"Estamos revivendo a ditadura no Brasil", diz documentarista que lança filme sobre colonialismo francês em Madagascar
Em 1947, um grupo de rebeldes malgaxes se revoltaram contra o sistema colonial francês. Eles eram conhecidos como Fahavalos, os "inimigos da França". Sua luta pela independência de Madagascar se tornou um episódio traumático na história do país. A documentarista franco-malgaxe Marie-Clémence Andriamonta-Paes recuperou essa memória traumática no filme "Fahavalo, Madagascar 1947", em cartaz nos cinemas franceses desde o início de janeiro de 2019. Ela traça um paralelo sobre o episódio em Madagascar e a ditadura militar brasileira, momentos que ela considera pouco lembrados pelos dois povos.
Em 1947, um grupo de rebeldes malgaxes se revoltaram contra o sistema colonial francês. Eles eram conhecidos como Fahavalos, os “inimigos da França”. Sua luta pela independência de Madagascar se tornou um episódio traumático na história do país. A documentarista franco-malgaxe Marie-Clémence Andriamonta-Paes recuperou essa memória traumática no filme “Fahavalo, Madagascar 1947”, em cartaz nos cinemas franceses desde o início de janeiro de 2019. Ela traça um paralelo sobre o episódio em Madagascar e a ditadura militar brasileira, momentos que ela considera pouco lembrados pelos dois povos.
“Madagascar era colônia francesa e os malgaxes foram massivamente ajudar a França durante a Segunda Guerra Mundial, com mais de 40 mil soldados”, lembra a documentarista. “Quando eles voltaram para o país, em 1946, acharam que seriam presenteados com a independência pela França, coisa que não aconteceu. Então se rebelaram, e a repressão francesa foi terrível”, conta Marie-Clémence Andriamonta-Paes.
Ela lembra que a história da repressão dos rebeldes malgaxes nunca foi muito lembrada nem em Madagascar nem na França. Segunda Marie-Cleménce, o mal-estar provocado pelo episódio se prolonga até os dias de hoje. “Na realidade, não conseguimos a independência imediatamente em 1947. Ela foi ‘dada’ pelo [General] De Gaulle em 1960. Era uma independência semi-independente. E ninguém hoje em dia é muito orgulhoso disso, nem os franceses, que usaram de meios desproporcionais para reprimir a rebelião, nem os malgaxes, que perderam”, afirma a cineasta.
Marie-Clémence lembra que a rebelião era contra a colonização, o trabalho forçado no campo e contra a tomada pelos franceses de terras agrícolas para a plantação de café. “Meu olhar de diretora foi muito influenciado pelo Brasil, eu falo português fluente porque meu marido é brasileiro, tenho filhos brasileiros e já fiz um filme sobre o Brasil, o ‘Saudade do Futuro’, no ano 2000. Isso me deu uma distância diferente sobre o assunto", diz a diretora. “Conhecer ex-colônias portuguesas foi muito importante para ter um distanciamento sobre essa história”, afirma.
Um dos destaques do documentário “Fahavalo, Madagascar 1947” é a bela trilha assinada pelo músico Régis Gizavo, que já foi homenageado pelo músico brasileiro Lenine em uma série histórica de versos, durante um concerto em São Paulo.
Silêncio e similaridade com ditadura militar no Brasil
“Era importante fazer esse filme porque até na minha própria família eu já tinha escutado falar dessa história. Descobri apenas em 2010 que meu avô, pai da minha mãe, morreu de uma doença contraída na prisão. Dentro da família existe um trauma tão grande, que continua a não ser falado, e acho que isso afeta, querendo ou não. O pretexto deste documentário era ajudar as pessoas a conversarem dentro de suas próprias famílias”, afirma a cineasta.
A documentarista afirma encontrar diversas similaridades entre o episódio traumático da violenta repressão à rebelião malgaxe e a repressão provocada pelos militares durante a ditadura brasileira. “Uma das razões de fazer este filme era essa frase muito importante – aquele que não conhece sua história é condenado a revivê-la. Eu acho que o Brasil produziu muito poucos filmes sobre a ditadura. Os chilenos e argentinos fizeram muitos filmes sobre o período. No Brasil, foi uma coisa um pouco esquecida”, declarou.
“Estamos revivendo essa coisa, a ditadura no Brasil”, diz a cineasta franco-malgaxe. “Eu digo estamos, porque me sinto brasileira”, conclui.
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