões
“Dizer que a República assegura a igualdade diante da lei sem distinção de raças pressupõe que existem várias”, argumenta Richard Ferrand, líder dos deputados LRM e organizador do texto que prevê a eliminação do termo. Já Yaël Braun-Pivet, co-autora da iniciativa, reiterou que apagar a palavra não “enfraqueceria o arsenal jurídico” da luta contra as desigualdades.
Christiane Taubira, ex-ministra da Justiça francesa e vítima de racismo, disse que a iniciativa é “necessária, nobre, forte, num período onde vemos uma desinibição da rejeição do outro”. Já Lionel Tardy, do partido União Pelo Movimento Popular (UMP), se posicionou contra a medida, que classifica de “ideologia totalitária”: “Estamos abrindo a caixa de Pandora. Não mudamos nada, na realidade, apenas trocando as palavras”.
Em nome da igualdade de gênero, os deputados substituíram “raça” por “sexo”, logo após a palavra “distinção”. “Se queremos permanecer fiéis a essa grande causa do governo Macron que é a igualdade entre homens e mulheres, lembrar que a lei é para todos sem distinção de sexo pode ser um elemento útil”, afirmou Richard Ferrand.
Medida pode dificultar denúncias de racismo
Em entrevista à RFI, o sociólogo e demógrafo do Instituto Nacional de Estudos Demográficos (INED), Patrick Simon, acredita que a iniciativa de deletar o termo da Constituição não trará benefícios diretos para a luta antirracista. Sobretudo num país tímido em termos de discussão racial, como a França. “Se apagarmos o texto, vai ficar ainda mais complicado de defender casos de agressão racista”, afirma.
“É claro que não é impossível, existem recursos jurídicos para tratar casos de racismo sem falar de raça, onde a categoria analisada seria a origem da pessoa”, continua. Simon também lembra que diversos textos internacionais, como os do Comitê para a Eliminação da Discriminação da ONU, falam de raça o tempo todo. “É um termo que, aparentemente, funciona melhor em inglês”, conclui.
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