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Brasil não será salvo de sua incompetência pelo capital estrangeiro, diz Ciro Gomes

Ciro Gomes (PDT) em entrevista ao UOL e à Folha em Brasília - Kleyton Amorim/UOL
Ciro Gomes (PDT) em entrevista ao UOL e à Folha em Brasília Imagem: Kleyton Amorim/UOL

08/06/2020 14h50

O Brasil está "absolutamente destruído, em frangalhos" do ponto de vista social, político, econômico. O estado brasileiro caminha, em 2020, para alcançar o maior déficit fiscal de sua história e, ainda assim, está renovando a dívida do setor empresarial. Esse raio-X tenebroso é a imagem descrita pelo vice-presidente do PDT, Ciro Gomes, que acaba de lançar o livro "Projeto nacional: o dever da esperança", publicado pela editora Leya. A obra, afirma o pedetista, é sua contribuição pessoal para uma reflexão sobre as raízes dos atuais problemas brasileiros e alternativas de solução.

Em entrevista à RFI, Ciro Gomes, 62 anos, avança algumas ideias - "com método e planejamento" -, que poderão ajudar o Brasil a sair do fundo do poço, de acordo com suas convicções. Com mais de 40 anos de vida pública, três vezes candidato derrotado à presidência (1998, 2002 e 2018), Ciro disse que admira profundamente o caráter de pioneirismo da ativista sueca Greta Thunberg, de apenas 17 anos.

"Ela presta um grande serviço ao colocar o jovem para discutir o consumismo", afirma. "Mas num país que tem 100 milhões de pessoas desempregadas ou na informalidade, não se pode falar em 'desdesenvolvimento'", explica. "É evidente que temos de redesenhar que desenvolvimento é esse, protagonizar um novo 'Green New Deal', mas propor, rapidamente, um novo projeto de crescimento."

Em seu livro, Ciro descreve as políticas adotadas por sucessivos governos brasileiros com relativo sucesso entre 1940 e 1980. "O Brasil foi o país que mais cresceu no mundo capitalista nesse período, em média 6,75% ao ano, chegando a 15% em alguns anos, mas o modelo brasileiro entrou em colapso nos anos 1980, quando os Estados Unidos aumentaram unilateralmente as taxas de juros em 1979, destruindo o futuro de todos os países que dependiam de fluxos internacionais de capital", recorda.

O Brasil também não prestou a atenção necessária na capacitação de sua inteligência, lamenta o ex-ministro da Fazenda de Itamar Franco, perdendo "a aceleração tecnológica internacional e seu impacto sobre a produtividade, porque um dos movimentos em voga no mundo, naquela época de fim da ditadura, era o protecionismo". "A democracia recebeu os escombros desse velho mundo", discorre Ciro.

Enquanto o Brasil foi acumulando atrasos, a globalização criou distorções "inaceitáveis". "Essa visão passiva do vanguardismo produtivo protagonizado pela China e outras potências tem características inimitáveis", critica o pedetista. "Existe uma vanguarda que produz com os dinheiros mais baratos e generosos do mundo, tem uma sofisticação tecnológica absolutamente agressiva, que luta hoje pela 5G e é a base de uma revolução de poder. A rede 5G significa consolidar nas mãos de uma minoria (...) o poder da informação que hoje vale mais do que petróleo ou ouro", alerta.

Agenda do século 19

A tragédia do Brasil é que o país está caminhando para uma dívida pública galopante de mais de 100% do PIB. "Atravessamos um processo de desindustrialização destruidor, antes de completar a agenda do século 19. Temos quase a metade da população ganhando apenas R$ 413 por mês, per capta", enfatiza Ciro, de acordo com dados anteriores ao início da pandemia de coronavírus.

De onde viria, então, "a esperança" profetizada no título do livro do pedetista?

"Meu projeto para o Brasil supõe abandonar a ilusão liberal, de que o protagonismo individual e a eficiência do mercado vão responder às necessidades do desenvolvimento brasileiro e da inserção soberana do Brasil no mundo", argumenta. "O Brasil tem de acabar com essa agenda internacional de assumir políticas de bom moço e acreditar que será salvo de sua incompetência pelo capital estrangeiro", pondera.

"Se você aceitar a ideia do desenvolvimento, irão derivar metas e objetivos. Eu proponho que o Brasil tenha as condições políticas para nos transformarmos, do ponto de vista dos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH), num intervalo de 30 anos, em um país com padrão de vida médio similar ao da Espanha, o que é um objetivo praticável. A Espanha não é um país rico, sofisticado, mas oferece à sua população uma vida mil vezes mais digna do que a vida que se dá ao povo brasileiro", acredita o presidenciável.

Na entrevista à RFI, Ciro apresenta seu programa para uma renegociação das dívidas da população, do setor empresarial e do Estado brasileiro, a fim de liberar recursos para o consumo e investimentos. Ele elege quatro "complexos industriais" - os setores de petroquímica e biomassa; saúde; defesa e aeroespacial; e agronegócio -, que teriam potencial, em sua opinião, de romper com o atual ciclo de destruição e representar uma esperança de dias melhores para o povo brasileiro.