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Chefe do Executivo de Hong Kong desiste de discurso no Parlamento após ser vaiada por deputados

16/10/2019 10h47

A chefe do Executivo de Hong Kong, Carrie Lam, foi obrigada nesta quarta-feira (16) a desistir de pronunciar um discurso no Parlamento em consequência das vaias de deputados da oposição. O incidente é registrado após meses de manifestações e crise política no território semi-autônomo.

O novo episódio demonstra a profunda divisão na sociedade de Hong Kong. Com o discurso de política geral, Lam pretendia recuperar a confiança da população, mas os deputados pró-democracia a vaiaram intensamente, o que forçou a chefe do Executivo a abandonar o Conselho Legislativo ("LegCo", Parlamento local).

O discurso era considerado muito importante, após meses de protestos e ações quase diárias para exigir reformas democráticas, em meio a denúncias de interferência do governo central da China.

Lam tentou em duas ocasiões pronunciar o discurso, mas os deputados de oposição, minoritários no Conselho Legislativo dominado por parlamentares favoráveis a Pequim, impediram com suas vaias. Alguns exibiram cartazes que mostravam a imagem da chefe do Executivo com as mãos ensanguentadas.

Um deputado utilizou um pequeno aparelho para projetar na parede atrás de Lam mensagens dos jovens que participam dos protestos pró-democracia há quatro meses. Depois colocou uma máscara com o rosto do presidente chinês Xi Jinping.

Carrie Lam fez uma segunda tentativa, em vão. A chefe do Executivo, com nível mínimo de popularidade, abandonou o Parlamento sob escolta. Poucos minutos depois, um vídeo pré-gravado do discurso foi divulgado.

Esta foi a primeira vez que um chefe do Executivo da ex-colônia britânica não conseguiu fazer o discurso anual sobre o política, algo que ocorre desde 1948. No discurso pré-gravado, Lam anuncia ajudas financeiras e a intenção de aumentar a oferta de alojamentos e terrenos para resolver a crise da habitação. Os aluguéis de Hong Kong estão entre os mais elevados do mundo.

"Superar a tempestade e avançar"

"Acredito de modo veemente que Hong Kong poderá superar esta tempestade e avançar", disse. No entanto, Lam não fez qualquer concessão aos manifestantes, o que provocou muitas críticas do movimento pró-democracia.

"Aconteceram tantas coisas nas ruas de Hong Kong durante os últimos quatro meses, mas Lam se escondeu em um abismo ou agiu como uma estátua de cera", lamentou Tanya Chan, deputada pró-democracia.

A deputada pró-Pequim Regina Ip criticou a atitude dos deputados da oposição. "Considero o comportamento de meus colegas pró-democracia, que insultam, gritam e pulam para impedir que a chefe do Executivo pronuncie seu discurso político, vergonhoso e que deveria ser condenado", disse.

Willy Lam, da Universidade Chinesa de Hong Kong acredita que um simples discurso não acalmaria o movimento de protesto, alimentado por anos de descontentamento com o retrocesso das liberdades e a ausência de um autêntico sufrágio universal. "Carrie Lam segue as instruções de Pequim. Mesmo os subsídios econômicos não parecem muito impressionantes e será necessário esperar anos para que se materializem", disse.

Reivindicações ampliadas

A mobilização dos militantes pró-democracia começou com a rejeição a um projeto de lei que autorizaria as extradições para a China. O texto foi retirado, mas isto aconteceu com muito atraso, de acordo com os manifestantes, que ampliaram as reivindicações, rejeitadas pelo Executivo local e Pequim, sob o argumento de que as liberdades em Hong Kong estão protegidas.

O discurso de Lam aconteceu poucas horas depois da Câmara de Representantes dos Estados Unidos aprovar uma "lei sobre os direitos humanos e a democracia em Hong Kong", que ameaça suspender o estatuto econômico especial concedido por Washington à ex-colônia britânica.

(Com informações da AFP)