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Fotógrafa francesa Charlotte Dafol expõe em Paris imagens de ocupações brasileiras

12/11/2018 00h00

O RFI Convida nesta segunda-feira (12) a fotógrafa francesa Charlotte Dafol, que inaugura em Paris a exposição “Ocupação Povo Sem Medo”- “L’utopie est une pratique”, “A Utopia é uma prática”, em português. A mostra fica em cartaz até o fim de novembro na École Normal Supérieure (ENS), na capital francesa.

*Para ver a entrevista na íntegra, clique no vídeo abaixo

Charlotte Dafon mora desde 2013 no Brasil, entre Porto Alegre e Rio de Janeiro. Ela conta que a aproximação com o projeto Povo Sem Medo, frente brasileira de mobilização composta por mais de 30 movimentos nacionais, aconteceu quando decidiu morar dentro desses “squats”, como são chamadas as ocupações na Europa.

“Morei muitos anos dentro de ocupações. Faz menos de um mês que deixei de morar em uma delas”, conta a parisiense, que hoje reside no Morro Santo Amaro, uma comunidade localizada no Catete, nos arredores do centro do Rio de Janeiro. “Participei também de ocupações políticas, como o Ocupa Minc (Ministério da Cultura), em 2016. Minha aproximação com o Povo Sem Medo aconteceu realmente na prática, sem câmera, até por questões de segurança”, diz.

Mas foi quando se mudou para a capital carioca é que Charlotte descobriu o universo de ocupações maiores, mais organizadas, com movimentos sociais e “até 70 famílias”. “Cheguei lá com essa proposta, disse que eu era fotógrafa e que gostaria de acompanhar o processo de construção. Fui muito bem-recebida e percebi o quanto a fotografia era importante para eles, para a autoestima, às vezes é legal um olhar de fora sobre o cotidiano”, conta a fotógrafa independente.

Imigração

Dafon, que conhecia o movimento social pelo direito à moradia na França, o Droit au Logement, revela que uma das diferenças principais em relação às ocupações brasileiras é a presença massiva de refugiados, comum nos “squats” europeus. “Na França, é muito mais presente a questão da imigração, de pessoas que não possuem documentos, que estão em situação irregular no território”, afirma.

“Nas ocupações cariocas, vi muita gente que não era do Rio, que vieram de outros estados. Na verdade, são trabalhadores, muitas vezes explorados, e que têm difícil acesso à moradia, o aluguel é muito caro no Rio”, diz Charlotte. “Olha o tamanho do Brasil. É muito fácil se sentir de fora, mesmo sendo brasileiro. Nem sempre sou a mais estrangeira de todos dentro dos coletivos em que participo”.

Charlotte Dafon afirma que tem predileção por fotografar cenas prosaicas das ocupações, como varais de roupas, e o ato de lavar louça e outros afazeres domésticos. “Elas às vezes escondem o rosto, dizendo que é uma coisa suja, que não é para tirar foto, mas gosto de mostrar a imagem e arrancar um sorriso das pessoas”, diz.

Luta política

Dafon considera as ocupações brasileiros como um ativismo urbano “fundamental”. “É uma ferramenta importantíssima de luta política, acredito muito nela”. “Acho que existe aí um trabalho de comunicação a ser feito, como tudo na política. Por exemplo, a diferença entre ocupação e invasão. Uma ocupação não é uma invasão, não estamos invadindo a casa onde mora alguém. A ideia é ocupar um espaço vazio, abandonado, em desuso”, reflete a fotógrafa.

Sobre os moradores das ocupações cariocas, Charlotte guarda boas lembranças. “É o povo. O povo brasileiro, com tudo o que tem de bom. São pessoas alegres, sorridentes, acolhedoras, foi uma experiência muito boa”, conclui a francesa.